ATUALIZAÇÃO


FUNCIONAMENTO ANORRETAL APÓS RESSECÇÃO ANTERIOR BAIXA

Renato Araújo Bonardi - TSBCP


RASMUSSEN O.O., PETERSEN I.K., CHRISTIANSEN J. Anorectal function following low anterior resection. Colorectal Dis 2003;5:258-261.

BONARDI RA .Atualização. Funcionamento anorretal após ressecção anterior baixa. Rev bras Coloproct, 2003;23(2):112-113

ABSTRATO
A função anorretal após a ressecção anterior baixa por carcinoma de reto foi avaliada em 43 pacientes, 16 femininos e 27 masculinos com uma idade média de 66 anos (variando de 41 a 79 anos). Vinte e três pacientes receberam uma ileostomia protetora no momento da ressecção inicial. Oito pacientes foram submetidos a bolsa colônica em "J". Em 10 pacientes ocorreu um vazamento da anastomose, sendo que em dois, com a ileostomia protetora. Um paciente recebeu radioterapia pré-operatória de 25Gy.
    A distância da margem anal à anastomose foi em média de 7 cm (variando de 3 a 12cm).
    A avaliação dos pacientes foi realizada com uma média de 12 meses (variando de 3 a 30 meses) após a ressecção do carcinoma do reto. Foram analisados os dados clínicos, manometria anal e complacência retal.
    A freqüência evacuatória foi em média de 3 vezes ao dia (variando de 1 a 10). Vinte e dois pacientes (51%) estavam continentes; onze (26%) incontinentes para gazes e dez (23%) incontinentes para fezes (sendo 3 para fezes líquidas e 7 para fezes sólidas). O nível da anastomose nos pacientes com constipação foi em média de 5 cm (variando de 3 a 12cm), enquanto que, para os pacientes sem constipação, foi de 7 cm (variando de 3 a 10cm) [p=NS]. A manometria anal foi normal. A complacência retal foi menor nos pacientes com incontinência para fezes líquidas ou sólidas em comparação com os pacientes com incontinência para gazes [p<0.01]. O volume retal tolerado foi menor nos pacientes incontinentes comparados aos pacientes continentes [p<0.05]. O reflexo reto-anal se manteve presente em 31 (72%) pacientes. Ocorreu uma correlação negativa entre volume retal máximo e freqüência evacuatória, bem como entre o nível da anastomose e o grau de incontinência. A idade não afetou o resultado funcional.
    Muitos pacientes apresentaram maus resultados funcionais após a ressecção anterior baixa por carcinoma retal. Um em cada quatro pacientes apresentou incontinência para fezes líquidas ou sólidas e um terço dos pacientes evoluiu com constipação. O nível baixo da anastomose mostrou uma tendência em aumentar a freqüência evacuatória com um maior risco de incontinência. Os pacientes com incontinência fecal apresentaram uma tendência a uma menor complacência retal do que pacientes continentes, enquanto que não houve diferença nas pressões anais.

Comentários
Este estudo mostrou que somente a metade dos pacientes ficou completamente continente após uma ressecção anterior baixa por carcinoma de reto; um terço com constipação necessitou de enemas evacuadores ou laxativos. A principal conclusão deste trabalho é de que as mudanças na complacência retal representa o fator decisivo no funcionamento pós-operatório e não lesão dos esfincteres. Existem na literatura trabalhos semelhantes que comprovam os achados dos autores. O estudo demonstrou ainda que a função anorretal melhorou com o passar do tempo, tendo em vista a avaliação em média aos 12 meses, o que provavelmente representa o resultado final da função anorretal.
    Como era de se esperar, os 8 pacientes que receberam a bolsa colônica em "J" não apresentaram diferença com relação às anastomoses termino-terminais em relação ao resultado final.
    Hallbook e colaboradores demonstraram que o resultado inicial com as bolsas colônicas é superior às anastomoses termino-terminais, porém esta superioridade desaparece após um ano da cirurgia.
    A correlação inversa do risco de incontinência em relação ao nível da anastomose, em que os pacientes com anastomoses muito baixas provavelmente apresentam uma alteração do reflexo inibitório reto-anal, o que foi bem demonstrado por Matzel e colaboradores (1997) e Ikeuchi e colaboradores em 1996.
    No presente trabalho, em 30% dos pacientes o reflexo inibitório reto-anal desapareceu após a anastomose muito baixa. A incontinência como a dificuldade de evacuação ocorreu em mais de 25% dos pacientes, tanto em decorrência da diminuição da complacência do reto quanto da alteração do reflexo reto-anal.
    Estes achados deverão se tornar mais freqüentes com o aumento da experiência nas ressecções anteriores baixas por carcinoma do reto. Baseados nestes relatos os pacientes deverão ser avisados e orientados no sentido da escolha do procedimento adequado.

bibliografia recomendada

Hallbook O, Pahlman L, Krog M, Wexner SD, Sjodahl R. Randomised comparison of straight and colonic J pouch anastomosis after low anterior resection. Ann Surg 1966;224:58-65.

Matzel KE, Stadelmaier U, Muehldorfer S, Hohenberger W. Continence after colorectal reconstruction following resection. Impact of level of anastomosis. Int J Colorectal Dis 1997;12:82-87.

Ikeuchi H, Kusunoki M, Shoji Y, Yamamura T, Utsonomia J. Clinico-physiological results after sphincter-saving resection for rectal carcinoma. Int J colorectal Dis 1996;11:172-176.