VÍDEOlaparoscopia COLORRETAL
ENFOQUES ATUAIS & CONTROVÉRSIAS
INDICAÇÕES E RESULTADOS DA VÍDEO-CIRURGIA NA DOENÇA DE CROHN
FÁBIO GUILHERME C. M. DE CAMPOS - TSBCP
Resumo: Na última década, a indicação de técnicas laparoscópicas no manuseio de diversas doenças colo-retais vem se ampliando. Até o momento, as perspectivas da vídeo-cirurgia na Doença de Crohn (DC) ainda não foram claramente definidas, razão pela qual a indicação desses procedimentos ainda se encontra em fase de avaliação crítica. Grande parte das publicações é constituída por relatos de casos ou séries não controladas, em que se estabelece comparação com grupos históricos. A maior crítica a esses estudos comparativos é a falta de randomização, que determina critérios distintos na seleção dos pacientes candidatos à laparoscopia ou à laparotomia. Entretanto, as falhas metodológicas na avaliação dos resultados não invalidam, per se, os numerosos benefícios observados. Em pacientes selecionados e operados por um cirurgião experiente, o acesso laparoscópico pode ser considerado a melhor alternativa no tratamento da íleo-colite de Crohn. Neste grupo jovem, admite-se que as vantagens da vídeo-cirurgia sejam superiores às observadas em outras doenças colo-retais, tendo em vista o risco potencial de várias operações ao longo da vida. Estudos não randomizados relataram vantagens precoces (preservação da parede abdominal, redução da hospitalização, rápida recuperação, melhora da função pulmonar) e tardias (menor formação de aderências e hérnias incisionais). Uma característica óbvia é o melhor aspecto cosmético, que é provavelmente uma vantagem importante do acesso laparoscópico neste grupo de pacientes jovens. A questão é estabelecer quais pacientes serão beneficiados e a relação custo-efetividade dessa via de acesso. Os índices de conversão e o tempo operatório dependem da experiência do cirurgião e de fatores associados ao paciente (laparotomia prévia, presença de fístula intestinal, massas inflamatórias ou doença recidivante), condições que não impedem, mas podem limitar o acesso laparoscópico. Há evidências de que a instituição de medidas que controlem a atividade da doença e a indicação cirúrgica em fase mais precoce possam aumentar as taxas de sucesso do acesso laparoscópico. No tratamento da DC, as melhores indicações são a criação de estomas para doença perianal grave, ressecção íleo-colônica no tratamento da ileíte terminal primária ou recidivante (na ausência de massa fixa ou fístula complexa), enteroplastia para doença jejuno-ileal e ressecção colônica segmentar em lesões colônicas curtas (situação rara). Situações clínicas como massas grandes e/ou fixas, fístulas complexas, perfuração em cavidade livre, múltiplas aderências e peritonite são consideradas contra-indicações relativas da via laparoscópica. Assim, futuros esforços no sentido de se definir o real papel da vídeo-cirurgia em portadores de DC devem agregar destreza técnica de equipes experientes e estudos prospectivos randomizados com maior número de pacientes.
Unitermos: cirurgia laparoscópica colo-retal, colectomia, doença de Crohn, doenças inflamatórias intestinais.
INTRODUÇÃO
As doenças inflamatórias intestinais (DII)
são afecções de etiologia desconhecida
25, 47 e de grande importância em saúde pública, cujo tratamento
envolve custos extremamente altos, incluindo
aqueles relacionados à perda de produtividade.
Pacientes portadores de Doença de Crohn
(DC) ou Retocolite Ulcerativa. (RCUI) são
geralmente jovens que já experimentaram vários tratamentos
com agentes imunossupressores. Em virtude dos
sintomas, muitos apresentam importantes
deficiências nutricionais que requerem diferentes formas de
terapia nutricional na evolução da doença
11, 12, 22.
O tratamento cirúrgico convencional
determina afastamento das atividades habituais, alterações
na imagem corpórea, dor parietal, alterações da
função intestinal e eventualmente requer a confeção de
um estoma intestinal. Ainda mais, significativa parcela
de pacientes irá necessitar número variável
de procedimentos cirúrgicos e internações hospitalares
ao longo da vida 53.
As características de um procedimento
minimamente invasivo constituem, portanto, um
atrativo especial neste grupo de pacientes, propiciando
rápida recuperação e menor agressão corporal
6. Assim, número cada vez maior de cirurgiões tem empregado a
vídeo-laparoscopia (VL) no manuseio destas afecções
7, 31.
No Brasil, esta indicação tem sido
pouco freqüente. Em levantamento nacional dos
casos operados entre 1992 e 2001 10 , constatamos que
as doenças benignas constituíram a maioria (60,2%)
dos pacientes operados, onde a DC e RCUI
representaram apenas 2,4% e 1,9% das indicações, respectivamente.
Estudos comparativos não controlados
têm destacado vantagens importantes desta via de
acesso. Hoje se reconhece que os limites de sua
aplicação dependem das características da doença,
do procedimento, da experiência da equipe e da
avaliação crítica dos resultados pós-operatórios. O número
ainda limitado de pacientes e a qualidade dos trabalhos
não são suficientes para obter conclusões
definitivas baseadas em evidências 7;
21. Entretanto, a experiência lentamente adquirida, o reconhecimento das
causas mais comuns de conversão operatória,
modificações nos cuidados pré-operatórios e a seleção mais
adequada dos pacientes têm permitido ampliar as chances
de sucesso no tratamento laparoscópico
49.
Esta revisão teve por objetivo
apresentar aspectos técnicos relevantes e os resultados
do manuseio da íleo-colite de Crohn por VL,
enfocando suas vantagens precoces e tardias e discutindo os
limites de sua aplicação.
aspectos técnicos importantes
Estima-se que o tratamento cirúrgico
seja necessário em quase 50% dos pacientes após 5
anos de doença, e entre 74% a 96% após 10 a 20 anos
de seguimento 14. As principais indicações cirúrgicas
nas DII são representadas por intratabilidade
clínica, hemorragia, manifestações extra-intestinais
(artrite, uveíte, eritema nodoso, pioderma gangrenoso),
risco de ou associação com câncer, estenoses,
fístulas, retardo do crescimento, doença perianal e colites
graves (colite fulminante, megacólon tóxico)
8.
A simples capacidade de se realizar um procedimento por meio de uma determinada via
não indica que sua aplicação seja correta.
Virtualmente, todos as operações realizadas por via convencional
em pacientes com DC podem ser feitas por VL,
incluindo procedimentos laparoscópicos de
complexidade variável, como laparoscopia diagnóstica,
derivação intestinal para controle de sépsis perineal ou
fístulas complexas, ressecção intestinal segmentar,
íleo-colectomia, enteroplastia, colectomia segmentar
ou total (com ou sem anastomose) 2, 21,
40. Essas técnicas variam na extensão em que os sucessivos
tempos operatórios (desvascularização, secção intestinal
e anastomose) são realizados dentro ou fora da
cavidade abdominal.
Laparoscopia diagnóstica e derivação
intestinal para doença perianal são procedimentos simples
que podem ser realizados no início do aprendizado
em vídeo-cirurgia 9. A laparoscopia diagnóstica pode
ser indicada quando o diagnóstico for incerto, apesar
dos exames radiológicos e endoscópicos, ou para
verificar a possibilidade da ressecção laparoscópica.
As ressecções segmentares e enteroplastias
devem ser feitas segundo os mesmos princípios da
cirurgia convencional 53 . Recomenda-se reconhecer a
extensão da doença pela inspecção seqüencial retrógrada (do
íleo terminal ao ângulo de Treitz), à procura de lesões
não detectadas radiologicamente. Os segmentos
doentes podem ser marcados e exteriorizados para ressecção
ou enteroplastia (Figura- 1).
Figura 1 - Técnicas de enteroplastia (Heineke-Mikulicz à esquerda e Finney à direita) |
A colocação dos portais deve ser
cuidadosamente planejada, tendo em mente que ao longo
da evolução podem ser necessárias reoperações ou
a confecção de estoma de derivação (doença
perianal grave, ileostomia permanente, quadro fulminante).
Normalmente, a dissecação é realizada
com o uso de tesoura endoscópica associada à
corrente elétrica. A rapidez do desenvolvimento
tecnológico atual permite prever que as técnicas e
o instrumental laparoscópico continuarão a
evoluir. Atualmente há melhores instrumentos
de apreensão, melhores laparoscópios que
propiciam melhor visualização e novas fontes de energia
para dissecção e hemostasia (ainda que um
pouco lentas). Nesse contexto, o uso de bisturi ultrassônico [Ultracision (Ethicon) ou
Autosonix (Tyco/USSC)] pode trazer vantagens
especiais, reduzindo o sangramento intra-operatório.
Outra perspectiva interessante é a utilização
de dispositivo recentemente desenvolvido para manipulação assistida com a mão
30 . O Lap disk (Ethicon-Johnson) permite a manutenção do
pneumoperitônio, facilita a apresentação das alças e
propicia maior segurança na manipulação de
mesentério inflamado. Entretanto, a experiência com este
dispositivo ainda é limitada.
As ressecções íleo-colônicas são
realizadas de maneira "assistida". O segmento é mobilizado
por via laparoscópica, após o que é exteriorizado
por pequena incisão auxiliar (ou
facilitadora), desvascularizado, ressecado e anastomosado fora
da cavidade abdominal. Em seguida, as alças
são reintroduzidas e se restabelece o
pneumoperitônio. A desvascularização também pode ser
intracorpórea, facilitando a exteriorização do cólon.
Na DC, é necessário evitar a apreensão e
tração da alça inflamada, progredindo-se a dissecção da
área intestinal normal em direção ao segmento doente,
a fim de evitar enterotomias. A inflamação
transmural resulta em mesentério espessado, friável e
com aderências, tornando sua manipulação difícil e
com maior risco de sangramento. Além disso, a
mobilização de alças inflamadas através de uma pequena
incisão pode causar estiramento e sangramento do
mesentério, além de poder acarretar íleo pós-operatório prolongado.
Apesar disso, a mobilização
laparoscópica seguida de ligaduras vasculares extracorpóreas
pode ser mais segura, rápida e barata quando o
mesentério for espessado, permitindo, inclusive, a confecção
de anastomose fora da cavidade 15, 21 . Há que se
considerar também que a aplicação de clipes requer
maiores cuidados técnicos em mesentério espesso.
Nesse sentido, uma opção bastante atraente consiste
em utilizar dispositivos especiais como o Ligasure
Lap (Valleylab), que permite selar vasos com
mínimo chamuscamento e disseminação de energia
térmica, mas a experiência atual é ainda pequena
21 .
Recomenda-se que as incisões auxiliares
sejam medianas trans-umbilicais 15, 43, ou
transversais suprapúbicas tipo Pfannenstiel
20 . Além do efeito cosmético, essas incisões preservam os flancos
do abdômen para a eventual realização de
estomas intestinais 37 . Uma vantagem adicional da
incisão mediana é possibilitar reintervenções
pós-operatórias e futuras ressecções laparoscópicas nas
recidivas. Aqueles que defendem a incisão de
Pfannenstiel acreditam que ela também proporciona menos dor
e complicações (infecção e hérnia) em comparação
às incisões medianas ou transversais.
Após a ressecção com margem mínima
de segurança, pode-se fazer anastomose
látero-lateral mecânica ou término-terminal manual,
sabendo-se, hoje, que a primeira está associada a menores
índices de complicações e recidivas
25, 57 .
Tabela 1 - Resultados do tratamento da Doença de Crohn por via laparoscópica
Autores | Nº total | RIC RID | Tempo (minutos) |
Conversão (%) |
Morbidade (%) |
Internação (dias) |
Milson et al, 1993 | 12 | 9 | 170 | 25 | 0 | 7,0 |
K.-Haag et al, 1994 | 20 | 20 | NF | 0 | 0 | NF |
Liu et al, 1995 | 10 | 5 | NF | 10 | 0 | 7,0 |
Bauer et al, 1995 | 18 | 18 | NF | 22 | 11 | 7,0 |
Ludwig et al, 1996 | 25 | 10 | 195 | 20 | 4 | 6,0 |
Reissman et al, 1996a | 72 | 30 | 150 | 14 # | 10 | 5,1 |
Wu et al, 1997 | 46 | 46 | 144 | 11 | 7 | 4,5 |
Hildebrandt et al, 1998 | 222 | 79 | 152 | 13 | NF | 6,5 |
Canin-Endres et al, 1999 | 88 | 83 | 183 | 1 | 13,6 # | 4,2 |
Meijerink et al, 1997 | 26 | 26 | 138 | 8 | 8 | 5,6 |
Jess et al, 1999 | 17 | 17 | 145 | 12 | 18 | 5 |
Bemelman et al, 2000 | 30 | 30 | 138 | 6,6 | 10 | 5,7 |
Alabaz et al et al, 2000 | 26 | 26 | 150 | NF | NF | 7,P |
Msika et al, 2001 | 20 | 20 | 302 | 0 | 9,5 | 8,3 |
Hamel et al, 2001 | 130 | 109 | 167 | 17 | 18 | 8,8 |
Duepree et al, 2002 | 21 | 21 | NF | 5 | 14,3 | 3,0 |
Evans et al, 2002 | 84 | 84 | 145 | 18 | NF | 5,6 |
Shore et al, 2003 | 20 | 20 | 145 | NF | 5 | 4,2 |
RIC = ressecção íleo-colônica; RID = ressecção do intestino delgado; NF = não fornecido; # = porcentagem referente ao número total de pacientes |
Resultados do tratamento Cirúrgico da Doença de Crohn
Já no início dos anos 90, séries não
controladas com pequeno número de casos atestaram
a possibilidade de tratar a íleo-colite de Crohn por
vídeo-cirurgia, relatando, inclusive,
procedimentos tecnicamente complexos 3, 34, 36, 39, 45,
56 .
Com base em resultados caracterizados por baixos índices de morbidade, conversão e
permanência hospitalar, as indicações de colectomias direitas
vídeo-assistidas foram gradativamente ganhando
maior aceitação 36, 46, 48; 49, 56
. Sugeriram-se benefícios interessantes, como redução do estresse
fisiológico, da formação de aderências e melhor
resultado cosmético, vantagens particularmente atraentes
em pacientes jovens e com maior risco de
operações múltiplas durante a vida
4, 7.
Na Tabela-1 estão relacionados os resultados
de diversos grupos no tratamento da Doença de
Crohn por meio de ressecções do íleo terminal e/ou
cólon direito.
Embora muitas publicações
contemplem pacientes submetidos a vários procedimentos
15, 23, 26, 35, 45, 46 , as ressecções íleo-colônicas representam a
maioria deles. Como se pode observar na tabela, as
experiências individuais ainda são pequenas, com o tempo
operatório variando de 138 a 302 minutos, conversão entre 0
e 25%, complicações entre 0 e 18% e tempo de
internação de 3 a 9 dias.
No tratamento das doenças colo-retais
benignas, alguns fatores são responsáveis por maior
conversão operatória, como obesidade, cirurgias prévias
e localização da doença 13, 21;
27. No que se refere à DC, a maior relutância na indicação da VL concentra-se
no manuseio das complicações locais da doença
(abscesso, fístulas, recidiva em anastomose) que,
quando associadas, podem aumentar os índices
de complicações intra-operatórias e de conversão
3 .
Nesse contexto, Wu et al 56
publicaram interessante trabalho comparando 46
pacientes divididos em 3 grupos distintos: 14 pacientes
com abscesso (grupo I), 10 pacientes com recidiva
em anastomose (grupo II) e 22 pacientes sem abscesso
ou operação prévia (grupo III). Esses
grupos laparoscópicos foram comparados com outros
70 pacientes operados por via convencional (grupo
IV), em que se registraram tempo operatório,
perda sangüínea, morbidade e permanência
hospitalar maiores. Os próprios autores destacam que
esses pacientes tinham doença mais disseminada e
com maiores complicações, o que justifica os
resultados obtidos. Ressaltam, entretanto, que os
respectivos índices de conversão foram 7%, 20% e 9% para os
três grupos, indicando que a presença de abscesso
não impede a realização da laparoscopia, e que a
recidiva anastomótica está associada à conversão em
parcela importante dos pacientes.
Portadores de ileíte terminal sem fístula
são considerados os melhores candidatos à
cirurgia laparoscópica 19, 27,
33 e, nos últimos anos, a
experiência acumulada tem permitido o tratamento de casos
cada vez mais complexos. Embora certas condições
como ressecções prévias, abscessos e fístulas não
impeçam o sucesso do procedimento, elas não devam ser
tratadas no início da experiência
19, 24 . Antes consideradas contra-indicações para ressecção, o
manuseio laparoscópico dessas condições adversas tem
obtido bons resultados 15, 36, 44, 50,
55. Admite-se que o preparo adequado dos pacientes por meio de
suporte nutricional, antibioticoterapia, repouso intestinal
e drenagens percutâneas de abscessos pode tornar
viável esta via de acesso 33, 56.
Canin-Endres et al 15 reportaram o
tratamento de 88 pacientes consecutivos, 42% dos quais
com operação prévia, e cujos achados
intra-operatórios foram massa inflamatória (17), abscesso (11) e
fístula (16). As fístulas situavam-se entre íleo,
jejuno, mesentério, cólon, parede abdominal ou bexiga.
As condutas incluíram procedimentos avançados
como ressecções íleo-colônicas (em pacientes com
ressecções prévias), ressecção anterior e colectomias
subtotais. Apesar disso, somente um paciente requereu
conversão (massa inflamatória em paciente reoperado) e a
média de internação foi de apenas 4,2 dias (3 a
11). Descreveram-se também índices similares
de complicações (23 x 38%) no tratamento de fístulas
em pacientes operados por vídeo-laparoscopia
ou laparotomia 58 .
Por outro lado, diferentes critérios de
seleção pré-operatória dos pacientes podem
determinar resultados adversos. Na Universidade John
Hopkins (Maryland, EUA), Schmidt et al
49 trataram 110 pacientes por obstrução (77%), falha do
tratamento clínico (35%), fístulas (27%) e sépsis perineal
(4%). Foram realizadas conversões em 40%
dos procedimentos, seja por aderências (21), extensão
da doença (9), massa inflamatória (7), fístula (5)
ou dificuldade no reconhecimento anatômico (3).
Esses dados mostram que o desafio técnico no tratamento
de doença grave encontra seus limites nos
fatores indicativos de conversão.
Com a finalidade de implementar os resultados, Watanabe et al
55 propuseram tratamento médico intensivo 30 dias antes do procedimento cirúrgico,
seja pelo uso de esteróides ou de diferentes formas
de terapia nutricional. Em 20 pacientes com um total
de 31 fístulas intestinais (14 íleo-ileais, 6
íleo-colônicas, 5 íleo-retais, 2 íleo-vesicais, 2 íleo-cutâneas,
1 gastrocólica e 1 íleo-duodenal), esses
autores reportaram complicações e conversões em apenas
16% dos pacientes.
Em série recente da Universidade Yale (Connecticut, EUA), Seymour e Kavic
50 relataram os resultados do tratamento de 17 pacientes com
DC complexa, incluindo fístulas, doença múltipla
ou extensa, abscessos e reoperações. Nenhum
paciente requereu conversão operatória. Entretanto,
nesses pacientes registraram-se maior tempo operatório
(244 +/- 18 vs 127 +/- 5 minutos, p < 0.05) e
de hospitalização (7.1 +/- 1.4 vs 4.5 +/- 0.4 dias)
quando comparados a pacientes com doença
limitada. Complicações maiores ocorreram em 18%. Os
autores destacaram que a viabilidade da VL na DC
complexa assume grande importância, uma vez que a
manutenção da integridade da parede abdominal tem grande
valor em pacientes que podem requerer
múltiplos procedimentos.
A confecção de enteroplastias
laparoscópicas também já foi relatada em pequeno número de
casos 29, 35, 55, demonstrando eficácia e morbidade
semelhantes às ressecções convencionais no tratamento da
DC jejuno-ileal 16 .
Embora seja possível o manuseio de
pacientes com doença recidivada
55, os índices de recidiva e o intervalo livre de doença não parecem ser afetados
pelo acesso laparoscópico 7, 52.
Mais recentemente, estudos prospectivos comparativos têm realçado o potencial do
acesso laparoscópico frente às operações convencionais.
Em estudo randomizado, Milsom et al 40 ressaltaram que
a via laparoscópica proporciona recuperação mais
rápida das funções pulmonares, além de determinar
menos complicações e menor tempo de hospitalização.
De maneira mais contundente, outros consideram que
as íleo-colectomias laparoscópicas podem ser
realizadas com sucesso na maioria dos casos, considerando
esta via a preferencial nas ressecções primárias
5, 51 .
Evidências de estudos comparativos
não randomizados sugerem que a VL provê vantagens
tanto a curto prazo como tardias. As principais
são representadas por menor perda sangüínea
51 , menos dor 52, recuperação mais rápida das funções
intestinais 17, 41, 51, 52, 58 , preservação da parede abdominal
18, menor permanência hospitalar
1, 5, 17, 41, 51, 52, 58, morbidade semelhante
5, 17 ou menor 41, menor incidência
de obstrução sintomática do intestino delgado
1, 7, menor estresse operatório
28, retorno mais rápido ao
trabalho, melhor desempenho social e sexual
1.
Quanto ao tempo operatório, este tem
sido comumente mais longo em VL 1, 5, 41, 51
. Mas, de maneira geral, muitos autores destacam o efeito cosmético
como um dos maiores benefícios 1, 5,
18 .
No tocante à relação custo-benefício,
a documentação ainda limitada já permite inferir
outra grande vantagem da VL. Em análise comparativa
de casos consecutivos não randomizados da Mayo
Clinic 58 , creditou-se o menor custo total do tratamento (US
$ 9895 vs $13268; p<0,01) aos diversos
benefícios proporcionados pela VL, como menor íleo,
necessidade de analgesia e permanência hospitalar (4 vs 7 dias).
Na mesma linha, Msika et al41 também sugeriram que
o menor custo do procedimento laparoscópico
(US$ 6.106 vs $ 9829) relaciona-se, possivelmente, à
redução dos índices de complicações (9,5% vs 18,5%) e
menor permanência hospitalar (8,3 vs 13,2 dias).
Por sua vez, Shore et al 51 também
documentaram redução dos custos hospitalares totais em
pacientes operados por VL (US$ 9.614 vs $ 17.079).
Entretanto, deve-se levar em consideração que, em sendo a via
de acesso uma escolha do cirurgião, o menor custo
por caso operado (US$ 2.547 vs $2.985; p < 0,05)
pode, eventualmente, ser decorrente da seleção de
pacientes com doença menos grave no grupo
laparoscópico, conforme sugere o trabalho de Duepree et al
17 .
A vantagem econômica pode também
ser decorrente de uma menor incidência de
readmissões hospitalares em pacientes operados por VL.
Na Cleveland Clinic da Flórida, Alabaz et al
1 observaram que, embora a incidência de complicações precoces e
o custo da internação hospitalar fossem similares
entre doentes operados por via convencional ou
laparoscópica, estes últimos desenvolveram menos obstrução
intestinal sintomática (2/26=8% vs 15/48=31%; p = 0,02)
durante seguimento médio por 30 meses. Esses dados
encontram suporte em estudo retrospectivo 7
comparando 39 ressecções íleo-colônicas por VL com 56
controles operados por via convencional, em que se
encontrou menor incidência de obstrução intestinal
após laparoscopia (11% vs 35%; p = 0,02).
Um benefício que merece ser valorizado é
a menor extensão da incisão abdominal. Dunker et al
18 demonstraram, por meio de questionários, que
o emprego da laparoscopia determina importante impacto em escores cosméticos de imagem corpórea
e qualidade de vida. Alabaz et al 1 também
enviaram questionários a seus pacientes, que revelaram que
as ressecções laparoscópicas se associaram com
melhor resultado cosmético (14/16 vs 13/31), melhor
vida social e sexual (8/16 vs 5/31).
As indicações cirúrgicas na colite de
Crohn têm incidência variável e a conduta
operatória depende da localização preferencial do
processo inflamatório e da presença de lesão perianal
54 . Não há na literatura, ainda, relato sobre
ressecção colônica segmentar e poucas séries relatam
os resultados pós CT 15, 46 .
Em levantamento realizado em dois grandes centros dos EUA e Europa
23, compararam-se os resultados de ressecções íleo-colônicas (109)
e colectomias subtotais (21) por VL no tratamento
da DC. Concluiu-se que as colectomias subtotais determinaram mais complicações
intra-operatórias (29% x 7%), não havendo diferença
significativa quanto à permanência hospitalar (8,8 dias),
conversão (24% x 17%) e complicações pós-operatórias (29%
x 18%). Outra diferença encontrada foi o
tempo operatório [231 min (140 _ 340) x 167 min (90 _ 285)].
Admite-se que a realização de CT (com ou
sem proctectomia) representa um dos procedimentos laparoscópicos de maior complexidade e
dificuldade técnicas. Apesar dos resultados hoje serem
mais encorajadores do que há 10 anos, ainda não
se demontraram vantagens claras e reprodutivas.
Neste contexto, devem ser realizadas apenas em centros
com grande volume de doentes e experiência
técnica reconhecida.
Além das vias convencional e
laparoscópica, outra alternativa de acesso ao íleo terminal é a
mini-laparotomia. Nakagoe et al 42 compararam os
resultados precoces de 9 pacientes sem complicações da
doença, submetidos a tratamento através de incisão menor
que 7 cm, com 10 pacientes tratados por
laparotomia (média de 16,5 cm; p <0.05). Apesar dos
grupos apresentarem características semelhantes quanto
à idade, sexo, índice de massa corpórea e número
de laparotomias prévias, aqueles submetidos à
mini-laparotomia apresentaram deambulação mais
precoce, sem diferenças quanto à eliminação de
gases, realimentação, analgesia ou tempo de
hospitalização. Não houve complicações neste período. Os
autores sugerem que a mini-laparotomia nesta condição
é menos invasiva que a via convencional.
Summary: During the last decade, the indications of laparoscopic techniques in the management of many colorectal diseases
have extended. Untill now, the perspectives of videosurgery in Crohn's Disease (CD) have not been fully defined, the reason why
its indication is still under critical evaluation. The great majority of publications are represented by case reports or uncontrolled
series comparing their results with historic groups. The main criticism of these comparative studies is their non randomized
nature, leading to different criteria in the selection of patients to laparoscopy or laparotomy. However, the methodological failure in
the evaluation of results doesn't invalidate the numerous reported benefits. The laparoscopic access has been considered the best
alternative in the management of selected patients with Crohn's ileocolitis. In this young group, the potential advantages may be
far beyond those observed in other colorectal diseases, when one considers the risk of many surgeries during lifetime.
Non-randomized studies have reported early (preservation of abdominal wall, less hospital stay, fast recovery, better respiratory function) and
late advantages (reduced adherence formation and incisional hernias). An obvious feature of the laparoscopic approach is the
improved cosmesis, that may become a relevant question in this young group of patients. Thus, an important issue is to find out what
patients will benefit from and the cost effectiveness of laparoscopy. Conversion rates and length of surgery depend on surgeon's
experience and patient associated factors (previous laparotomy, intestinal fistula, inflammatory mass or recurrent disease). Although
these conditions don't prevent the laparoscopic approach, they may limit the procedure. There is evidence that measures to control
disease activity and early operative indication may improve laparoscopic success rates. In the treatment of CD, the best indications
are stoma creation for severe perianal disease, ileocolonic resection for primary or recurrent terminal ileitis (in the absence of fixed
mass or complex fistula), enteroplasty for jejunoileal disease and segmentar colonic resection for short colonic lesions (rare cases).
Clinical conditions such as large or fixed inflammatory masses, complex fistulas, free perforation, multiple adherences and peritonitis
are considered relative contraindications to laparoscopy. Thus, future efforts to define the role of laparoscopy in the management of
CD must congregate technical skills of experienced groups and prospective and randomized studies with a greater number of patients.
Key words: laparoscopic colorectal surgery, colectomy, Crohn's disease, inflammatory bowel disease.
Referências Bibliográficas
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Endereço para correspondência:
Fábio Guilherme C. M. de Campos
Alameda Jaú, 1477 - apto. 111 A - Cerqueira César
01420-002 - São Paulo (SP)
E-mail: fgmcampos@terra.com.br