OPINIÕES E REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
Júlio César Monteiro dos Santos Jr. - TSBCP
Resumo: O crescimento populacional dos idosos tem mobilizado interesse entre médicos sanitaristas, clínicos e cirurgiões. O avanço da idade média de sobrevida, em alguns países ultrapassando a marca dos 80 anos, ao lado do progresso das ciências médicas e desenvolvimento tecnológico tem encaminhado número cada vez maior de pacientes para tratamento cirúrgico. O crescimento dos meios técnicos disponíveis de suporte peroperatório e os conhecimentos modernos de prática cirúrgica não têm sido, no entanto, acompanhados de mudanças de critérios nos cuidados médicos pessoais para os pacientes dessa faixa etária, de acordo com as modificações que eles experimentam com o avançar da idade. Superestimando a capacidade do paciente cirúrgico idoso em reagir ao estresse do trauma operatório avolumam-se as iatrogenias que, ao lado das doenças da senectude e da diminuída reserva orgânica, contribuem para morbidade e mortalidade registradas no peroperatório do idoso.
Unitermos: paciente idoso, operação eletiva, operação de urgência, aspectos fisiológicos da idade avançada
INTRODUÇÃO
O rápido crescimento populacional no segmento em que as pessoas se situam acima dos
60-65 anos, tem preocupado os que tratam de
problemas relativos à saúde pública ou com a saúde da
pessoa, mormente os cirurgiões.
Na maioria dos paises desenvolvidos, a pirâmide populacional tem característica bem
definida e estável e os idosos fazem parte de um
conjunto relativamente equilibrado com crescimento lento
para o grupo acima dos 80 anos, embora em época
alguma fossem contadas tantas pessoas mais do que octogenárias como as que são observadas atualmente.
O Brasil, nos últimos anos, ganhou
destaque para estudo populacional, não só no aspecto
de contingente de idosos na população,
mas principalmente pela velocidade de crescimento
desse segmento.
A nossa população idosa já atinge 15
milhões e deverá ultrapassar os 30 milhões de pessoas, em
2020. Os dados atuais mostram que a população
brasileira de idosos é maior que a população de idosos
da Inglaterra e Pais de Gales; é maior que o número
de habitantes total de muitos paises europeus e as estimativas prevêem que até 2025 a idade média
estará acima dos 80 anos.1
O fato é de relevante impacto qualquer
que seja o novo sentido que se queira dar para
aspectos médicos, econômicos, sociais ou culturais gerados
pelo conjunto em expansão.
A tendência de uma população de
idosos aumentada, ao lado do desenvolvimento
técnico-científico e os avanços da medicina
hodierna, sustentando e encaminhando os pacientes de alto
risco para procedimentos mais complexos, prognostica
maior número de pessoas idosas buscando tratamento
médico ou cirúrgico, compondo, assim, uma nova faixa
de perfil nosológico próprio, para a qual a
estrutura governamental já deve estar se preparando,
certamente em razão dos alertas e conselhos dados
pelos especialistas em saúde
pública.2
Fato ou não, a criação de padrões novos
de orientação para o modelo assistencial no setor de
saúde torna-se necessária para promover a adaptação
do sistema público vigente diante da
explosão populacional do idoso, não só para as soluções
dos problemas imediatos, mas também para orientar
o desenvolvimento de pesquisas que resolvam os problemas posteriormente suscitados pela demanda,
em termos de saúde, da nova faixa etária.
Veras e cols.2, literalmente, propõem
"uma integração entre gerações, porém com idosos
saudáveis, independentes e participativos" e, para isso,
propõem que os modelos sejam considerados como
"estratégia de harmonia social".
O intuito principal do trabalho que aqueles autores desenvolveram "é alertar para a
necessidade de renovar os modelos de cuidados à saúde do
idoso, com vista a possibilitar uma integração harmônica
entre gerações.2"
Salientaram que "tanto o setor público
como o privado precisam enfrentar o desafio do envelhecimento populacional e as suas
conseqüências na organização dos
serviços".2
Esse alerta que conclama os serviços
médicos de saúde pode, com todas as letras e justificativas,
ser estendido para os cirurgiões, de todas as
especialidades, que trabalham com pacientes adultos.
Ora, dentre os últimos 376 pacientes
operados por nós, todos para tratamento de doenças
colorretais, 169 (45%) tinham idade igual ou superior a 61
anos (média de 70,8 anos). Nesse subgrupo, 53%
tinham idade superior a 70 anos (média de 76 anos)
e representaram 24% de todos os
operados3.
Esses números, extraídos de uma
amostra relativamente pequena, são expressivos
representantes do que se observa em outros núcleos de
assistência cirúrgica.
Nos Estados Unidos, entre 1964 e 1994, a população acima de 85 anos aumentou de 274%.
Assim também ocorreu para as pessoas acima de 65 anos
que necessitaram de tratamento cirúrgico, mas o
mais rápido crescimento nesse grupo populacional
foi observado entre as que tinham mais de 85 anos
de idade.4,5
Portanto, é necessário que os
cirurgiões revejam seus conceitos e os fundamentos de
cuidados peroperatórios já que o modelo até então vigente
foi destinado às pessoas mais jovens, como fruto que é
e sempre foi de estudos desenvolvidos em amostras populacionais, voluntárias ou não, de faixas etárias
bem mais aquém das dos pacientes então denominados
de idosos. Esse é um aspecto; o outro, de
considerável relevância, é o alto índice de mortalidade entre
os idosos que são operados.
As características fisiológicas alteradas com
a idade, em termos de hora de sono, atividade física,
ciclo hormonal, metabolismo, função cerebral,
função cardíaca, capacidade pulmonar, fadiga,
depressão, delírio pós-operatório, reação metabólica, etc.,
são apenas alguns dos aspectos de destaque que
poderiam ser considerados para o desenvolvimento de
programas e protocolos que orientassem aos médicos e
cirurgiões métodos de suporte peroperatório para esses pacientes.
Excetuando a área pediátrica, em especial
a neonatologia, não é comum observar o
médico assistente, no período peroperatório, preocupado
com cálculos e definição de parâmetros para
procedimentos fundamentais, como, por exemplo, reanimação
- quando necessária _ reparação, manutenção
da hidratação e aporte de substrato energético para
suprir as faltas do jejum que obrigatoriamente antecede o
ato cirúrgico e se prolonga no pós-operatório
imediato, adaptando-os de acordo com a idade, estado de
saúde, operação executada e reação de seus pacientes.
Reconhecimento exclusivo, por exemplo, de alterações mentais, como o delírio pós-operatório, e
a utilização do método de contenção física como
solução é tão rudimentar e bárbaro como as técnicas
usadas para tratamento de dementes em hospitais
psiquiátricos, postas em práticas há cem anos atrás. Da mesma
forma é a desconsideração que se faz com a
capacidade orgânica geral do idoso e seu limitado potencial
de resposta à agressão anestésico-cirúrgica e a
deficiente adaptação às ocorrências do pós-operatório frente
ao estresse da dor, da redistribuição dos líquidos,
das alterações da temperatura corporal, das
atividades adrenérgicas persistentes, da demanda energética, etc.
O nosso propósito, nesse artigo, é,
em abordando o tema _ paciente cirúrgico idoso
_ considerar alguns fundamentos de prática
rotineira executada pelo cirurgião nas enfermarias ou
nas unidades de terapia intensiva, tendo como destaque
os seguintes tópicos:
a. Aspectos biológicos e moleculares
b. Aspectos fisiológicos do idoso
1. cardio-pulmonar
2. renal
3. hepato-digestiva
4. neuro-endócrina
c. Balanço da água, dos eletrólitos
e ácido-base
d. Operação de urgência no idoso
a. Aspectos biológicos e moleculares
A idade biológica do homem é
caracterizada por dois aspectos interessantes da homeostase, que
a divide em dois grandes períodos: o primeiro período
é o da expansão e vai até o final da 2ª. década da vida;
o segundo é o período da
contração que começa no
início da 3ª. década e se prolonga até a morte.
O 2º. período tem duas fases distintas: a
1ª.fase é caracterizada pela consolidação de funções
orgânicas e a 2ª. fase pelo declínio _ ou "estenose" da
homeostase _ época em que começam a haver os notáveis
efeitos da contração.
O primeiro período é o do crescimento;
o segundo é do "envelhecimento", com uma fase
de amadurecimento e outra de declínio, onde cada
órgão ou sistema "envelhece" progressivamente de
forma totalmente independente, mas sadia.
A doença fica caracterizada nas situações
em que a perda de função ocorre de maneira abrupta.
No entanto, próximo ao fim da vida ou acima dos 85
anos, a deficiência é de tal ordem que são poucos os que
são independentes em suas atividades individuais e,
nesses casos, o normal e a doença se entrelaçam.
Associado à perda da reserva biológica, o
peso próprio das deficiências torna o idoso mais
vulnerável às agressões ambientais, patológicas e farmacológicas.
A primeira fase do 2º. período começa aos
vinte anos, em pleno vigor da 3ª. década e a
última principia durante a 5ª. década da vida, isto é, dos
50 aos 60 anos.
A expressão biológica da expansão ou
da contração da homeostase é inexorável e
progressiva com mudanças individuais dependentes de uma
grande variedade de fatores, tais como genéticos,
ambientais, da dieta e dos hábitos. As mudanças fenotípicas - ou
a degeneração - da idade diferem das doenças da
idade;6-8 aquelas atingem todas as pessoas e são
dependentes de um sistema polimórfico (numeroso, complexo
e independente), inserido no genoma celular com a função de processar e regular a vida da
célula;9 essas afetam apenas um grupo populacional e nem
sempre têm inserção genotípica, sendo, às vezes,
dependentes do acaso.
O caráter celular complexo ou não determinante do envelhecimento pode ser
mais realçado pela observação de que, embora haja
um crescimento da população de idosos, a idade
máxima atingida não tem tido um aumento cadenciado
pelo desenvolvimento da Medicina moderna, como
poderia ser esperado. Isto é, o progresso científico tem
agido na doença do idoso, mas não num processo que
retarde o envelhecimento.
Por outro lado, os modelos experimentais de estudos biológicos apontam para processo
molecular de variável complexidade, controlando a idade _
menos complexo em organismos simples;10 numerosos
e independentes, em organismos mais
superiores,11 envolvendo uma multiplicidade de
controvertidas teorias.12-14
Os conhecimentos porvir e o atual domínio
da engenharia molecular orientarão, certamente,
a manipulação dos genes controladores da
idade biológica das células bem como os que determinam
as doenças da idade, com a adequação imposta pelo
fato de que o processo de envelhecimento e as doenças
da idade são inseparáveis.9
Diante dessas expectativas, por enquanto,
é indispensável reconhecer a necessidade de que as
ações - médicas ou cirúrgicas - devem ser, então,
adaptadas às alterações fisiológicas do idoso para poder
minimizar a morbidade e mortalidade, mormente a
pós-operatória, notável nessa população, cujo maior fator de risco é
a própria idade,15,16 considerando que o
envelhecimento é a perda gradativa das funções
orgânicas,9 independentes das causas das ações e de seus
caracteres biológicos.
b. Aspectos fisiológicos do idoso
1. alterações cardiovasculares
e pulmonares próprias da idade
O mais destacável aspecto quando se
considera a fisiologia do idoso é a marcante perda de função e
de reação de cada órgão e sistema.
O decréscimo da capacidade cardíaca pode
ser mensurado e explicado do ponto de vista
morfológico, à luz de alterações micro e macroscópicas. As
células da musculatura cardíaca diminuem em número,
mas aumentam de tamanho, o que significa perda de
unidade contrátil e espessamento das paredes
cardíacas (hipertrofia), mas com prejuízo para o número
absoluto de miocitos que diminuem com a idade.
A contração do miocárdio, por unidade
de tempo, fica mais lenta e o poder contrátil
diminui, embora a força de contração seja mantida.
Nessas condições, o coração do idoso é menos sensível
à estimulação b-adrenérgica o que limita o
número máximo de batidas que pode ser
alcançado.17
O mecanismo de compensação dessa
limitação é feito com a máxima atividade do ventrículo
esquerdo, o que induz a sua dilatação, principalmente
motivada por exercícios
físicos.18 Há aumento na deposição
de colágeno que, ao lado das alterações observáveis
nas unidades celulares, faz com que o miocárdio fique
mais duro, menos elástico, com menor complacência,
menor capacidade de enchimento em suas câmaras e piora
da contratilidade. Contudo, para manter o volume
ejetado por batimento sem prejuízo, o coração trabalha
no limite, com um débito que vai diminuindo com
a idade.19
Com essas alterações estruturais e
funcionais, o coração do idoso ainda tem que bater contra
um sistema de vasos espessados e
enrijecidos,20-21o que repercute no valor da pressão
sistólica,22-23 com o alargamento da pressão de pulso.
Por outro lado, várias alterações podem
ser observadas nos pulmões, nos seus vasos, na
caixa torácica e nas musculaturas que fazem parte
da mecânica da respiração.
Se analisarmos externamente, o que pode chamar a atenção é a deformação torácica imposta
pela cifose do idoso.
Ao lado disso, a maior calcificação
das costelas e das cartilagens costais, a fraqueza
adquirida das musculaturas intercostais e de todos os
outros músculos acessórios da respiração formam
um conjunto com perdas consideráveis, participando
para a deficiência da mecânica do "fole", numa
flagrante diminuição da capacidade torácica, com
permissão, apenas, para uma respiração mais curta.
Os pulmões também sofrem
modificações estruturais, envolvendo a traquéia,
brônquios, bronquíolos e alvéolos com significativos
prejuízos para a complacência
pulmonar24-26 que, ao lado das alterações da caixa torácica, diminui o
volume inspirado e a força
expiratória27 o que repercute
nas trocas gasosas28,29 e aumenta o gradiente
alvéolo-arterial de oxigênio. Esses são fatores de riscos
para complicações pulmonares no período
peroperatório.30
Todas essas importantes alterações
da fisiologia da respiração, com diminuição da
reserva respiratória, exigem cuidados peroperatórios
especiais para proteger o que resta daquela função. Isso
pode ser feito impedindo a aspiração, a sobrecarga de
volume e, sobretudo, estimulando a fisioterapia
pulmonar.30
2. alterações renais próprias da idade
O rim, do ponto de vista anatômico, sofre alteração significativa com o decorrer do tempo.
Ganha massa e tamanho como todos os outros órgãos,
mas perde cerca de 30% de seu peso total depois dos
50 anos de idade, às custas de redução da camada
cortical 31 atribuída à esclerose glomerular surgida
em decorrência de diminuição funcional dos
capilares glomerulares. A redução cortical afeta diretamente
a taxa de filtração que tem seu valor
reconhecidamente diminuído à velocidade de 1ml/min/ano, a partir
dos 40 anos.32
A deficiência vascular cortical e a baixa reserva funcional da principal unidade do rim do
idoso - com interferência na filtração, na absorção e
na resposta do sistema renina-angiotensina - é
fator relevante de risco para complicações
peroperatórias associadas à hipóxia renal transitória ou a lesões
renais tóxicas.33
Esses elementos serão abordados com mais propriedade durante comentários sobre os
aspectos pertinentes ao metabolismo da água, eletrólitos
e equilíbrio ácido-base.
3. hepato-digestiva
O aparelho digestivo do idoso evolui para alterações fisiológicas próprias da idade, expressas
nos distúrbios motores funcionais, na função secretória
e absortiva que se estendem para as glândulas
anexas, principalmente o fígado.
O extremo proximal - esôfago - e o distal - intestino grosso
- são os segmentos mais
afetados. Naquele as alterações funcionais da peristalse e
do esfíncter inferior dificultam a deglutição coordenada
e provocam sintomas, tais quais os da acalasia e
da doença do refluxo gastresofágico; neste, os
sintomas predominantes são os da constipação e do
aparecimento de
divertículos,34,35 aos quais se associam
várias complicações.
O esvaziamento gástrico e a progressão
do conteúdo cólico são lentos no idoso.
O fígado sofre diminuição de sua massa
por diminuição do número de hepatócitos, mas
em comparação com outros órgãos sólidos essa
glândula sofre menos e mantém quase intacta a sua
reserva funcional.36-38
4. alterações neuro-endócrinas
A alteração endócrina mais saliente
é intolerância à
glicose39, atingindo níveis de cerca
de 45% a mais no grupo idoso quando comparado com grupo jovem tomado como controle e que deve
estar relacionada à resistência à insulina que tem
como substratos patogenéticos a menor quantidade de
massa magra, irregularidades na dieta e nas atividades
físicas, diminuição da captação da glicose e as
transformações neurohormonais da
idade.40,41
Essas, tanto para mulheres como para os homens, são bem conhecidas. Para elas a
síndrome inicia relativamente precoce, no período
que imediatamente precede a menopausa e se prolonga
pelo resto da vida.
As alterações refletem a diminuição
do estrogênio e o aumento dos hormônios luteinizante
e folículo estimulante. A perda da massa óssea é a
principal delas, sem que se perca a importância da
maior vulnerabilidade do miocárdio da mulher,
desprovido da proteção estrogênica, com as agravantes de que
há o aumento da lipoproteina de baixa
densidade, diminuição da de alta densidade e
aumento concomitante da
aterogênese.42 A sensibilidade
sexual da mulher muda por causa da perda da libido e
por causa da atrofia da genitália
externa.39,43
No homem, as alterações estão associadas
à diminuição da testosterona e dos
hormônios semelhantes. A queda dos hormônios
sexuais masculinos promove atrofia muscular, a perda da
libido, osteoporose e disfunção erétil. Nessa esfera,
tanto para as mulheres como para os homens, há
inestimável perda da auto-estima, o que favorece a tendência
para a depressão, fadiga, melancolia e distúrbios do
sono, comumente observáveis também no pós-operatório
do paciente idoso. Além disso, há os distúrbios
funcionais das adrenais, relacionados com o ritmo da produção
e manutenção do cortisol plasmático com
elevada produção no período vespertino o que agrava
a insônia.44,45
Há, tal qual na cortical, mudanças nas
funções da medular, em resposta a estímulos mediados
pelo eixo hipotálamo-hipófise-adrenal. Desaparece
a correlação entre estímulo e a produção desejável
de adrenalina. O mesmo acontece na cadeia dos
gânglios simpáticos em relação à produção da
noradrenalina, evidenciando o que globalmente pode ser
assinalado como resposta simpática atenuada. O nível da
reação ao estresse, na realidade, é global e compatível com
a reserva funcional e não com a dimensão do estímulo
e da resposta esperada. Assim, o idoso, frente ao
frio, tem menos resposta de vasocronstrição cutânea do
que o jovem, razão porque ele é mais susceptível
a hipotermia. A inadequação de reposta não é
apenas periférica, pois há a participação do
centro termorregulador cujo limiar de disparo se
encontra elevado.46-48
Minimizar a dor é outro procedimento importante na prevenção das complicações
observadas no pós-operatório que, dentre as outras que podem
ser incluídas, estão o infarto do miocárdio e o
delírio.49,50
c. balanço da água, dos eletrólitos e
ácido-base
As alterações fisiológicas que
normalmente ocorrem com o avançar da idade, relacionadas
ao equilíbrio da água e dos eletrólitos, têm
expressões renais anatômicas e funcionais pela perda
substancial da massa renal total às custas de sofrimento da
camada cortical com hialinização da parede dos vasos
e destruição de unidade funcional, mas com
um comprometimento funcional capaz de manter o
trabalho renal qualificado numa faixa tolerável, na maioria
das situações de vida de uma pessoa idosa. Contudo,
essa reserva funcional, passível de ser quantificada,
tem limites relativos que variam numa faixa estreita
entre a linha do normal e a linha da doença ou
do desequilíbrio.51
As alterações fisiológicas mais importantes
dos rins do idoso estão atreladas à diminuição da taxa
de filtração glomerular e da absorção. Assim, os
aspectos mais importantes do impedimento funcional
dizem respeito à capacidade diminuída para produzir
uma urina concentrada e a limitada aptidão renal
para excretar a água, os eletrólitos e os radicais ácidos.
Na maioria das vezes e na maioria dos pacientes idosos, esses aspectos não são
suficientes para expressar perturbações e desequilíbrios
com manifestações clinicas
significativas.52 Então, os
rins, ainda que com perda de massa e danos corticais,
são capazes de manter a harmonia, nas variações
diárias quantitativas e qualitativas do que entra e
sai.53
A diminuída capacidade ou reserva
funcional global disponível no organismo do idoso para lidar
com o estresse aponta para os cuidados necessários
para evitar que a operação e as iatrogenias decorrentes
sejam os rompedores do delicado equilíbrio mantido às
custas muito mais de adaptação do que de
mecanismos compensadores.54
Para tanto é preciso, entendendo as
alterações já mencionadas, rever qual dos fatores do
perfil fisiológico dos rins dos idosos pode, pertencendo a
um processo mórbido qualquer, ser relacionado à
contração da homeostase. Sobretudo, é preciso entender que
ao inevitável estresse do ato operatório não se
pode acrescentar a impropriedade de uma
reposição hidreletrolítica inadequada em termos de qualidade
e quantidade de solutos, de volume da solução, além
da qualidade e quantidade dos medicamentos administrados, já que com a idade há um maior
risco para hiper ou hipovolemia e para os
distúrbios
eletrolíticos,54 todos eles passíveis de serem
agravados por efeito adverso de drogas.
Essas considerações são pertinentes porque
os elementos fisiológicos que estão associados com
a idade e não devem ser esquecidos, são os seguintes:
- diminuição da água total
- diminuição da taxa de filtração
glomerular
- diminuição da capacidade de concentração da urina
- aumento do hormônio antidiurético
- aumento do ANP (peptídeo atrial natriurético)
- diminuição da aldosterona
- diminuição do mecanismo da sede
- diminuição do "clearence" da água
Esses elementos devem ser pontos de referências e orientadores para reflexão durante a terapêutica efetuada no peroperatório do paciente idoso.
A Água
É intuitivo que as alterações
fisiológicas próprias da idade acarretem problemas relativos
a reações orgânicas estimuladas pelo trauma.
Contudo, a reação metabólica na faixa
etária do idoso, tanto quanto poderia ser esperado, não
difere do adulto jovem em qualidade, mas em quantidade
da resposta, de tal modo que, por exemplo, a
participação renal estimulada pelo efeito anestésico-cirúrgico
só poderá falhar quando exigida fora dos limites
funcionais dos rins.53
A precisa regulação dos líquidos e da
pressão osmótica é essencial para o equilíbrio entre
diferentes compartimentos orgânicos. Essa regulação é feita
por um afinado mecanismo que opera tanto ajustando
a ingestão da água como promovendo sua excreção
pelo sistema renal.
Assim, os cuidados no intra-operatório relativos à hidratação devem ser rigorosos e
atender exclusivamente as necessidades imediatas. A
mesma consideração será feita para a manutenção
das necessidades no pós-operatório, com
cálculos meticulosos, por exemplo, da quantidade e
qualidade de volume necessárias para a manutenção
fisiológica do paciente idoso.
Nesse particular, em alguns aspectos, os valores de volume infundidos e usados para
a manutenção são adquiridos por estimativa baseada
em média populacional, porém a medida e a qualidade
das soluções escolhidas são reais.
Há vários parâmetros acessíveis para
cálculos de necessidade - dos mais simples aos mais
complexos e sofisticados 55,56 - escolhidos de acordo com
a disponibilidade tecnológica do ambiente de trabalho
e de acordo com a situação de cada caso em particular.
Em geral, o cálculo pode ser feito por
área estimada de superfície corporal facilmente obtida
em gráficos que usam peso corporal e a altura.
Com o valor em metros quadrados da
superfície corporal, o volume de manutenção a ser infundido
para satisfazer as necessidades diárias será calculado na
base de 1500 ml/m2 de área corporal menos a
água endógena, fixada em 300 ml para o adulto,
sem desprezar a quantidade de líquido e eletrólitos
usada como veículo para os medicamentos. Tendo como
base esse tipo de cálculo, para a faixa de idade que é o
objeto desse ensaio, deve-se levar em consideração
os seguintes fatos: a. o volume total de água, no idoso,
é menor que 60%, com valor próximo a 50%; b. a
rigidez dos grandes vasos afeta a sensibilidade
dos barorreceptores e, c. a resposta aos
mecanismos homeostáticos é lenta; além de todas as
outras alterações fisiológicas que já foram
especificadas acima.
Esses fatos são motivo para a maior
disposição para alterações hemodinâmicas observadas no
paciente idoso, com diluição dos compartimentos líquidos
do organismo e conseqüente alteração da
osmolaridade plasmática.57
Variação de menos de 1% da osmolaridade
é estímulo suficiente para a inibição ou estimulação
do hormônio antidiurético (ADH). Na ausência do
ADH, o rim excreta urina de baixa densidade para aliviar
a sobrecarga hídrica e essa habilidade pode
ser documentada mesmo com taxa de filtração
glomerular oscilando entre 30 a 50 ml/min.58
A labilidade para tolerar privação
ou sobrecarga hídrica é fato notável nos pacientes
idosos e isso pode estar relacionado à produção do
hormônio antidiurético cujos níveis podem estar exaltados
nesses pacientes, embora a variação diurna esteja
ausente.59-61
A produção de ADH, para uma mesma variação da osmolaridade plasmática, é maior
nos idosos do que nos jovens, fato atribuído à
maior sensibilidade dos osmorreceptores naqueles
pacientes.62-64 Essas alterações certamente
contribuem para que o idoso tenha maior tendência à hiponatremia.
Outro aspecto relevante e que se entrelaça
com os outros hormônios no balanço da água é o
peptídeo atrial natriurético (PAN), que, entre outra ação,
é inibidor do ADH.65
O valor basal do PAN encontra-se aumentado de até 5 vezes no idoso e, apesar disso, a infusão
de sódio provoca exagerado aumento do PAN
circulante, com aumentada resposta natriurética e inibição
da aldosterona.66,67
A aldosterona é o mais potente
corticosteróide de ocorrência natural com efeito sobre o balanço
da água e dos eletrólitos. Atua no túbulo contornado
distal e dutos coletores, acentuando a reabsorção de
sódio do líquido tubular e aumentando a excreção
urinária de potássio e íons de hidrogênio; sua inibição pelo
PAN explica a excessiva perda de sódio do idoso e
a diminuída resposta da aldosterona à
hipercalemia.68
Por outro lado, dados subjetivos que poderiam auxiliar na avaliação do equilíbrio em relação
ao metabolismo da água e dos eletrólitos seria
sede. Porém, o mecanismo da sede está alterado e
essa sensação não reflete a privação real de água,
muito menos a alteração da osmolaridade
plasmática.69 Além disso, quando há sede e hiperosmolaridade
plasmática e se faz a pronta reposição de volume, seja por
ingestão via oral ou por infusão parenteral, a normalização
da osmolaridade é demorada (várias horas), ao
contrário do que ocorre no jovem em que o acerto é feito
na primeira hora.
Os Eletrólitos
Os eletrólitos - sódio, potássio e cloro _
do ponto de vista prático são discutidos juntos, pois
os aspectos nutricionais e metabólicos desses
elementos químicos estão intimamente relacionados. São
de natureza essencial, não só para o homem como
também para os animais e para os vegetais, mas
parece desnecessário discutir sua importância biológica.
Em condições normais de alimentação e
saúde, o ser humano não está sujeito a deficiências
desses três elementos e as alterações observáveis, na
maioria das vezes, decorrem de processos mórbidos
crônicos, eventualmente de doenças agudas que em geral
levam à desidratação, com possibilidades variadas de
perda ou retenção eletrolíticas e por causas iatrogênicas.
A ingestão "normal" diária de sal
numa determinada população é muito instável e pode
variar de 2 a 10 g diárias (10g de sal equivalem a 4 g
de sódio; 1 g de sal é igual a 171 mEq de sódio); o
potássio na alimentação varia de 2 a 4 gramas (1 g de
cloreto de potássio tem 135 mEq de potássio). Esses
dois importantes eletrólitos _ um quase que
exclusivamente extracelular e outro predominantemente intracelular
_ são usados em quantidades excessivas já que
a necessidade diária para o sódio varia de 45 a 145
mEq (em média 75 mEq) e a do potássio não ultrapassa
o limite máximo de 120 mEq (em média 60 mEq).
Os valores são teóricos e os excessos são excretados.
O Sódio
O sódio é o determinante do tamanho do
volume extracelular e, como vimos, o idoso, dada
as alterações do balanço hidreletrolítico, tem
comumente propensão para a hiponatremia e mais raramente
para a hipernatremia, em geral mal entendida, mas
envolvida com alto índice de mortalidade. Snyder e
col.70 estudaram 162 pacientes acima de 60 anos (1,1%
de 15.187 internações) que tinham sódios
plasmáticos maiores que 148 mEq/l. A maioria deles (57%)
ficou hipernatrêmica durante o período da
hospitalização; 43% daqueles pacientes já eram hipernatrêmicos.
O valor médio do sódio foi 154 mEq/l. e as causas
mais freqüentes do valor elevado foram por complicação
da operação (21%), doenças febris (20%), diabetes
(20%) entre 40 diferentes complicações identificadas.
A mortalidade de 42% foi 7 vezes maior do que num
grupo controle hospitalizado, estabelecido para
comparação. A hipernatremia, no grupo estudado, foi
comumente de causa iatrogênica e considerada um sinal
freqüente de doença sistêmica grave associada.
A hiponatremia é mais comum. Sete por
cento dos idosos hígidos têm hiponatremia; esse valor
sobe para 12% entre os internados. Setenta e três por
cento das hiponatremias são iatrogênicas e atribuídas
à inadequada fluidoterapia ou ao uso de diuréticos.
A mortalidade numa amostra populacional de idoso
com hiponatremia foi duas vezes maior do que num
grupo controle.
O paciente idoso não tem capacidade para perdas rápidas de sódio, pois ele tem uma baixa
taxa de filtração glomerular, o que o torna mais propenso
à expansão do compartimento extracelular.
Nas condições em que o sal é retirado ou quando há
perdas excessivas, a resposta renal de retenção salina é
por demais lenta.71
A hiponatremia, tão comum, pode ser
também devida a alterações do equilíbrio hormonal ou
estar associada a várias doenças, tais como distúrbios
do sistema nervoso central, infecção, neoplasias
ou fármacos, tais como a clorpropamida, a amitriptilina,
a fluxetina, entre outras, todas implicadas com
produção inapropriada de hormônio
antidiurético.72-76
No entanto, tem sido sugerido, através
de análise de resultados de estudos dessa "síndrome",
que a secreção inapropriada do HAD pode ser
encontrada em pacientes idosos, sem que se possa identificar
uma causa.64,77
O Potássio
O paciente idoso cirúrgico, como vimos,
tem propensão a hipercalemia, em geral induzida
por suplementação de potássio, por medicamentos
como os diuréticos que retém potássio, antiinflamatórios
não esteroidais, antihipertensivos (inibidores da
enzima conversora da angiotensina),
beta-bloqueadores, heparina,
digoxina,58 etc. Em geral, esses
pacientes, assim internados, são assintomáticos, mas podem
ser vitimas de hipercalemia franca após o trauma
cirúrgico ou após receberem medicação contendo
potássio, principalmente se, em situações idênticas, houver
a associação em grau variado de insuficiência
renal.58
A hipopotassemia é outra complicação
que deve ser considerada no idoso candidato à operação
e corrigida antes do ato cirúrgico por causa de
sua associação com taquiarritmias graves.
O Ácido e a Base
O paciente cirúrgico idoso tem facilidade
para desenvolver acidose metabólica, por causa
da dificuldade da excreção renal de íons de
hidrogênio, que pode ser agravada por doenças
pulmonares concomitantes.53,54,78
As alterações fisiológicas conhecidas,
mas inaparentes, do paciente idoso candidato ao
ato cirúrgico, devem ser identificadas pelas medidas
do sódio, do potássio, da uréia e da
creatinina, complementados com o exame comum de urina e,
tanto quanto possível, corrigidas no pré-operatório.
Qualquer queixa ou sinal de perdas crônicas de água e
eletrólitos (diarréia, fistulas intestinais, vômitos persistentes)
que podem levar à desidratação com repercussão sobre
a volemia, devem ser analisados criteriosamente
em consideração à possibilidade de comprometimento
da perfusão renal. Vale assinalar que a hipovolemia
do idoso é o maior fator de risco para necrose
tubular aguda do pós-operatório, mas nem sempre
vem acompanhada dos sinais clássicos de taquicardia
e hipotensão postural.58
Em suma, a melhor forma de proteger o paciente cirúrgico idoso das alterações
hidreletrolíticas que podem surgir no peroperatório como
complicações indesejáveis é a prevenção.
O médico deve procurar entender as
alterações fisiológicas do balanço da água e dos eletrólitos
que ocorrem no paciente idoso cirúrgico, evitando as
ciladas do preconceito em relação à idade que atribuí todas
as complicações ao processo natural do envelhecimento.
Dessa forma, vale finalmente salientar que o rim é o órgão alvo por deter as importantes
alterações funcionais que são a diminuição da taxa de
filtração glomerular, a perda da capacidade para concentrar
a urina, a limitada margem de excreção da água, do
sódio, do potássio e do íon hidrogênio e, sobretudo, por
ter sido mostrado que na maioria das vezes o
estreito equilíbrio é rompido muito mais pela iatrogenia do
que por causa da limitada reserva funcional ou do
reduzido potencial de resposta orgânica à agressão.
A atenção às limitações da idade pode
ajudar o médico a minimizar complicações, tais como
hiper ou hipotonicidade, hipercalemia ou
hipovolemia.58
O crescimento do tamanho da população
de idosos que se candidatam à terapêutica cirúrgica e
a possibilidade dessa opção de tratamento em
pacientes criticamente doentes reclamam por cirurgiões
e anestesiologistas habilitados para proceder com controle hemodinâmico e de reposição hídrica por
meio de medidas invasivas.79,80
d. Operação de urgência no idoso
Excetuando o trauma em que a mortalidade
é alta quando se trata do paciente
idoso81-83 (é o dobro quando se compara com o grupo jovem) - aumenta
com o aumento da idade do paciente, iniciando aos 40
anos (10%), aos 55 anos (15%) ultrapassando 20% aos
70 anos, e na maioria das vezes, se não na totalidade
dos casos, expressa a situação de alto risco inerente
à gravidade das lesões e a diminuída reserva
fisiológica e incapacidade para compensar os
desequilíbrios decorrentes, muito mais do que pelas
possíveis condições médicas associadas - as outras situações
de urgência ou emergência que levam esses pacientes
para o centro cirúrgico devem estar relacionadas a
doenças cirúrgicas próprias da idade que complicam e
impõem a antecipação do tratamento. Nessas circunstâncias,
é lógico esperar que estaremos diante de um
paciente com dois fatores de risco que se sobrepõem
e complicam entre si - as alterações
fisiológicas debilitantes decorrentes da senectude e as que
são devidas à evolução da doença, por exemplo, o
câncer obstrutivo do intestino grosso, a doença
diverticular com processo inflamatório ou infeccioso associado,
a colite isquêmica, etc., todos exigindo reparo em
caráter de urgência, se não de emergência.
Discutimos anteriormente o paciente
cirúrgico idoso pressupondo uma situação em que a doença
no momento do seu tratamento tinha expressão
regional ou loco-regional e a expectativa era a de um
paciente cirúrgico apenas idoso que ainda não sofria as
alterações que poderiam advir da doença. Reportando aos
exemplos citados agora, a única doença que poderia ser
repetida como exemplo seria o câncer do intestino grosso.
Nesse final de ensaio falaremos de urgência
e vamos nos restringir às urgências abdominais,
exceto os traumas, de preferência limitando-nos às
doenças coloproctológicas, por ter certo de que elas
representam a maioria dos casos, são mais graves e, portanto
com riqueza de dados suficientes para essa exposição.
Tem-se considerado que os resultados de operações abdominais urgentes no idoso em termos
de morbi-mortalidade permanecem
insatisfatórios,84-86 tal como ocorre em faixas etárias mais
jovens,85 mesmo considerando os avanços da medicina moderna - em todos os seus ramos formadores: a bioquímica,
a fisiologia, a farmacologia, a anestesiologia, a
terapia intensiva, etc - escudada pelo avanço tecnológico
de investigação e de suporte. Nos pacientes acima de
80 anos, os índices de mortalidade nas emergências
não traumáticas do abdômen são
altos84-86 e diferem pouco dos observados no
trauma.81-83
Nishida e col.84 analisaram 169 pacientes
que eles dividiram em dois grupos: num os 61
pacientes eram maiores de 80 anos (grupo A) e, noutro, os
108 pacientes (grupo B) tinham idade entre 65 e 79
anos. O número de mortes foi maior no grupo A (9,8%)
do que no grupo B (3,3%). Analisaram seus dados
com base na presença ou não da síndrome da
reação inflamatória sistêmica (sirs), que foi observada em
35 pacientes do grupo A (57%) e em 50 do grupo B
(46%). Não houve diferença de complicações dentro
dos grupos, dependente ou não de se constatar doenças
pré-existentes, exceto para a sirs, que no grupo A
foi associada a complicações graves em 62,5%
dos pacientes. O índice de morte entre os pacientes
com sirs, no grupo A, foi maior do que o observado
entre os pacientes sem a sirs.
Abbas e col.87 estudaram a
evolução peroperatória de 180 pacientes acima de 80 anos de
idade submetidos a operações abdominais grandes - 100 urgências e 80 eletivas
- com os seguintes resultados:
a morbidade global foi de 33%, maior entre os
pacientes operados de urgência, sem significância. Contudo
o número de morte foi alto (29%) e
significativamente maior entre as urgências do que entre as
operações eletivas (7,5%), às custas do que ocorreu no
período peroperatório (30 dias). Os resultados de análise
feita ao longo do tempo foram, no entanto, iguais. Isso
foi motivo para que os autores concluíssem que a idade
não deve ser o único critério para a decisão da
terapêutica cirúrgica em pacientes idosos.
A co-morbidade é fator importante, mas não
é o único. Observa-se que, para faixas etárias
diferentes, a morbi-mortalidade é sempre mais elevada
nos procedimentos de urgência do que nos
eletivos, superando então o fator de risco idade.
Interessados nesses aspectos, procuramos nas operações eletivas identificar entre os nossos
pacientes a existência de outras doenças, tais como:
alcoolismo, desnutrição, anemia, proteínas séricas ou
cardiopatias, nefropatias, hipertensão arterial, diabetes,
detectadas isoladas ou em combinação em pacientes com
doenças colorretais candidatos ao tratamento
cirúrgico.88 Destaques foram feitos para o período de
internação pré-operatório, para a duração do ato cirúrgico
sem levar em consideração a necessidade ou não
de transfusão de hemácias no peroperatório e
estudamos a incidência de complicações infecciosas,
superficial ou profunda; de deiscência de anastomose e
sua repercussão e o número de morte, em 374
operações colorretais consecutivas. Cento e setenta e
nove pacientes (48%) tinham uma doença associada;
19% tinham duas e 6%, três, perfazendo um total de
272 pacientes (73%) com uma ou mais doenças associadas.
A incidência global de complicações foi
de 17% - 30 com infecção de ferida (8%); 24
com deiscência de anastomose (6,5%); 4 com estenose
de anastomose (1%) e 4 óbitos peroperatórios (1%),
mas não fomos capazes de estabelecer relação de causa
e efeito entre as complicações. Cento e setenta e
nove pacientes tinham idade igual ou superior a 60
anos (média = 71,3 anos) e 195 tinham idade igual ou
inferior a 59 anos (média igual a 38 anos). A única
diferença foi o número de óbitos - 5/179 (2,8%) para a
faixa mais idosa e 1/195 (0,5%) para os mais jovens,
mas que não foi significativa.88
Assim, para operações eletivas, o fator
idade, mesmo com doenças associadas, não se constituiu
em fator de risco, como já foi
observado.89
Ascite, hipernatremia e ASA III ou acima e a não reanimação pré-operatória foram fatores de
risco considerados relevantes e utilizáveis para
prognosticar resultados
cirúrgicos.90
Em suma, a adequada avaliação
pré-operatória, o reconhecimento do "status"
fisiológico que antecede o ato cirúrgico, a judiciosa
reanimação, a performance do
cirurgião92 e da equipe
anestésica, a escolha do melhor momento para a operação e
a manutenção global do equilíbrio metabólico
no peroperatório são, todos, imprescindíveis para
o sucesso terapêutico das urgências cirúrgicas
do paciente idoso.91,93 Sobretudo, para minimizar
a morbidade e mortalidade, é preciso que,
reconhecendo as limitações funcionais do paciente, o
médico assistente reconheça a sua própria e busque
pelo incessante aprimoramento profissional.
SUMMARY: The surgical indications for elderly patients have dramatically increased with worldwide growing of older population and advances in medicine. However, elderly persons undergoing elective or emergency surgery have the highest morbidity and mortality. Together to a higher incidence of disease this older population carries out a program of physiological decline in functional reserves in all of their solid organ systems losing the ability to maintain homeostasis. Physician and others health care providers must familiarize themselves with physiological alterations of aged managing that oldest population.
Key Words: elective and emergency abdominal surgery, elderly patients physiological features
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Endereço para correspondência:
INSTITUTO DE MEDICINA
Júlio César M Santos Jr.
Av. Min Urbano Marcondes, 110
12515-230 GUARATINGUETÁ ( SP)