ARTIGOS ORIGINAIS
JOSÉ RIBAMAR BALDEZ _TSBCP
BALDEZ JR. Relação entre os Sintomas Clínicos da Incontinência Anal e os Resultados da Manometria Anoretal.
Rev bras Coloproct, 2004;24(2):140-143.
RESUMO : O objetivo do presente trabalho foi analisar os sintomas clínicos frente aos resultados da manometria anoretal em pacientes com incontinência fecal. Comparamos a freqüência dos sintomas clínicos com a presença ou ausência de anormalidades funcionais. Usando esta metodologia, as seguintes relações podem ser encontradas: a necessidade de usar protetores anais, com a diminuição da pressão de repouso do canal anal; a capacidade de retardar sua evacuação com a diminuição de pressão voluntária de contração do canal anal; a interferência da incontinência nas atividades sociais, com a diminuição da duração da contração voluntária do canal anal (tempo de sustentação muscular); sintomas urinários com o aumento do volume de distensão retal necessário para promover o aparecimento do reflexo inibitório reto anal; prolapso retal completo com a redução do comprimento do canal anal. Concluindo demostramos a importância do exame manométrico na prática colo-proctológica
Unitermos: Incontinência Anal, Apresentação Clínica, Resultados da Manometria Anoretal
introdução
Geralmente, a relação entre os sintomas
clínicos da incontinência anal e os resultados da
investigação anoretal não são claros, provavelmente porque
a incontinência pode ser devida a distúrbios da
função de um ou mais componentes que contribuem para
a continência normal. Por esta razão, o nosso
objetivo foi somente tentar identificar anormalidades ano
retais que possam levar a um melhor entendimento
dos sintomas da incontinência fecal. Porisso, para
observar se existe relação entre sintomas clínicos
e anormalidades da função anoretal assim como
a freqüência desta relação, foram estudados
120 pacientes incontinentes, submetidos a manometria
ano retal no departamento de fisiologia da Clínica
de Proctologia do Maranhão, no período
compreendido entre março/2000 a outubro/2002, os quais
foram solicitados a preencherem um
questionário padronizado.
PACIENTES E MÉTODOS
Noventa (90) pacientes de sexo feminino e trinta (30) do sexo masculino consultados com
queixa de incontinência, com idade variando entre 20 a
80 anos, com média de 58 anos, participaram do
estudo, sendo assim distribuídos:
· grupo I - incontinência sem lesão muscular e
com prolapso.
· grupo II - incontinência sem lesão muscular e
sem prolapso.
· grupo III - incontinência com lesão muscular.
O grupo I era representado por 36 pacientes (30%), sendo maior a prevalência acima de 60 anos
de idade, com história de constipação intestinal de
longa duração, grandes esforços para evacuar e com
certo grau de neuropatia do pudendo.
O grupo II representado por 48 pacientes (40%) tinha sua maior ocorrência em mulheres com mais
de 3 partos normais, história de constipação
intestinal crônica e com certo grau de relaxamento perineal.
No grupo III correspondendo a 30% dos pacientes estudados, tiveram suas lesões
musculares esfincterianas produzidas por lesões obstétricas e
por complicações de fistulectomias anais
e hemorroidectomias mal executadas.
A colonoscopia foi normal em todos os pacientes e nenhum tinha doença sistêmica ou neurológica.
O questionário incluía os seguintes itens:
duração da incontinência; ocorrência de incontinência para
fezes formadas ou líquidas, flatus ou muco; freqüência
da incontinência, diária, semanal ou ocasional;
abundância da incontinência; vazamento sem conhecimento
do paciente; necessidade de usar protetores anais; conhecimento de uma defecação urgente;
capacidade para retardar uma evacuação; interferência
da incontinência nas atividades sociais; diarréia;
associação com sintomas urinários; cirurgia prévia.
MANOMETRIA ANO RETAL
Em todos os pacientes, obedeceu-se á
seguinte sistemática:
1. medição do comprimento do canal anal
2. registro da pressão de repouso nas partes alta
e baixa do canal anal.
3. registro da pressão de contração voluntária
do canal anal.
4. estudo do Reflexo Inibitório Reto Anal.
Durante este período, era registrado o volume
de distensão retal necessário para despertar este
reflexo assim como também o registro do volume
máximo tolerado.
Para análise estatística, somente a
normalidade ou anormalidade de cada parâmetro foi
considerada. diminuição do comprimento do canal anal (<
3cm), pressão de repouso (< 30cm
H2O), pressão voluntária de contração (< 80cm
H2O) ou duração (<40 segundos), foram considerados parâmetros
de anormalidade. volume máximo tolerado menor
que 120ml ou maior que 300ml foram considerados
como correspondentes a micro reto e mega reto, respectivamente se o volume de distensão
retal necessário para despertar o reflexo inibitório reto
anal era superior a 30ml, considerava-se anormalidade.
RESULTADOS
A duração da incontinência foi menor que
1 ano em 45% dos pacientes, entre 1 e 2 anos em 35%,
e superior a 2 anos em 20%. a incontinência diária
foi observada em 75% dos pacientes, e o tipo
ocasional em 25%. somente 10% dos pacientes
apresentavam perdas involuntárias abundantes, e 90% tinham
pequenas perdas fecais. os sintomas mais
freqüentes foram:
1. necessidade de usar protetores anais em 58%;
2. vazamento sem conhecimento do paciente
em 50%;
3. urgência em evacuar sem período de
aviso consciente em 65%;
4. incapacidade de retardar uma evacuação em
70%. 25% dos pacientes queixavam-se de
incontinência somente quando apresentavam diarréia.
15% informavam associação com
incontinência urinária.
A freqüência de anormalidade ano
retal demonstrada pela manometria não depende da
idade dos pacientes. a diminuição de pressão de repouso
do canal anal assim como também da contração
voluntária foi mais freqüente em mulheres (75%) que em
homens (25%). a duração da incontinência, sua
freqüência, vazamento fecal sem conhecimento do paciente
e urgência em evacuar sem aviso, não diferem em
relação com os resultados da manometria ano retal.
Porém, o vazamento fecal inconsciente foi
mais freqüente quando a ampola retal estava repleta de
matéria fecal que quando vazia; a urgência em evacuar
sem conhecimento consciente foi mais freqüente
com constantes crises de diarréia. a necessidade de
usar protetores anais foi muito associada à diminuição
da pressão basal do canal anal (70%). a inabilidade
para retardar uma evacuação relaciona-se com a
diminuição da pressão de contração voluntária do canal anal
(65%). o prolapso retal associou-se com redução
do comprimento do canal anal em 35%. os sintomas urinários foram mais freqüentes nos casos
de anormalidade no volume de distensão retal
necessário para despertar do reflexo inibitório reto anal (65%).
Finalmente, os pacientes que tinham suas atividades sociais prejudicadas pela
incontinência associaram-se à diminuição do tempo de
sustentação muscular em 70%.
DISCUSSÃO
As relações entre os sintomas clínicos
da incontinência fecal e os resultados da manometria
ano retal é geralmente difícil de ser estabelecido
e interpretado. Numa tentativa de melhor estudar
os sintomas desta enfermidade, 120 incontinentes pacientes que tinham se submetido à manometria
ano retal foram instados a responder um
questionário padronizado. Nosso objetivo foi verificar se
as anormalidade manométricas encontradas estão
na dependência dos sintomas relatados pelos pacientes.
Valores normais de manometria ano retal foram estabelecidos previamente em pessoas
sadias (grupo controle) da mesma faixa etária do grupo
de pacientes incontinentes, objeto do presente
estudo. Apesar do fato de que este grupo controle não ser
o ideal, acreditamos que os valores normais
estabelecidos serviram como bom parâmetro de comparação.
Em algumas circunstâncias encontramos pobres
resultados manométricos em pacientes com
sintomas significativos e vice versa. Observa-se também que
uma mesma desordem funcional pode produzir
várias anormalidades manométricas e uma
mesma anormalidade manométrica corresponder a
várias desordens funcionais.
Porém, se considerarmos as relações um
para um, poderíamos concluir o que se segue;
a- necessidade de usar protetores anais com a pressão de repouso do canal anal.
b- incapacidade de retardar uma
evacuação com a pressão de contração voluntária
do canal anal.
c- prolapso retal com comprimento do canal anal.
d- sintomas urinários (incontinência)
com elevação threshold, sugerindo que
esta associação pode ser mais frequente
em casos de neuropatia.
e- baixo tempo de sustentação muscular com
interferência nas atividades sociais dos pacientes, sugerindo que a inabilidade
para controlar voluntariamente a
defecação depende não somente de uma
normal contração voluntária, mas também,
da possibilidade da manutenção desta contração por um determinado período
de tempo.
Finalmente, apesar das dificuldades de estabelecer uma relação entre os sintomas
clínicos da incontinência anal e as desordens encontradas
na avaliação manométrica, o presente estudo
pode contribuir para ajudar na interpretação
dos mecanismos fisiopatológicos desta
enfermidade, demonstrando a importância da
avaliação manométrica nos pacientes com incontinência anal.
SUMMARY: The main objective of this study was to analyse the Clinical Symptoms in front of the results of Ano Rectal Manometry in patients with Anal Incontinece. The frequency of the Clinical Symptoms was compared whith the presence or abscence of the functional abnormalites. Using this methodology the following relationships may be fround: the need to wear a pad, with low resting anal presure; the inability to delay one evacuation, whith decreased anal voluntary contraction; interference of incontinence with social activities, with decreased duration of anal voluntary contraction time: urinary symptoms, with increased threshold volume of rectal volume to promove the reto anal inibitory reflex; total Rectal prolapse, with the reduction of the anal canal lenght.
Key words: Anal Incontinence, Clinical Presentation, Resulth of the Ano Manometry.
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Endereço para correspondência:
José Ribamar Baldez
Clínica de Proctologia do Maranhão
Rua do Apicum, 104 - Centro
65.025-070 -São Luís (MA)
E-mail: cpm@elo.com.br
Trabalho Realizado no Departamento de Fisiologia da Clínica de Proctologia do Maranhão.