ARTIGOS ORIGINAIS


CIRURGIA AMBULATORIAL SOB ANESTESIA LOCAL EM PROCTOLOGIA: Experiência e análise do resultado de 503 operações.

CARLOS WALTER SOBRADO - TSBCP
SERGIO CARLOS NAHAS - TSBCP
CARLOS FREDERICO MARQUES - FSBCP
ANGELITA HABR-GAMA - TSBCP


Sobrado CW; Nahas SC; Marques CF; Habr-Gama A. - Cirurgia ambulatorial sob anestesia local em proctologia: experiência e análise do resultado de 503 operações. Rev bras Coloproct, 2001;21(4):228-233

RESUMO: No período de outubro de 1992 a janeiro de 2000, quinhentos e três pacientes portadores de doenças orificiais diversas foram submetidos a tratamento cirúrgico ambulatorial sob anestesia local. Em 49 intervenções cirúrgicas a anestesia foi realizada pela técnica do "anzol" (hook-needle puncture) e no restante , as anestesias foram realizadas pela clássica punção bilateral da região anal. Doença hemorroidária, fístula, fissura, cisto pilonidal e condiloma anal foram as afecções mais freqüentes nesta casuística (85,8%). A incidência global de complicações precoces e tardias foi, respectivamente, 16,1% e 4,8%. Dor intensa, durante o procedimento ou no pós-operatório, foi a complicação mais freqüente, sendo relatada por 57 pacientes desta casuística (11,3%). Cinco pacientes (1,0%) necessitaram de internação hospitalar para tratamento de complicações pós-operatórias. Quatrocentos e quarenta e dois pacientes (88%) revelaram-se satisfeitos com o método empregado, referindo como principal vantagem do método o retorno precoce ao ambiente domiciliar, propiciando uma recuperação mais confortável e com maior privacidade. Cada hemorroidectomia realizada em nível ambulatorial proporcionou uma economia de 170 dólares americanos quando comparado com o mesmo procedimento sob regime de internação de um dia, ou seja, foi 31,5% mais econômica. A cirurgia proctológica (orificial) ambulatorial sob anestesia local pode ser realizada com segurança e baixa morbidade, sendo uma boa alternativa para diminuição dos custos hospitalares e liberação de leitos para intervenções cirúrgicas mais complexas.

UNITERMOS: Doença anorretal, cirurgia ambulatorial, anestesia local, técnicas anestésicas.

A realização de operações em unidade ambulatorial, ou seja, fora do ambiente de internação hospitalar, não é novidade, sendo provavelmente a modalidade cirúrgica mais antiga que se têm notícia, o que pode ser facilmente confirmado através de papiros descobertos na civilização egípicia.
    A alta prevalência da doença anorretal e o impacto econômico das várias formas de tratamento envolvidas têm estimulado o interesse pelo manejo ambulatorial destas afecções. Desta forma, nos últimos trinta anos, a cirurgia proctológica ambulatorial tem recebido especial atenção devido a necessidade de diminuição dos custos hospitalares e de liberação de leitos para cirurgias mais complexas.
    No nosso meio, as longas filas à espera de vagas para realização de operações em regime de internação hospitalar demonstram a dimensão do problema.
    Apesar das vantagens sociais e econômicas, a maioria dos cirurgiões em nosso país é ainda relutante em indicar os procedimentos cirúrgicos anorretais em regime ambulatorial, pelo controle inadequado da dor, pelo receio de complicações pós-operatórias precoces, ou também pela menor remuneração que alguns seguros de saúde pagam quando seu cliente não é internado. Muitas vezes, os próprios pacientes apresentam resistência ao tratamento cirúrgico proctológico em unidades ambulatoriais, devido a reputação de procedimento tradicionalmente doloroso e com a convencional necessidade de recuperação hospitalar até a primeira exoneração intestinal. No entanto, com o avanço das técnicas cirúrgicas e anestésicas, a maior parte das operações proctológicas pode, atualmente, ser realizada com eficácia e segurança a nível ambulatorial 1-4.
    A proposta do presente estudo é apresentar os resultados obtidos com o tratamento cirúrgico ambulatorial, sob anestesia local, em hospital universitário, de diversas doenças proctológicas, num total de 503 operações, analisando sua eficácia, segurança e complicações.

PACIENTES E MÉTODOS
Foram estudados na Disciplina de Coloproctologia do Departamento de Gastroenterologia da FMUSP, de forma prospectiva, 503 pacientes portadores de afecções proctológicas e operados sob anestesia local no período compreendido entre outubro de 1992 a janeiro de 2000. Todos os pacientes foram submetidos a exame físico e proctológico completo, incluindo a retossigmoidoscopia, e após constatada indicação cirúrgica o método ambu-latorial era discutido com o paciente e seus familiares, sendo a recusa uma contra-indicação clara para a sua realização. A condição clínica do paciente foi classificada de acordo com os critérios da Sociedade Americana de Anestesiologia (ASA), sendo incluídos no estudo apenas os doentes pertencentes à categoria 1 ou 2. Na falta da disponibilidade de um acompanhante para o retorno ao domicílio após a cirurgia, o paciente era automaticamente excluído do estudo.
    A idade dos pacientes variou de 15 a 77 anos, com média de 36,5 anos, sendo 56% pertencentes ao sexo feminino. A maioria dos pacientes possuía emprego remunerado (71%). O grau de escolaridade foi variável, tendo a maioria (62,2%) concluído o primeiro grau menor, e apenas 3,9% terminado o curso superior.
    Os pacientes selecionados foram orientados a comparecer à unidade de cirurgia ambulatorial cerca de duas horas antes do procedimento, em jejum de pelo menos seis horas. Optou-se pela realização de limpeza do reto no pré-operatório com utilização de fleet-enema. Após adequada monitorização eletrocardiográfica, era instalado acesso venoso periférico e iniciada sedação intravenosa, utilizando-se geralmente 5mg de diazepam diluído em 500 ml de solução fisiológica, acrescida de 50mg de meperidina por via intramuscular. A posição cirúrgica habitual foi a de litotomia. Os portadores de cisto pilonidal foram operados na posição de decúbito ventral com um coxim sob o púbis.
    A solução anestésica empregada consistiu de lidocaína a 1% e de bupivacaína a 0,25%, associada a epinefrina 1:200000 diluída ao meio com água destilada. A técnica anestésica mais freqüentemente utilizada foi a de infiltração perianal e submucosa, em leque, por meio de duas punções realizadas nos quadrantes laterais (Figura 1) tendo sido realizada em 90,2%. Em 49 doentes, aplicamos a técnica do "Anzol" (Hookneedle puncture), que consistiu na infiltração de aproximadamente 4 a 5ml da solução anestésica em cada quadrante, acima e abaixo da linha pectínea, no plano submucoso e interesfincteriano, envolvendo respectivamente os plexos de Meissner e Auerbach. Nesta técnica, após o toque digital suave , introduz-se suavemente o anuscópio de tamanho pequeno Faensler ou de Fergunson-Hill umedecido com geléia de xilocaína a 2% e com o auxilio de uma agulha com ponta curva (tipo anzol) de 25 gauge e 6 cm (2,5 inch ) é realizada a punção na camada mucosa logo acima da linha pectínea. Inicialmente injeta-se no plano submucoso e em seguida traciona-se a agulha de modo que se complete a infiltração do anestésico no plano muscular (Figura 2). As técnicas cirúrgicas empregadas não diferem das utilizadas nos pacientes em regime de internação, e com outros tipos de anestesia :doença hemorroidária-técnica aberta de Miligan-Morgan; fissura anal-fissurectomia com esfincterotomia interna lateral ou a esfincterotomia interna lateral subcutânea (EILS); fístula anal-fistulotomia com curetagem e cisto pilonidal-técnica de incisão e curetagem . Após a operação, o paciente era mantido na sala de recuperação por cerca de duas a quatro horas, quando então recebia alta hospitalar desde que os seguintes critérios fossem preenchidos:
• Presença de acompanhante lúcido e responsável;
• Sinais vitais estáveis por no mínimo 1 hora;
• Sem qualquer evidência de depressão respiratória;
• Boa orientação temporal e espacial;
• Ausência de náuseas, vômitos, dor forte, retenção urinária e/ou hemorragia;
• Alta hospitalar assinada e documentada por profissional responsável;
• Orientação médica verbal e por escrito.

Figura 1 Punção da pele perianal bilateralmente para infiltração em Ieque da solução anestésica.

Figura 2 Punção acima da linha pectínea para infiltração da solução anestésica no plano submucoso, com posterior tração caudal da agulha curva e infusão do anestésico no esfincter anal nos 4 quadrantes.

    Na ocasião da alta hospitalar, o paciente era questionado sobre a dor sentida no transcorrer do procedimento, por meio de uma escala visual analógica, graduando-a em escala de zero a dez, sendo zero correspondente a nenhuma dor e dez a mais intensa já experimentada. Consideramos pontuações de zero a três como dor leve, quatro a seis como moderada e sete a dez como intensa. A prescrição pós-operatória consistia de dipirona sódica 500mg a cada seis horas e diclofenaco sódico 50mg a cada oito horas, de acordo com a intensidade da dor, bem como da orientação básica dietética rica em fibras e de higiene local com água. Todos os pacientes receberam orientações verbais e por escrito de como proceder no caso de eventuais complicações, sendo instruídos a procurar a Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas, onde um membro da equipe seria acionado. O retorno ambulatorial foi programado para o 7 , 21e 28º dia pós-operatório, havendo uma consulta adicional cerca de três meses após o procedimento para reavaliação tardia. Todas as complicações precoces ou tardias foram relatadas e assinaladas.

RESULTADOS
Os procedimentos cirúrgicos realizados nos 503 pacientes estão listados na Tabela I.

Tabela 1 - Tipos de procedimentos cirúrgicos realizados sob anestesia local.


    A hemorroidectomia foi a cirurgia mais comumente executada, sendo em 170 casos operação isolada e em outros 23 casos associada a outros procedimentos, totalizando 193 hemorroidectomias. A técnica aberta (Técnica de Miligan-Morgan) foi aplicada na totalidade dos casos. Em 87,1% dos casos operados foram ressecados três mamilos hemorroidários e em 12,9% dois mamilos. O tempo operatório variou de 25 a 75 minutos, com média de 41 minutos. A quantidade de solução anestésica empregada foi em média 24 ml, variando de 15 a 50 ml.
    A avaliação da dor neste subgrupo de pacientes demonstrou ser de intensidade leve em 111 casos (57,6%) e moderada em 57 (29,5,%). Vinte e cinco pacientes (12,9%) queixaram-se de dor intensa durante o procedimento ou no pós-operatório imediato, sendo que dois deles necessitaram de internação hospitalar para controle da mesma.
    Três pacientes (1,6%) necessitaram de reoperação, dois por sangramento no pós-operatório imediato e um caso devido infecção na área operada. Este paciente apresentou processo infeccioso fulminante, evoluindo para gangrena de Fournier, necessitando de internação hospitalar para realização de colostomia e várias sessões de desbridamento em sala cirúrgica, com boa evolução. Dor intensa (2), sangramento (2) e infecção (1) foram responsáveis por um total de cinco pacientes (2,6%) que necessitaram de internação hospitalar.
    Fístulas perianais simples (69 - 13,5%) e fissuras anais (63 - 12,5%) foram outras afecções operadas nesta casuística.
    O tempo operatório (média de 18 minutos) e quantidade de anestésico empregada (média de 15ml) foram obviamente menor, nos portadores de fissura anal, desde que não associadas a doença hemorroidária. Dos 63 pacientes portadores de fissura anal submetidos a tratamento cirúrgico ( 38-fissurectomia+E.I e 25 -EILS ), um referiu incontinência anal para gases no pós-operatório precoce, mas estava assintomático decorridos 90 dias do procedimento operatório.
    De um total de 69 fistulotomias realizadas, quatro (5,8%) apresentaram recidiva da mesma, dos quais em dois diagnosticado tuberculose pulmonar ; foram tratados com esquema tríplice e evoluíram com cicatrização completa.
    Incisão e curetagem para o tratamento de cisto pilonidal foi realizada em 47 (9,2%) pacientes, sendo o terceiro procedimento mais realizado por ordem de freqüência.
    Ressecção e eletrocauterização de condilomas anais e perianais foi realizada em 39 (7,7%) pacientes.
    Houve um episódio de impactação fecal em um paciente submetido a cerclagem anal, tratado clinicamente em consulta ambulatorial.
    As complicações precoces e tardias da casuística global são listadas na Tabela II e III.

Tabela 2 - Tipos e incidência de complicações precoces.

Tabela 3 - Tipos e incidência de complicações tardias.

 

Oitenta e oito por cento (88%) dos pacientes operados manifestou aceitação do método ambulatorial sob anestesia local. Dor intensa foi a principal causa de não aceitação entre os insatisfeitos. A principal vantagem relatada foi a possibilidade de recuperação em ambiente domiciliar, com maior privacidade e conforto.

DISCUSSÃO
O manejo cirúrgico ambulatorial da maioria das doenças anorretais é hoje aceito amplamente nos centros médicos europeus e americanos. Acredita-se que mais de 90% das cirurgias orificiais possam ser realizadas com segurança em regime ambulatorial, reservando-se a internação para casos de exceção, com alto risco cirúrgico 1-10 .
    O presente estudo foi estimulado pela necessidade de liberação de leitos para operações mais complexas e pelo grande número de pacientes à espera de tratamento cirúrgico anorretal, no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo-HCFMUSP. As afecções tratadas na nossa casuística corresponderam às doenças rotineiramente encontradas na prática da especialidade, destacando-se hemorróidas, fístulas, fissuras,cisto pilonidal e condiloma anal. Um dos aspectos importantes para o sucesso da cirurgia proctológica ambulatorial é a criteriosa seleção de pacientes, tanto do ponto de vista médico, gravidade da doença, indicação cirúrgica, risco anestésico como do perfil psico-social do paciente. Desta forma, os portadores de doenças anorretais complexas (Ex: fístulas complicadas, abscessos e infecções extensas, etc.) e os que recusaram o método foram excluídos do estudo. Portanto, acreditamos que boa parte dos resultados insatisfatórios obtidos com essa prática cirúrgica traduz uma seleção inadequada dos pacientes, assim como o envolvimento de profissionais pouco motivados para com esta modalidade operatória.
    O uso de sedação parenteral adequada associado a anestesia local possibilitou a realização segura e eficaz dos procedimentos cirúrgicos, ao mesmo tempo que permitiu o retorno precoce do paciente ao ambiente domiciliar, onde o apoio familiar, privacidade e afastamento do clima de "doença" gerado pelo ambiente hospitalar propiciaram uma recuperação mais rápida e uma boa aceitação do método em 88% dos casos. Resultados semelhantes foram obtidos em outros relatos da literatura11,12,13.
    A cirurgia proctológica em regime ambulatorial tem sido realizada, na grande maioria dos serviços, com a utilização de anestesia geral ou raquídea, o que torna necessário a permanência do paciente em ambiente hospitalar pelo menos 6 a 8 horas após o término do procedimento; em muitos casos faz-se obrigatório a internação devido a efeitos anestésicos indesejáveis, como a desconfortável cefaléia pós-raquianestesia e/ou os vômitos. No presente estudo optamos pela anestesia local por ser mais segura, apresentar menor índice de efeitos sistêmicos e proporcionar bom relaxamento esfincteriano14,15 .
    A anestesia local tem sido realizada tradicionalmente por meio de infiltrações nos quatro quadrantes anais, o que torna o método doloroso em virtude da riqueza de terminações nervosas do anoderma. No início do estudo utilizamos apenas duas punções nos quadrantes laterais do orifício anal, e mais recentemente a técnica do anzol ganhou preferência, por ser menos dolorosa, além de proporcionar completo relaxamento anal 4 . Nesta técnica, a punção para infiltração do anestésico é realizada na região acima da linha pectínea cuja inervação é visceral, e portanto indolor. Posteriormente, traciona-se a agulha curva , e injeta-se cuidadosamente a solução anestésica na camada muscular mais profundamente. Deste modo, evita-se a manipulação do canal anal e pele perianal abaixo da linha pectínea, que possuem extensa rede de terminações nervosas sensitivas.
    Assim como no intra-operatório , o controle da dor no pós-operatório é outro importante desafio a ser enfrentado pelos cirurgiões na prática ambulatorial proctológica, tendo estimulado diversas publicações sobre o assunto 17-19 . Mais recentemente temos utilizado anti-inflamatórios não hormonais no pós-operatório imediato, com melhores resultados. O uso de dipirona e diclofenaco sódico foi suficiente para o alívio da dor na maioria dos nossos pacientes. Apesar de 57 pacientes (11,3%) referirem dor intensa, em somente dois deles houve necessidade de internação hospitalar para infusão parenteral de opióides. Alguns autores têm proposto o uso de fentanyl transdérmico como alternativa analgésica que melhoraria o controle da dor e diminuiria a necessidade de narcóticos e analgésicos parenterais no pós-operatório, porém, o risco de graves efeitos colaterais têm limitado o seu uso 17,18. O Toradol (Ketorolac) injetado na musculatura esfinctérica, no momento da cirurgia, tem sido utilizado, com resultados animadores19 , necessitando de estudos com maiores casuísticas.
    De um modo geral, a incidência de complicações precoces (dor, sangramento, infecção,etc.) e tardias (plicomas e mamilos residuais, estenose, etc.) em nosso estudo foram semelhantes às relatadas na literatura 11,12,20-25 . O índice geral de complicações precoces nos 503 procedimentos realizados foi de 16,1% , porém apenas cinco doentes (1,0%) necessitaram de internação hospitalar e destes , apenas três deles (0,6%) foram classificados como complicações maiores, necessitando reintervenção( 2-hemorragia e 1-infecção ).
    Uma das complicações mais freqüentemente descritas após cirurgia proctológica é a retenção urinária, com incidência em torno de 15%, variando de 1 a 52% 26-28. Em nossa casuística, apenas três pacientes apresentaram retenção urinária com necessidade de cateterização vesical (0,6%). A menor infusão parenteral de fluidos, a anestesia local, e a recuperação pós-operatória em ambiente domicilar, deixando o paciente menos ansioso e mais confortável, podem ser a explicação para a baixa incidência de retenção urinária aqui descrita 27 .
    No tratamento cirúrgico da doença hemorroidária, complicações sépticas graves são raras, mas uma vez esta-belecidas podem apresentar evolução catastrófica, como o que ocorreu em um de nossos casos. Alguns fatores de risco (alcoolismo, desnutrição, diabetes mellitus, neoplasias, imunodepressão, má higiene local) são associados ao aparecimento de infecção local, que deve ser diagnosticada precocemente e tratada com medidas terapêuticas agressivas e precoces 29 . Após múltiplos desbridamentos cirúrgicos e colostomia, nosso paciente apresentou boa evolução clínica, atualmente sem estoma e com boa continência anal. Habitualmente preconizamos para as hemorroidectomias a antibioticoprofilaxia com uma única dose pré-operatória de antibiótico endovenoso (Cefoxitina sódica 1,0g).
    Deve ser ressaltado que não houve mortalidade neste grupo de doentes.
    Ao nosso ver, os portadores de doença anorretal com indicação cirúrgica devem ser inicialmente avaliados para a possibilidade de realização da mesma sob regime ambulatorial, especialmente em hospitais públicos e universitários, onde a demanda é grande, associado a falta de leitos para operações de maior complexidade. Nos Estados Unidos da América, estudos demonstraram que a diminuição dos custos com o emprego da cirurgia ambulatorial pode alcançar 200 milhões de dólares ao ano1 . Lacerda e Melo12 calcularam uma economia girando em torno de 400 dólares por paciente submetido a hemorroidectomia ambulatorial, quando comparado com a intervenção em regime de internação hospitalar.
    Neste estudo, realizamos uma estimativa de custo comparando seis doentes submetidos a hemorroidectomia em unidade ambulatorial com outros seis submetidos ao mesmo procedimento sob regime de internação hospitalar. Os valores foram obtidos com os cálculos das fichas de sala cirúrgica e da permanência hospitalar obtidas pela Fundação Faculdade de Medicina da USP.
    Os operados em regime ambulatorial tiveram um custo médio de 370 dólares (U$ 370) americanos cada um (material e hospital), comparado com U$ 540 quando realizado com internação de um dia, ou seja, uma economia de 31,5%.

CONCLUSÃO
Com a experiência obtida nessa série de doentes, constatamos que a cirurgia proctológica orificial pode ser realizada com segurança e baixa morbidade em unidades ambulatoriais, além da evidente diminuição dos custos, melhorando dessa maneira a relação custo-benefício. É necessário, portanto, maior divulgação e fortalecimento desta prática cirúrgica em nosso meio, principalmente em hospitais universitários, que além das vantagens acima citadas, permitiria aumentar o número de operações, gerando maior facilidade do aprendizado de propedêutica e melhor aprimoramento de técnica cirúrgica dos alunos e residentes.

SUMMARY: From October 1992 to January 2000, five hundred and three operative procedures for treatment of anorectal diseases were performed under local anesthesia in the ambulatory unit of the Hospital das Clínicas de São Paulo. Local anesthesia was performed by hook-needle puncture tecnique in 49 patients and the rest of them by classical technique through infiltration of both lateral anal quadrants. Hemorrhoids, fistulas, fissures, pilonidal cysts and anal condiloma were the most frequent diseases treated (85,8%). The incidence of early and late complications was 16,1% and 4,8%, respectively. The most common complication was severe pain (11,3%). Five patients (1,0%) required hospitalization due postoperative complications. The surgery on an outpatient basis was a well-accepted procedure for four hundred forty-seven patients (88%). Hemorrhoidectomy performed in an ambulatory unit provided a US$ 170 saving when compared to the same procedure in one-day-hospitalization patients, i.e., 31,5% cheaper. The main benefit reported by patients was the possibility of recovery at home, wich is more comfortable. The ambulatory anorectal surgery under local anesthesia is a safe and effective method, with the additional advantage of the costs saved and the increase of available beds for more complex surgeries.

Key Words : Anal surgery, outpatient surgery, local anesthesia, anesthetic technique.

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Trabalho realizado na Disciplina de Colo-Proctologia do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de são Paulo (FMUSP).