TRIBUNA LIVRE: COMO EU FAÇO
CORDEIRO F, REIS NETO JA, SOUZA JVS, HABR-GAMA A - Tribuna livre: Como eu faço. Rev bras Coloproct, 2001; 21(1): 50-51.
Como sempre, gostaríamos de agradecer aos
nossos colegas a participação nesta seção pois, sem êles, ela
não existiria. Lembramos sempre que o nosso objetivo é
favorecer a participação de todos, permitindo assim que
emitam suas opiniões livremente.
Além destes agradecimentos, gostaríamos de
lembrar aos colegas que esta é uma TRIBUNA LIVRE e não
há necessidade de convites para que sua opinião seja
discutida. Enquanto houver distintos posicionamentos dos
apresentados, o tema será mantido ou retornará à
discussão, porém não serão publicados os textos
considerados contestatórios.
Gostaríamos ainda de solicitar aos colegas que
queiram participar, que enviem sugestões de novos temas ou
perguntas, bem como suas condutas nos casos discutidos.
Àqueles interessados em colaborar, manteremos
sempre um canal aberto pelo fax 019.32543839 ou E.mail: fernandocordeiro@globo.com
Nesta edição discutiremos o tema:
"megacólon
chagásico-complicações" com a colaboração de
3 membros da nossa Sociedade:
Dr. José Alfredo dos Reis Neto(SP)
Dr. Jayme Vital dos Santos Souza(BA)
Dr. Angelita Habr-Gama(SP)
1. Qual é, na sua opinião, a complicação mais
frequente nos pacientes portadores de megacólon chagásico?
Dr. José Alfredo dos Reis Neto - A complicação
mais frequente do megacolon chagásico é a obstrução
intestinal, tipo obturação, ocasionada por um fecaloma impactado
na ampola retal.
Dr. Jayme Vital dos Santos Souza - Aqui em Salvador (BA), onde ainda temos bastante, é sem dúvida o fecaloma.
Dra. Angelita Habr Gama - Fecaloma.
2. Qual a sua conduta frente a um volvo de
sigmóide? Realiza retossigmoidoscopia descompressiva ?
Dr. José Alfredo dos Reis Neto - O tratamento deve
ser encarado sob dois aspectos principais:
a. tratamento de um volvo simples;
b. tratamento de um volvo complicado pela ocorrência de:
necrose parcial ou total da parede intestinal,
fecaloma retido na alça,
perfuração da parede,
câncer na alça torcida.
Portanto, o passo seguinte é avaliar as condições
de viabilidade da alça, isto é, diagnosticar a presença ou
não de complicações. A presença de
taquisfigmia, hipotensão, reação peritoneal, hipotermia, ou o próprio choque
séptico, são sinais clínicos de necrose da alça.
Radiologicamente, o primeiro sinal de necrose é a presença de
ar intra-cavitário, o que ocorre em uma fase tardia da
mesma. Entretanto, a retossigmoidoscopia rígida é a
melhor opção para detectar a existência de complicações,
pois permite avaliar as condições da mucosa e da luz
intestinal. Ao nível da torção ocorre um pregueamento
espiralado da mucosa, que deve estar rósea; a presença de
secreção muco-sanguinolenta, de mucosa de coloração
pardusca, de edema de mucosa ou de ulcerações sugerem a
existência de gangrena. A intubação
retossigmoidiana descompressiva é o tratamento ideal para um volvo
simples. A cirurgia está reservada para o volvo seguido
de complicações.
Dr. Jayme Vital dos Santos Souza - Esta é uma questão importante, pois na maioria das vezes, no megacolon chagásico, não temos um volvo e sim um acotovelamento na transição retossigmoidiana, pelo volume das fezes e mobilidade da alça. Sempre que possível e após visualizar a mucosa, constatando que não existe sofrimento, tentamos a redução endoscópica. Caso contrário fazemos um Hartmann.
Dra.Angelita Habr Gama - Esvaziamento endoscópico quando não há sinais clínicos, radiológicos e endoscópicos de sofrimento intestinal; quando estas condições estão presentes indico laparotomia.
3. Caso esta retossigmoidoscopia descompressiva
não tenha o resultado esperado e não consiga realizar
um preparo adequado, como procede no intra-operatório?
Dr. José Alfredo dos Reis Neto - O resultado
esperado pela intubação descompressiva é a diminuição da
pressão intraluminal da alça torcida e
assim evitar a necrose intra-parietal de Oschner (necrose da parede cólica por
isquemia dos vasos intramurais). É interessante ressaltar que
elimina-do-se a existência de uma alça fechada, na grande
maioria dos casos, a torção do sigmóide sobre o seu próprio meso
se reduz. Manter uma sonda por 48 a 72 horas no interior
da alça volvulada ou repetir a retossigmoidoscopia sempre
que ocorrer recidiva da distensão evita o insucesso do
tratamento. Importante ressaltar que a intubação propicia ao
paciente o tempo necessário para um tratamento posterior,
cirúrgico, do megacolo em melhores condições clínicas.
Dr .Jayme Vital dos Santos Souza - Não faço preparo intra-operatório. Prefiro sempre optar pela cirurgia de Hartmann.
Dra.Angelita Habr Gama - Quando a descompressão endoscópica não for bem sucedida, ou quando houver sido contraindicada realizo apenas, durante a laparotomia, a distorção e o esvaziamento do conteúdo do sigmóide ( que geralmente é só ar, ou fezes amolecidas) colocando dilatador anal no reto e comprimindo o sigmóide. Mantenho sonda reta! e preparo o doente para cirurgia definitiva, que deverá ser realizada poucos dias após. Se houver sinais de sofrimento intestinal, realizo operação de Hartmann.
4. Com relação ao fecaloma, a sua conduta é a
limpeza completa do cólon durante a internação ou
simplesmente a retirada da porção endurecida das
fezes acumuladas no reto?
Dr .José Alfredo dos Reis Neto - Se o fecaloma é
retal, esvaziar a "cabeça" do mesmo, ou seja a sua parte
mais distal, pode resolver o problema imediato; o resto do
conteúdo fecal pode ser tratado com enemas diários.
Esvaziar ou eliminar um fecaloma pode levar vários dias. O fecaloma encravado no sigmóide pode requerer um tratamento
cirúrgico, em vista de se tratar de um material
endurecido por igual e difícil de ser diluído por lavagens.
Dr. Jayme Vital dos Santos Souza - Sim. Temos publicado já algum tempo, uma metodização para o esvaziamento manual do fecaloma sob anestesia loco-regional. Nesta mesma intemação o paciente é submetido ao tratamento cirúrgico definitivo.
Dra.Angelita Habr Gama - Costumo fazer a limpeza completa do cólon durante a internação.
5. Comentários adicionais?
Dr. José Alfredo dos Reis Neto - Importante ressaltar que
a torção do sigmóide sobre seu próprio meso, muito embora
seja a causa inicial da rotação axial da alça, raramente leva à
oclusão da artéria mesentérica inferior. A necrose ou gangrena da
alça volvulada é consequência da isquemia
vascular intramural e depende primordialmente da distensão e do aumento da
pressão intraluminal. No megacólon é comum existir um
dolicossigma e o mais frequente é a ocorrência de um
acotovelamento sigmóido-retal (volvo fisiológico de Bruusgaard); é preciso
que a rotação seja superior a 180 graus para que o volvo se efetue.
Dra.Angelita Habr Gama - No Hospital das Clínicas da FMUSP não temos tido oportunidade de tratar volvo do sigmóide pois os doentes são encaminhados ao Pronto Socorro. Em minha atividade privada, nos poucos doentes tratados, tenho realizado ressecção do sigmóide e anastomose colorretal mecânica logo abaixo da reflexão peritoneal; tenho tido bons resultados. Entretanto, esta conduta é aplicável somente aos doentes em boas condições e que não tenham compromisso vascular do cólon.
Esta rodada de perguntas e respostas encerra esta seção da TRIBUNA LIVRE: COMO EU FAÇO.
Agradecemos novamente a inestimável colaboração dos colegas que prontamente responderam à nossa solicitação e tornaram
possível a realização de mais uma tribuna.
Este tema é amplo e nossa intenção é a de dar um rápido enfoque do tratamento da enfermidade em vários
locais alcançados por nossa Sociedade.
Se você tem alguma opinião divergente ou gostaria de completar aquilo que foi aqui referido, escreva-nos.
Gostaríamos de ter sua participação efetiva independente de sua titulação dentro da sociedade e mais uma
vez agradecer àqueles que de maneira tão rápida, gentil e extremamente conscisa colaboraram para manter acesa
conosco a chama desta TRIBUNA.
Novamente, o nosso fax é: 019.32543839 e E.mail:
fernandocordeiro@globo.com.
Participe.
Fernando Cordeiro