doenças sexualmente transmissíveis


OS PRESERVATIVOS NA PREVENÇÃO DAS DOENÇAS SEXUALMENTE TRANSMITIDAS

SIDNEY ROBERTO NADAL - TSBCP


NADAL, SR.Os Preservativos na Prevenção das Doenças Sexualmente Transmitidas. Rev bras Coloproct, 2003;23(3):225-227

As doenças sexualmente transmitidas (DST) são infecções que resultam em síndromes causadas por mais de 25 agentes etiológicos. As migrações humanas ocasionaram a distribuição mundial dessas afecções. Já o crescimento de sua incidência é provocado pela liberação sexual e pelo aumento dos relacionamentos sexuais ocasionais. A prevenção pode ser conseguida com abstinência sexual ou adoção de práticas sexuais seguras, como o uso constante e correto dos métodos de barreira.1
   
Pequena porção da população é adepta da abstinência sexual. Na sociedade atual, a sensualidade explícita na população e na mídia banaliza o assunto e estimula a pratica do sexo. Desta maneira, devemos orientar o uso constante e correto do preservativo, para prevenção das DST e evitar gestações indesejadas. Entretanto, há os que preferem quebrar os códigos de ética social e se ufanam por não utilizar a camisinha, mesmo conhecendo os riscos. Ao contrário, sua colocação para a proteção do parceiro também foi relatada.2 Aliado a esse aspecto há também a condenação religiosa dos métodos anticoncepcionais, que não será abordada.
    Alguns autores observaram que as populações avaliadas têm pouco conhecimento sobre a transmissão das afecções venéreas e maior interesse em evitar a gravidez. Desta forma, dentre as razões para usar condom, 83% dos homens o fizeram por esse motivo, 12% para prevenir doenças, 3% por insistência das parceiras e 2% por outras causas.3 Contrariando esse conceito, o fator mais importante para o uso pelos adolescentes de Uganda foi o fato de conhecer alguém que morreu de AIDS.4 No entanto, muitas mulheres ainda enfrentam resistência e violência, em alguns casos, como resposta aos seus pedidos. O maior problema na negociação é a sugestão de infidelidade, que não poderá ser abordada.5 Os usuários de drogas apresentam comportamento sexual de maior risco para as DST que os não usuários. Acredita-se que tenham percepção clara desse risco, mas é provável que suas decisões sejam prejudicadas pelo efeito do alucinógeno e pela dificuldade em obter o preservativo.6
   
O mercado dispõe de condons masculinos e femininos, de látex ou de poliuretano. Quando aplicados de forma correta, conferem proteção contra gravidez e DST entre 90 e 97% das vezes.7,8,9 Dentre as causas de ineficácia do método foram citados o retardo na colocação, a ruptura e o deslizamento.10 Importante é a colocação logo após a ereção e antes dos jogos preliminares. Esse comportamento, que tem recebido pouca atenção, evita o contato com fluido pré-ejaculatório que apresenta tanto risco para infecções como o coito sem proteção.11
   
O condom de poliuretano surgiu como alternativa segura para pessoas com hipersensibilidade ao látex. Em testes controlados, a probabilidade de gravidez após seis meses de uso variou de 4,8% a 10,8% e com os de látex oscilou entre 5,4% e 6,4%. A ocorrência de irritação genital foi menor nos que usaram os de poliuretano. O total de falhas (deslizamento e ruptura) foi de 4% a 8,5% para o poliuretano e de 1,3% a 3,2% para o látex.7,8,9 Trabalhos retrospectivos com preservativos de látex mostraram 0,2 a 7,3% de rupturas em sexo vaginal e de 3 a 9% em sexo anal. Todavia, estudos prospectivos relataram 0 a 5,9% de ruptura e 0,1 a 6,6% de deslizamento em pessoas usando adequadamente, após orientação.12 A maior incidência de falhas dos condons de poliuretano sugere maior risco para aquisição das DST.13 Mais pesquisas com populações maiores serão necessárias para essa comprovação. Avaliação prospectiva, realizada em mulheres com risco elevado para atopia, não revelou mais sintomas que os daquelas com alergia ao látex, indicando que os preservativos com esse material não parecem oferecer risco. Todavia, aqueles sem látex devem ser recomendados para pessoas com hipersensibilidade conhecida ao produto.14
   
Em estudo de regressão logística, observou-se que nos mais jovens, a primeira relação sexual, a falta de apoio do parceiro, aqueles com muitos parceiros e o uso para prevenir gravidez estão associados com retardo na colocação do preservativo.11 Os maiores índices de ruptura e deslizamento foram detectados em parceiros que não moram juntos, em pessoas com pouca instrução, naquelas com maior número de parceiros e em condons com validade vencida. Também se observou que esses acidentes ocorreram mais durante o sexo anal.12 Também é necessário lubrificação à base de água, evitando os produtos oleosos que deterioram o látex.12
   
Acredita-se que as mulheres casadas e as mais idosas usem preservativos em menor freqüência que as mais jovens. Os esforços para prevenção devem beneficiar mulheres antes não consideradas, como as em idade não reprodutiva.15 Na Suécia, o sexo anal é mais praticado pelas mulheres maduras e o uso do condom ocorre em apenas 40% das vezes e por esse motivo a disseminação das DST deve ser considerada.16 A preocupação maior com a gravidez do que com as DST faz com que o uso nas relações anais seja relegado. A detecção do papilomavirus oral é incomum e não foi associada ao contato oral peniano.17 Todavia, em doentes HIV-positivos observamos lesões na mucosa oral de 6% dos doentes com condilomas acuminados perianais,18 sugerindo necessidade de proteção durante o sexo oral. Jovens americanos com hemofilia são orientados a práticas mais seguras, incluindo sexo sem penetração.19 Entretanto, o contato sexual não penetrante, sem proteção, está associado ao aumento do risco de transmissão das DST.17 A análise dos dados sugeriu que as campanhas devam ter como objetivo o risco de HIV/DST, promover o uso do preservativo para todos os tipos de parceiros e educar sobre a importância da sua utilização constante e correta.4
   
Comprovou-se que o espermicida contendo nonoxynol-9 (N-9) inativa o HIV e outras DST virais, e também o gonococo e a clamídia, embora não se conheça a dose efetiva. Além do mais, o produto pode provocar úlceras genitais, dependendo da dose aplicada. Entretanto, pode ser usado com condons, como segunda barreira de proteção.12
   
O preservativo feminino é efetivo na prevenção das DST e da gestação. As dúvidas sobre o método concentram-se em torno de fatores como estética, dificuldade com o preservativo masculino, reação do parceiro masculino, crença sobre a eficácia e falta de treinamento. Esses achados indicaram necessidade de esforços para divulgar o artefato como mais uma alternativa dentre os métodos de barreira.20 No entanto, 82% das mulheres norte-americanas alegaram tê-lo usado e a proporção de atos sexuais por eles protegidos chegou a 17%.21 A exposição ao sêmen foi avaliada comparando os níveis de PSA (antígeno prostático específico) no fluido vaginal antes e depois do coito. A taxa de exposição variou de 7% a 21%, dependendo da ocorrência ou não de dificuldades durante a utilização. Esses problemas diminuíram com a experiência do usuário.22
   
Devido ao custo dos condons femininos (equivalente a 30 dos masculinos), muitas mulheres o reutilizam. Testes realizados para avaliar a integridade estrutural mostraram que as pequenas alterações detectadas não foram consideradas importantes. Todavia, houve evidência de aumento do número de furos depois de repetidas lavagens e desinfecções, sugerindo que o produto deve ser manuseado com cuidado.23
   
Pesquisando o preço do preservativo de poliuretano encontramos algumas dificuldades. Uma unidade corresponde ao valor de 20 das de látex, proibitivo para muitos. Além disso, não foi encontrado nas farmácias e redes de drogarias, somente em algumas "sex shops", o que é um fator limitante. Os gerentes das drogarias e da maioria das lojas consultadas desconheciam o produto. Acreditamos que não só os preservativos de látex, mas também os de poliuretano, devam ser distribuídos gratuitamente, para o êxito das campanhas de prevenção da AIDS e de outras DST.
    É necessário que a população descubra o motivo pelo qual utiliza o preservativo. O médico precisa conhecer o método adequado para cada caso, a maneira correta de uso e o local de aquisição. Mais importante que diagnosticar e tratar as DST é saber orientar os portadores e seus parceiros quanto à prevenção.

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Endereço para correspondência:
Sidney Roberto Nadal
Rua Dr. Martinico Prado, 26 - grupo 35
Vila Buarque
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