ATUALIZAÇÃO
RENATO ARAÚJO BONARDI - TSBCP
Abstrato
Pelo fato de que pacientes com retocolite
ulcerativa idiopática (RCUI) apresentam um risco maior para o
desenvolvimento do câncer colo-retal, muitos
gastroenterologistas têm realizado a colonoscopia como método de
vigilância para aqueles pacientes. Entretanto se este
programa de vigilância é eficaz e de custo-benefício razoável
ainda é bastante discutível. Eaden e colaboradores
avaliaram a prática de vigilância de gastroenterologistas britânicos
em pacientes com RCUI, na tentativa de esclarecer
melhor este assunto.
Foram enviados questionários para avaliar as
práticas de vigilância em pacientes com RCUI para
413 gastroenterologistas do Reino Unido. O questionário
incluiu desde situações clínicas até métodos de
tratamento no caso de displasia de baixo grau (DAG) encontradas
nas colonoscopias. Além destes itens o questionário
continha seis fotos coloridas de eventuais achados de
colonoscopias, perguntando aos gastroenterologistas quais os achados
os motivaram a tomar novas biópsias além daquelas que
já seriam feitas normalmente em pacientes com RCUI.
Dos 413 questionários enviados, 298 foram
respondidos e enviados para análise. Noventa e quatro por
cento dos gastroenterologistas praticam alguma forma de
vigilância do câncer colo-retal em pacientes com RCUI, e
35% mantêm um registro de todos os exames e dos seus
pacientes. Todos os gastroenterologistas realizam vigilância
nos pacientes com pancolite; 24% realizam em pacientes
com comprometimento do cólon esquerdo, e 2% em
pacientes com proctite ulcerativa. No resultado geral, 65%
dos gastroenterologistas realizam colonoscopias de vigilância
e em 45%, especialistas em patologia gastrintestinal fazem
a revisão das lâminas das biópsias. A duração média da
doença antes do início da vigilância foi de 9,2 anos para
a pancolite e 12,4 anos para a colite à esquerda.
Somente 4% dos gastroenterologistas oferecem a
colectomia profilática em pacientes com doença com mais de 10
anos de duração. Quatro por cento indicam a colectomia
com achados de DBG, e 53% indicam a operação com
achados de DAG. O significado de DALM era desconhecido
para 16% dos gastroenterologistas.
No momento não existe ainda entre os
gastroenterologistas do Reino Unido uma prática uniforme de
vigilância de câncer colo-retal em pacientes com RCUI.
Concluem os autores que há necessidade de protocolos
padronizados e cursos de educação continuada para melhorar
o processo de vigilância da RCUI.
Comentário
A propaganda de produtos comerciais é geralmente
bastante questionada e regulada pelo público, porém a
promoção de programas médicos é na grande maioria das
vezes aceita como verdade por profissionais respeitáveis e
bem intencionados. A vigilância do câncer colo-retal em
pacientes com RCUI com protocolos de colonoscopias, é um
exemplo do que foi discutido no presente trabalho de Eaden
e colaboradores. Estes protocolos de vigilância têm sido
aceitos como dogmas, de tal maneira que não é possível
atualmente randomizar pacientes com RCUI em um estudo
que possa avaliar a evolução e o custo-benefício desta vigilância.
A teoria de que pacientes com 8 a 10 anos de
pancolite ou 15 a 20 anos de colite esquerda deverão ser
submetidos a colonoscopia em intervalos regulares de 1 a 2 anos com
a finalidade de identificar a presença de displasia, é bem
aceita entre gastroenterologistas e colo-proctologistas. A
displasia é precursora do desenvolvimento do câncer colo-retal
e quando diagnosticada, indica-se o tratamento
cirúrgico. Presumivelmente algumas vidas serão salvas. Porém
esta afirmativa seria realmente verdadeira?
Muitos trabalhos atualmente questionam a validade e
a dificuldade da interpretação da displasia. A variação
dos valores preditivos e a inabilidade da prevenção do
câncer de maneira uniforme, mostram a falta de evidência do
benefício, associado a adesão parcial dos pacientes aos
programas de vigilância.
Tem sido geralmente assumido pelos pacientes e
provavelmente pelos colegas não especialistas que as
práticas de vigilância utilizadas pelos gastroenterologistas e
colo-proctologistas são organizadas para garantir uma
uniformidade de intervalo dos exames endoscópicos, biópsias,
interpretação uniforme da histologia, e critérios firmes
de recomendação da indicação do tratamento cirúrgico.
Eaden e colaboradores mostraram que este conceito não é
verdadeiro e que a maioria dos gastroenterologistas
consultados realizam uma vigilância desorganizada com uma ampla
variação do manejo das displasias. Isto também ocorre
em outras sociedades bem organizadas onde não se
conseguiu uma orientação segura e uniforme do
acompanhamento dos pacientes com RCUI.
Por que então especialistas com boa formação e
bem intencionados continuam aceitando uma maneira tão
desorganizada de vigilância na RCUI. Os autores
mencionam o fato de que programas de educação continuada
possam melhorar esta situação. Acredito porém que uma
explicação alternativa seja a real falta de credibilidade da
displasia, como indicativo seguro para prevenir o
desenvolvimento do câncer colo-retal em pacientes com RCUI. Temos
conduzido protocolos de acompanhamento como maneira
mais atraente do que não fazer nada.
Freqüentemente acreditamos no que queremos que
seja verdadeiro, em vez de enfrentarmos a realidade
desagradável do que seja verdadeiro. Até que tenhamos
um marcador de malignidade confiável e seguro para a
RCUI melhor do que a displasia, o estado atual da vigilância
vai continuar de maneira desorganizada.
Referências Consultadas:
1. Lewis JD, Deren JJ, Lichtenstein GR. Cancer risk in patients
with inflammatory bowel disease, Gastroenterol Clin North Am, v. 28, n.
2, p459-477, 1999.
2. Itzkowitz SH. Inflammatory bowel disease and can cer, Gastroenterol
Clin North Am, v - mail: 26, n 1, p. 129-139, 1997.
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