RELATO DE CASO


RABDOMIOSSARCOMA PARARRETAL: RELATO DE CASO

Sandra Pedroso de Moraes - TSBCP
Flávio Quilici - TSBCP
José Alfredo dos Reis Neto - TSBCP
Alexandre Pellizer
Geanna Mara Lino e Silva de Resende
Thiago Mussato Carcinoni

Moraes SP, Quilici F, Reis Neto JAR, Resende GMLS, Carcinoni TM. Rabdomiossarcoma pararretal: relato de caso. Rev bras Coloproct, 2002;22(1):33-35.

RESUMO: Rabdomissarcoma raramente acomete o sistema digestório e a região pararretal. Os autores relatam o caso clínico de um paciente de 40 anos, com história de fezes em fita há um ano, acompanhadas de tenesmo e episódios esporádicos de enterorragia.
   
Ao exame físico apresentava-se em bom estado geral, corado e hidratado. Ao exame proctológico evidenciava-se abaulamento na região perianal direita onde palpava-se tumoração endurecida. Ao toque retal, até 8cm da margem anal, a tumoração ocupava aproximadamente 30% da luz, fixa, com mucosa aparentemente lisa, sem sangue na luva. Submetido à biopsia incisional da lesão, por via perianal, o exame anatomopatológico revelou sarcoma pouco diferenciado grau III, com estudo imunohistoquímico revelando rabdomiossarcoma embrionário. Exames de imagem (ultra-som e tomografia computadorizada) diagnosticaram lesão expansiva sólida e heterogênea, com pequena área de liquefação, medindo 7,5x7x7cm, envolvendo esfíncter anal externo. Colonoscopia e exames de estadiamento não mostraram nenhuma outra anormalidade. O paciente foi submetido à amputação abdominoperineal de reto com esvaziamento ganglionar e colostomia terminal. Em razão da infiltração tumoral às estruturas adjacentes, houve lesões em uretra prostática, região póstero-lateral direita da bexiga com desinserção do ureter, sendo as primeiras suturadas e o ureter reimplantado. Apresentou boa evolução, sem complicações pós-operatórias. Foi encaminhado para radio e quimioterapia, mas não realizou o tratamento complementar. Atualmente encontra-se no 4º mês de pós-operatório, apresentando-se em boas condições clínicas.

Unitermos: rabdomiossarcoma, neoplasia anorretal, tumores raros pararretais

INTRODUÇÃO
Rabdomiossarcoma, neoplasia maligna de origem mesenquimal de musculatura estriada, é freqüente em crianças, representa aproximadamente 5% dos sarcomas de membros, tronco, cabeça e pescoço. No sistema digestório e particularmente na região pararretal é raro. Somente 15 casos foram descritos na literatura até recentemente1-5.
    O objetivo deste trabalho é relatar o caso clínico de um paciente com rabdomiossarcoma pararretal e expor os métodos diagnósticos e terapêuticos frente a essa enfermidade.

RELATO DO CASO
Paciente HL, masculino 40 anos, branco, casado, natural e procedente de Indaiatuba, São Paulo. Procurou o Serviço com história de tenesmo, fezes em fita há um ano e episódios esporádicos de enterorragia. Ao exame físico apresentava-se em bom estado geral, corado e hidratado. Ao exame proctológico evidenciava-se abaulamento na região perianal direita, onde palpava-se tumoração endurecida. Ao toque retal, até 8cm da margem anal, a tumoração ocupava aproximadamente 30% da luz, fixa, com mucosa aparentemente lisa, sem sangue na luva. Submetido à biopsia incisional da lesão, por via perianal, o exame anatomopatológico revelou sarcoma pouco diferenciado grau III, com estudo imunohistoquímico revelando rabdomiossarcoma embrionário. Exames de imagem (ultrassom e tomografia computadorizada) diagnosticaram lesão expansiva sólida e heterogênea, com pequena área de liquefação, medindo 7,5x7x7cm, envolvendo esfíncter anal externo. Colonoscopia e exames de estadiamento não mostraram nenhuma outra anormalidade. O paciente foi submetido à amputação abdominoperineal de reto (Fig.1) com esvaziamento ganglionar e colostomia terminal. Em razão da infiltração tumoral às estruturas adjacentes, houve lesões em uretra prostática, região póstero-lateral direita da bexiga com desinserção do ureter, sendo as primeiras suturadas e o ureter reimplantado. Apresentou boa evolução, sem complicações pós-operatórias. Foi encaminhado para radio e quimioterapia, mas não realizou o tratamento complementar. Atualmente encontra-se no 4º mês de pós-operatório, apresentando-se em boas condições clínicas.

 

Figura 1 - Fotografia da peça operatória aberta mostrando, pela face mucosa, a tumoração predominantemente na extremidade superior esquerda.

DISCUSÃO
Rabdomiossarcoma na região perianal aparece em todas as faixas etárias e sem predileção para sexo.1-4
   
Nos casos relatados na literatura, os pacientes procuraram atendimento médico quando já havia tumoração vísivel, às vezes com ulceração da pele. O diagnóstico inicial, com freqüencia, foi de abscesso ou fístula perianal e o tratamento dirigido para essas enfermidades1-3.
    Na anamnese o paciente não informou que apresentava tumoração na região perineal. Somente relatou sintomas relacionados à evacuação.
    Comprometimento do estado geral e enfartamento ganglionar inguinal foram encontrados em pacientes com doença avançada1. Este paciente, apesar da extensão local do tumor, não apresentava enfartamento ganglionar e encontrava-se em boa condição clínica .
    Metástases linfonodais têm sido encontradas em 35% dos pacientes e em menor freqüência em pulmões, pleura, pâncreas e ossos2. No presente caso não havia metástases.
   
O diagnóstico de rabdomiossarcoma pararretal geralmente é feito por biópsia incisional pararretal1,2,4, pois a mucosa retal, na maioria das vezes, está preservada.
    O exame anatomopatológico da peça operatória mostrou grande infiltração das camadas musculares.
    Exames de imagem, principalmente a tomografia computadorizada, são fundamentais para se avaliar a extensão e os limites tumorais e estabelecer a terapêutica mais adequada.
    Não há consenso na literatura sobre o melhor tratamento para esta neoplasia.
    Um caso com tumoração polipóide, em criança, foi tratado por excisão local, com realização de biópsias de linfonodos nas regiões inguinais, pélvica e para-aórtica que apresentaram-se histológicamente normais.4
   
Outros autores indicaram ressecção abdominoperineal radical com colostomia definitiva, pela freqüência de recidivas locais ( 60% dos pacientes).2,3
   
Alguns pacientes foram tratados exclusivamente com radioterapia e quimioterapia.1
   
Radioterapia e quimioterapia em geral têm sido empregadas como condutas adjuvantes2,3,4,5. As drogas quimioterápicas mais usadas foram vincristina, actinomicina D e ciclofosfamida e as menos usadas, bleomicina, adriamicina e fluorouracil.
    No presente caso foi indicada amputação abdominoperineal do reto pela grande extensão do tumor e seu envolvimento com a parede intestinal. O paciente foi encaminhado para radio e quimioterapia no pós-operatório, mas até o momento não iniciou esses tratamentos.
    A experiência mundial com rabdomissarcoma pararretal é reduzida e 72% dos pacientes morreram no primeiro ano de pós-operatório2. Não se conseguiu relacionar o tipo histológico (alveolar, pleiomórfico, botrióide ou embrionário) com o prognóstico tumoral e assim estabelecer a melhor conduta para cada paciente.
    Portanto, até que se conheça melhor o comportamento deste tumor, a conduta cirúrgica radical, associada à radio e à quimioterapia, provavelmente é a melhor opção terapêutica. A excisão local deve ser reservada para casos selecionados de tumores pediculados pequenos, sem evidência de metástases.

SUMMARY: Rabdomiosarcoma rarely ever affects the digestive system and pararectal region. The authors reported a clinical case of a 40 year old patient with a former background of tape like stools followed by tenesmus and random episodes of entherorraghia. The physical evaluation indicated a good general state, good coloration and hydration level. The proctologic evaluation indicated a bulging in the right perianal area with evidence of hardened tumor during palpation. The rectal touch evaluation showed that the tumor occupied approximately 30% of the lumen until 8 cm from the anal rim, it was fixed with apparently smooth mucosa without blood in the glove. The patient underwent incisional biopsy of the lesion by perianal route, the anathomopathologic examination revealed a poorly differentiated sarcoma of level II and a immunohystochemical test revealed an embrionary sarcoma. Imaging assessment (ultrasound and CT scan) diagnosed a solid expansive heterogeneous lesion, with a small liquefied area, measuring 7,5x7x7cm, and surrounding the external anal sphincter. Colonoscopy and staging examinations did not show any other abnormality. The patient underwent abdominoperineal amputation of the rectum with ganglion emptying and terminal colostomy. Due to the tumor infiltration in the surrounding structures the patient had injuries in the prostate and urethra, in the right poster lateral region of the bladder being both sutured and the urether was reimplanted. The patient presented a good outcome with no postoperative complications. He was referred to radio and chemotherapy, but did not undergo additional treatment. Currently the patient is in the 4th postoperative month and has good clinical status.

Key words: rabdomyosarcoma, anorectal neoplasia, rare pararectal tumor.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Manzione A, Garcia VCM, Graciotti Jr. O, Mallmann A, Camargo JC - Rabdomiossarcoma pararretal. Relato de dois casos. Rev Hosp Clín Fac Med S Paulo 1984; 39(5):243-7.
2. Bacon HE, Herabat T, Koohdary A, Villanueva RP - Pararectal rhabdomyosarcoma: report of a case. Dis Colon Rectum 1974; 17(3):365-9.
3. Sasajima K, Okawa K, Sasamoto Y, Shirota A, Aihara K - Pararectal rhabdomyosarcoma: report of a case. Dis Colon Rectum 1980; 23:576-7.
4. Srouji MN, Donaldson MH, Chatten J, Koblenzer CS - Perianal rhabdomyosarcoma in childhood. Cancer 1976; 38:1008-12.
5. Camperoni LRR, Féres O, Venesiano SG, Segato FN, Dy Roga, Rocha JJR, Aprilli F - Rabdomiossarcoma pararretal. Relato de caso. Rev Bras Coloproct 2000; 20 (supl 1):86.

Endereço para correspondência:
Sandra Pedroso de Moraes
Rua Boaventura do Amaral, 684/131
13015-191 Campinas (SP) - Brasil
E-mail: grapas@terra.com.br

Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital Celso Pierro - PUC - Campinas (SP)