TRIBUNA LIVRE: COMO EU FAÇO
FERNANDO CORDEIRO -TSBCP
FABIO GUILHERME CASERTA MARYSSAEL CAMPOS -TSBCP
FARID JACOB ABI RACHED -TSBCP
HERCIO AZEVEDO DE VASCONCELOS CUNHA -TSBCP
JULIO CESAR MONTEIRO DOS SANTOS JUNIOR -TSBCP
Como sempre, gostaríamos de agradecer
aos nossos colegas a participação nesta seção, pois,
sem eles, ela não existiria. Lembramos sempre, que o
nosso objetivo é favorecer a participação de todos,
permitindo assim que emitam suas opiniões livremente.
Além destes agradecimentos,
aproveitamos para colocar aos colegas que esta é uma
TRIBUNA LIVRE e não há necessidade de convites para que
sua opinião seja discutida. Enquanto houver
distintos posicionamentos dos apresentados, o tema será
mantido ou retornará à discussão, porém não serão
publicados os textos considerados contestatórios.
Gostaríamos ainda de solicitar aos colegas
que queiram participar, que enviem sugestões de novos
temas ou perguntas, bem como suas condutas nos
casos discutidos.
Àqueles interessados em colaborar,
manteremos sempre um canal aberto pelo fax
019.32524874 ou e-mail:
fernandocordeiro@globo.com.
Nesta edição discutiremos o tema:
"Prurido anal - como tratar?", com a colaboração de
membros da nossa Sociedade:
Fabio Guilherme Caserta Maryssael Campos (São
Paulo-SP)
Farid Jacob Abi Rached (Araraquara-SP)
Hercio Azevedo de Vasconcelos Cunha (Campinas-SP)
Julio Cesar Monteiro dos Santos Junior (Guaratinguetá-SP)
Gostaria de agradecer a opinião dos nossos colegas, deixando sempre aberta esta porta para discussões futuras. Agora passaremos às questões desta edição:
1. Como você investiga a queixa de prurido anal? As enfermidades não relacionadas ao ânus também influenciam a sua conduta investigatória?
Fabio Guilherme Caserta Maryssael Campos - De
maneira geral, a história clínica e o exame físico
permitem inferir a causa do prurido. Se o paciente
apresenta prurido anal agudo, sem história prévia, a
investigação inicial se limita ao exame proctológico.
Entretanto, nos casos de prurido anal crônico, a
investigação inicial deve incluir também a pesquisa de afecções
não relacionadas à região anal (diabetes,
hepatopatias, parasitoses e micoses), analisando dados:
a) clínicos: checar sintomas e antecedentes
pessoais para descartar doenças sexualmente
transmissíveis, doenças ginecológicas, consumo de agentes
irritantes (álcool, café, chocolate, frituras, queijo,
medicamentos), consumo de medicamentos (antibióticos,
anti-inflamatórios, antimicóticos), doença inflamatória
intestinal, alergias sistêmicas, afecções ano-retais
(fístulas, prolapso hemorroidário, tumores ano-retais),
diarréia crônica (abuso de laxantes), constipação
intestinal, dermatite de contacto (hábitos de higiene, uso de
sabonetes, talco, pomadas, material das roupas íntimas),
condições para intertrigo (sudorese excessiva,
obesidade, roupas justas), alterações psicológicas e outros;
b) laboratoriais: parasitológico de fezes,
swab anal, glicemia e uréia; dosagens hormonais em
mulheres na menopausa; exame citológico e/ou cultura
de secreções para pesquisa de fungos;
c) do exame proctológico.
Pacientes com doença sistêmica como
diabetes, doença de Hodgkin, aidéticos, transplantados
e outros merecem considerações individualizadas,
assim como aqueles portadores de DST (doenças
sexualmente transmissíveis).
Farid Jacob Abi Rached - Em primeiro lugar através da história clinica, exames proctológico e laboratoriais específicos, dependendo da história clinica, sendo estes: Retossigmoidoscopia e nesta dando muita importância à inspeção da região perianal. As enfermidades não relacionadas ao anus também devem ser investigadas e podemos citar: diabetes, verminoses, esquistossomose, AIDS, blastomicose, etc.
Hercio A. de Vasconcelos Cunha - Inicio a
abordagem do paciente com uma minuciosa anamnese,
incluindo não só fatores relacionados com a queixa, como a
pesquisa de outras enfermidades que possam predispor
o prurido anal. Investigo também os hábitos
pessoais, tais como: higiene, alimentação, vestimenta, uso
de produtos tópicos e antecedentes cirúrgicos.
O exame físico deve incluir, além de
inspeção detalhada da região perianal, o exame proctológico
completo com inspeção estática e dinâmica, toque
retal, anuscopia e retossigmoidoscopia para diagnóstico
de enfermidades orificiais e pesquisa para constatação
de doenças dermatológicas locais ou generalizadas
com inspeção em especial das articulações, dedos e
unhas .
Se o diagnóstico não puder ser confirmado,
solicito protoparasitológico, coprocultura e pesquisa de
fungos, podendo incluir testes sorológicos (sífilis, HIV, etc).
Julio Cesar Monteiro dos Santos Junior - O prurido anal é sintoma comum em geral associado às doenças anorretais ou sistêmicas, desde as mais simples às mais complexas. Assim, na abordagem inicial, mesmo que a presença do paciente seja exclusivamente por causa do prurido anal, a anamnese é direcionada, em primeiro lugar, para as doenças anorretais; em seguida, coloproctológicas e, finalmente, para as sistêmicas.
2. Como você trata as lesões que não tenham relação com enfermidades sistêmicas? Sempre da mesma forma ou depende do aspecto da lesão?
Fabio Guilherme Caserta Maryssael Campos -
Depende do aspecto da lesão. As alterações
dermatológicas perianais não suspeitas são tratadas com higiene
local por meio de banhos de assento com água morna
(evitando a limpeza compulsiva) associada ao uso local
de corticóides tópicos ou anti-histamínicos. Além
disso, oriento evitar agentes irritantes ou sensibilizantes
e manter um bom funcionamento intestinal,
descartando consumo de alimentos irritantes, papel higiênico
e roupa íntima com material sintético.
Lesões específicas de DST (sífilis,
gonorréia, herpes simples) devem ser tratadas individualmente,
com o acompanhamento de um infectologista. Causas dermatológicas como dermatite seborréica, psoríase,
e candidíase são melhor tratadas por um
dermatologista.
Já as lesões verrucosas (como condiloma
acuminado) e as diferentes formas de tumores anais
(AIN, carcinomas) devem ser manuseadas localmente
através de ressecção, cauterização ou biópsia.
Farid Jacob Abi Rached - Sempre da mesma forma, iniciando com cuidados de higiene, orientação ao paciente, educação, utilização de trajes adequados que permitam diminuir a umidade da região perianal, tranqüilizantes, cremes com corticóides.
Hercio A. de Vasconcelos Cunha - O tratamento
das lesões locais depende do aspecto da lesão. Uma
orientação dietética, de higiene anal e sobre as
vestimentas deve sempre ser realizada, pois a maioria dos casos
de prurido anal é idiopática, podendo se resolver
apenas com estas orientações.
Nos casos com etiologia específica, a
causa deve ser erradicada. As doenças orificiais devem
ser tratadas antes de iniciar qualquer terapia para o
prurido (hemorroidectomia, esfincterotomia,
fistulectomia, correção da incontinência anal, etc). Nos casos de
infecções bacterianas, fúngicas e virais o tratamento
específico deve ser ministrado.
Os pacientes com diagnóstico de prurido
anal idiopático, além das orientações descritas acima,
podem ser tratados com aplicações tópicas, como
por exemplo solução aquosa de nitrato de prata.
Julio Cesar Monteiro dos Santos Junior - Se forem apenas dermatológicas, o tratamento dependerá de suas características o que, em dermatologia, pode ser o elemento definidor do diagnóstico. O fato de não ter relação com doença sistêmica existente, não prende a lesão ao fator etiológico relacionado à esfera anorretal. Nesses casos, é claro que não dispenso o concurso do dermatologista só porque a pele está em volta do ânus. Assim, a lesão vai ser tratada de acordo com o diagnóstico dermatológico, meu, se correto, ou do dermatologista. Contudo, se a lesão não for relacionada a qualquer outro tipo de doença, mas decorrente de alterações anorretais, o tratamento será dirigido à alteração causadora (fissura, pólipo anal, plicoma residual ou, até mesmo, a higiene anal inadequada) e nesse caso o tratamento é dirigido à causa e não à conseqüência. Isto é, se o paciente tem pólipo anal que sai do ânus e provoca o prurido, o tratamento consistirá na retirada do pólipo e a pele receberá, secundariamente, os cuidados cosméticos que forem necessários. O mesmo raciocínio é válido para hemorróidas ou outras moléstias anais.
3. Você realiza biópsias para descartar enfermidades tratáveis cirurgicamente ou faz teste terapêutico?
Fabio Guilherme Caserta Maryssael Campos - As lesões perianais pré-malignas são raras, sendo muitas vezes diagnosticadas acidentalmente durante cirurgias ano-retais. Deve ser biopsiada qualquer lesão suspeita (área de exantema ou eczema perianal) que não desapareça ou cicatrize com a instituição de medidas locais ou que seja sintomática por longos períodos. São lesões pré-malignas a neoplasia anal intraepitelial (AIN - carcinoma in situ), doença de Bowen ou papulose Bowenóide (carcinoma intraepitelial de alto grau) e a doença de Paget (lesão intraepitelial não escamosa). Muitas delas ocorrem em associação ao HPV, devendo ser tratadas por ressecção local com margens negativas.
Farid Jacob Abi Rached - Com a finalidade de descartar enfermidades tratáveis cirurgicamente as biópsias devem ser realizadas, dependendo da suspeita diagnóstica e muitas vezes o procedimento cirúrgico já deva ser realizado (no caso de ser o prurido causado por patologias orificiais).
Hercio A. de Vasconcelos Cunha - Realizo biópsias e/ou raspagem nos casos inconclusivos. Em pacientes com lesões inespecíficas, podemos utilizar a imuno-histoquímica e até estudo do DNA para diagnóstico de lesões como a condilomatose perianal incaracterística.
Julio Cesar Monteiro dos Santos Junior - Se a história clínica e o exame visual da área afetada fornecerem subsídios para o diagnóstico, a coleta de material ou a biópsia serão dispensados. Caso contrário, encaminhamos para a colheita de amostras, porque não dispomos, no consultório, dos apetrechos que, em geral, fazem parte do arsenal do dermatologista, tais como microscópio, escarificadores, lâminas, meio de cultura, corantes, fonte de luz especial, etc., necessários para identificar elementos essenciais aos diagnósticos imediatos de lesões dermatológicas. Mas, se a lesão, ao exame especular, for daquelas de tratamento cirúrgico, a opção de tratamento será a remoção cirúrgica da lesão. Ficam para a biópsia - da mucosa retal ou da própria "lesão perianal" que possa ser a causa do prurido - aquelas lesões que deixam dúvidas quanto aos seus caracteres histopatológicos. Não faço o teste terapêutico. Recentemente fiz circular pela Listserv a foto de uma lesão perianal (melanoma) com história de 6 meses de evolução que, insistentemente, recebeu esse tipo de teste (teste terapêutico) com aceitação por parte do paciente, porque a pomada prescrita fazia cessar o incomodo que a lesão causava. Então, acho mais prudente que a dúvida, quando houver, seja desfeita com a biópsia, não com teste!
4. Você utiliza algum recurso cirúrgico para o tratamento do prurido anal idiopático?
Fabio Guilherme Caserta Maryssael Campos - Alguns autores defendem a idéia de destruir cirurgicamente fibras nervosas sensitivas para controle da sintomatologia. Não utilizo e não recomendo nenhum recurso cirúrgico similar para tratamento do prurido anal, pois se reconhece que esta abordagem está associada a maus resultados.
Farid Jacob Abi Rached - Excepcionalmente, nos casos que não respondam às varias alternativas utilizadas, após explicar bem ao paciente, realizo três raquetes no anoderma, semelhante à hemorroidectomia convencional com a finalidade de denervação da região.
Hercio A. de Vasconcelos Cunha - Não costumo indicar cirurgia para pacientes com prurido anal. Apesar das várias técnicas existentes, nenhuma consegue resultados satisfatórios, apresentando morbidades importantes em alguns casos.
Julio Cesar Monteiro dos Santos Junior - Não
5. Comentários adicionais?
Fabio Guilherme Caserta Maryssael Campos - O sucesso do tratamento depende da identificação do fator etiológico, o que nem sempre ocorre, determinando o prolongamento do quadro e forçando o paciente a procurar vários profissionais. No início do tratamento, a principal medida é necessário "quebrar" o círculo vicioso que se estabelece quando o indivíduo tem uma lesão, se coça e provoca irritação local que desencadeia mais prurido. Outras medidas gerais incluem evitar exercícios ou ficar sentado por longos períodos, controle da obesidade e uso de benzodiazepínicos (em casos selecionados).
Farid Jacob Abi Rached - O prurido anal ainda é uma das causas que leva muitos pacientes a nos procurar e devemos dar atenção especial à nossa anamnese, pois ela na maioria das vezes nos ajudará no diagnóstico.
Hercio A. de Vasconcelos Cunha - O atendimento
dos pacientes com prurido anal não é tão simples como
parece. A dificuldade diagnóstica é a grande vilã na
condução dos pacientes. O relacionamento médico-paciente
deve ser estreito, assegurando sempre o maior número de
informações aos pacientes. Deve-se realizar uma rotina
para a investigação, lembrando de todas as causas
possíveis de prurido anal (higiene, dieta, vestimenta,
doenças anorretais, alterações dermatológicas, estados
diarreicos, causas ginecológicas, doenças sistêmicas, neoplasias,
infecções por vírus, parasitas, fungos ou bactérias, drogas
e fatores psicológicos), orientando o paciente sobre a
seqüência dos procedimentos a serem adotados.
Outra opção que devemos ter em mente é
solicitar a colaboração de especialistas de outras
áreas, como dermatologistas e clínicos gerais,
compartilhando, com os colegas de profissão e com o próprio
paciente, o tratamento dessa enfermidade.
Esta rodada de perguntas e respostas encerra esta seção da TRIBUNA LIVRE: COMO EU FAÇO.
Agradecemos novamente a inestimável colaboração dos colegas que prontamente responderam à nossa solicitação e
tornaram possível a realização de mais uma tribuna.
Este tema é amplo e nossa intenção é a de dar um rápido enfoque do tratamento da enfermidade nos
vários locais alcançados por nossa Sociedade.
Se você tem alguma opinião divergente ou gostaria de completar aquilo que foi aqui referido, escreva-nos.
Gostaríamos de ter sua participação efetiva independente de sua titulação dentro da Sociedade e mais
uma vez agradecer àqueles que de maneira tão rápida, gentil e extremamente concisa colaboraram para manter
acesa conosco a chama desta TRIBUNA.
Novamente, o nosso fax é: 019.32418866 e
E-mail: fernandocordeiro@globo.com.
Participe.
Fernando Cordeiro