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Otimização de biológicos nas DIIs

Por: Paulo Gustavo Kotze


Nos últimos 20 anos, novas drogas e novas estratégias terapêuticas foram desenvolvidas e representaram um significativo avanço no tratamento clínico das doenças inflamatórias intestinais (DIIs), tanto na doença de Crohn (DC) quanto na retocolite ulcerativa (RCU).

A terapia biológica disponível no Brasil é composta por 4 agentes anti-TNF (infliximabe, adalimumabe, certolizumabe pegol, golimumabe), uma anti-integrina (vedolizumabe) e uma anti-interleucina (ustequinumabe). Os biológicos hoje representam a forma mais efetiva de tratamento clínico das DII. Entretanto, estão associados a taxas importantes de perda de resposta secundária, sendo necessárias estratégias de otimização de doses ou trocas entre agentes para recuperação da resposta clínica. A experiência atualmente é mais concentrada com os agentes anti-TNF.

A otimização REATIVA da terapia biológica é feita quando um paciente perde resposta a um medicamento após uma resposta inicial (na vigência de comprovada atividade da doença de base, afastando-se outras causas de inflamação como C. Difficile, por exemplo). Atualmente temos comercialmente à disposição a mensuração de níveis séricos e de infliximabe (IFX) e adalimumabe (ADA), dois agentes anti-TNF. Além disso, pode-se avaliar a presença de anticorpos contra as drogas. Nos casos de perda de resposta, costumamos pedir esses exames, que devem ser colhidos em trough (ou seja, imediatamente antes de uma infusão) no caso do IFX ou em qualquer momento entre doses no caso do ADA.

Nos casos de níveis adequados ou elevados de medicação, a opção pela troca por agentes com outro mecanismo de ação é recomendada. O mesmo ocorre em níveis indetectáveis com presença de anticorpos. Na fase de manutenção, em casos de níveis de IFX baixos (abaixo de 2-3 ug/ml) a otimização é então realizada, com o uso de 10 mg/kg a cada 8 semanas ou 5 mg/kg a cada 4 semanas. Nos casos de monoterapia, a adição de um imunossupressor é igualmente utilizada. Nos casos de ADA, níveis séricos abaixo de 8-10 ug/ml (igualmente na manutenção) nos levam a otimizar as doses para 40 mg semanais, com a adição de um imunossupressor nos casos de monoterapia. Essas estratégias geralmente levam à recuperação da resposta em cerca de 2/3 dos pacientes.

No sistema público, há dificuldade de se ter acesso aos testes de níveis séricos dos anti-TNF. Assim, como proceder de forma empírica? Algumas dicas a seguir.

Caso os pacientes fiquem bem após injeção/infusão, e piorem gradativamente próximo da data da outra dose, isso provavelmente significa nível mais baixo, e a otimização das doses com adição de um imunossupressor pode ser indicada. Se os pacientes não melhoram nada após uma dose, isso pode significar neutralização da ação dos medicamentos por anticorpos, e eventualmente, uma troca por outro mecanismo de ação pode ser considerada. Nos casos de reação infusional ou reação cutânea no local da injeção, isso significa presença de anticorpos contra a droga, e a troca pode ser melhor indicada.

Nos casos de otimização dos novos biológicos, como vedolizumabe e ustequinumabe, baseamos as decisões de forma empírica, pela dificuldade no acesso aos testes de níveis das drogas. Como essas drogas tem pouca imunogenicidade, e raramente provocam reações infusionais ou no local das injeções, geralmente otimizamos as doses (300 mg mensais para vedolizumabe e 90 mg mensais para ustequinumabe) por 4-6 meses antes de uma possível troca.

A otimização PROATIVA das doses dos medicamentos seria atingir um nível sérico ideal para um determinado desfecho ANTES de o paciente desenvolver perda de resposta. É usualmente realizada no início de um tratamento, na fase de indução. Atualmente, não é recomendada pelos consensos, pois alguns estudos randomizados falharam em demonstrar sua superioridade. Entretanto, alguns grupos a utilizam principalmente em protocolos de pesquisa, com o objetivo de se atingir melhores desfechos específicos (cicatrização da mucosa, por exemplo). As vantagens são descritas na literatura, como maior permanência com a droga, menor perda de resposta e maiores taxas de desfechos mais audaciosos, como cicatrização da mucosa.

É importante salientar que alguns fenótipos das DII como a DC perianal fistulizante e a colite ulcerativa aguda severa podem precisar de maiores doses de medicação, e nessas situações, nosso limiar para otimização é geralmente menor.

Outro ponto importante é sempre tentar extrair ao máximo a eficácia de um medicamento, pois no tratamento das DII temos poucos biológicos disponíveis. Assim, na ausência dos testes específicos de níveis séricos, procurar otimizar sempre as doses antes de trocar de mecanismo de ação, quando não há reações evidentes que mostrem neutralização por anticorpos.

Bibliografia sugerida:

1. Papamichael K, Cheifetz AS. Is It Prime Time for Proactive Therapeutic Drug Monitoring of Anti-Tumor Necrosis Factor Therapy in Inflammatory Bowel Disease? Gastroenterology. 2019 Oct;157(4):922-924. doi: 10.1053/ j.gastro.2019.08.001. Epub 2019 Aug 7. PMID: 31400368.

2. Negoescu DM, Enns EA, Swanhorst B, Baumgartner B, Campbell JP, Osterman MT, Papamichael K, Cheifetz AS, Vaughn BP. Proactive Vs Reactive Therapeutic Drug Monitoring of Infliximab in Crohn’s Disease: A Cost-Effectiveness Analysis in a Simulated Cohort. Inflamm Bowel Dis. 2020 Jan 1;26(1):103-111. doi:10.1093/ibd/izz113. PMID: 31184366; PMCID: PMC6905301.

3. Papamichael K, Cheifetz AS, Melmed GY, Irving PM, Vande Casteele N, Kozuch PL, Raffals LE, Baidoo L, Bressler B, Devlin SM, Jones J, Kaplan GG, Sparrow MP, Velayos FS, Ullman T, Siegel CA. Appropriate Therapeutic Drug Monitoring of Biologic Agents for Patients With Inflammatory Bowel Diseases. Clin Gastroenterol Hepatol. 2019 Aug;17(9):1655-1668.e3. doi: 10.1016/j.cgh.2019.03.037. Epub 2019 Mar 27. PMID: 30928454; PMCID: PMC6661210.

4. Papamichael K, Rakowsky S, Rivera C, Cheifetz AS, Osterman MT. Association Between Serum Infliximab Trough Concentrations During Maintenance Therapy and Biochemical, Endoscopic, and Histologic Remission in Crohn’s Disease. Inflamm Bowel Dis. 2018 Sep 15;24(10):2266-2271. doi: 10.1093/ibd/izy132. PMID: 29718327; PMCID: PMC7190934.

5. Papamichael K, Cheifetz AS. Use of anti-TNF drug levels to optimise patient management. Frontline Gastroenterol. 2016 Oct;7(4):289-300. doi: 10.1136/flgastro-2016-100685. Epub 2016 Feb 26. PMID: 28839870; PMCID: PMC5369499.

 

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