ARTIGOS ORIGINAIS
VALDEMIR JOSÉ ALEGRE SALLES - ASBCP
DELCIO MATOS
SARHAN SYDNEY SAAD - TSBCP
SALLES VJA, MATOS D, SAAD SS. Bacteriologia da Região Dérmica
em Área Peri-Colostômica. Rev bras
Coloproct, 2004;24(4):345-353.
RESUMO: Objetivo: Identificar as alterações ocorridas na bacteriologia da camada dérmica peri-colostômica em doentes portadores de colostomia. Métodos: Trinta e quatro pacientes portadores de colostomias temporárias foram analisados, sendo que destes, dezenove casos (55,9%) eram no sigmóide e quinze (44,1%) no cólon transverso. Todos os doentes eram colostomizados há mais de sete semanas. A obtenção da amostra tecidual foi realizada após a anti-sepsia da região peri-colostômica. Para a análise estatística, foi aplicado o teste Exato de Fisher e o teste de Associação linear por linear, admitindo-se um p £ 0,1. Resultados: Na região peri-colostômica, a bactéria aeróbia mais encontrada foi a Escherichia coli, e dentre as bactérias anaeróbias, a mais freqüente foi o Bacteroides spp, na doença colorretal benigna (44,5%), e o Peptococcus spp, na doença neoplásica colorretal maligna (43,7%). No estudo da associação entre a presença de microorganismo e o tipo de doença, a bactéria Enterobacter spp teve uma maior incidência na doença colorretal maligna. No estudo da associação da presença de microorganismo e o tempo de colostomia, o dado significante foi a ausência das bactérias Bacteroides fragilis e Klebsiella spp após vinte semanas, enquanto o Peptococcus spp apresentou um aumento significante em relação ao maior tempo de colostomia. O estudo quantitativo demonstrou índices variáveis, de microorganismos por grama de tecido, que segue a mesma distribuição da análise qualitativa. Conclusões: Ocorre uma alteração na flora bacteriana da região dérmica, em área peri-colostômica, resultante da colonização dessa região por bactérias presentes no conteúdo entérico.
Unitermos: colostomia, bacteriologia, infecção da ferida operatória
INTRODUÇÃO
As complicações sépticas desenvolvidas
no sítio da colostomia apresentam uma incidência
que varia habitualmente de 0,5% a 25,0%
1,2,3,4,5,6,7,8.
O surgimento de infecção
peri-colostômica parece estar ligado a múltiplos fatores, entre os
quais a fixação colônica ao orifício
peritôneo-aponeurótico6, a contaminação de um hematoma paracólico
9, a realização de manobras não assépticas, o
preparo insuficiente do cólon, o envolvimento de
segmento intestinal comprometido por doença inflamatória e
a sutura de fixação colo-cutânea, atingindo a mucosa
10. Associa-se também, a deiscência da anastomose
colo-cutânea 11, à presença de corpo estranho, pela
recidiva de doença inflamatória intestinal, pela
aplicação inadequada da técnica cirúrgica, devido à
constituição física e ao quadro clínico do doente, e secundária
à contaminação do tecido celular subcutâneo em
torno da colostomia, pelo contato do conteúdo da
luz intestinal com esta região
12. A infecção no sitio cirúrgico que ocorre após o fechamento da
colostomia é atribuída à manipulação intestinal, com
exposição do seu conteúdo, acrescida da colonização
bacteriana, predominantemente gram-negativa, presente na
pele desses doentes, desenvolvida a partir da realização
da colostomia 13,14.
Na prática clínica, temos observado que
a complicação infecciosa, envolvendo a região
peri-colostômica, ocorre com uma freqüência baixa,
apesar do permanente contato do tecido cutâneo local com
o conteúdo entérico. Esta observação nos motivou
a realizar este estudo, procurando identificar a
flora bacteriana da camada dérmica do tecido
cutâneo abdominal, em pacientes portadores de colostomia.
CASUÍSTICA E MÉTODOS
Neste trabalho foram incluídos trinta e
quatro doentes portadores de colostomia temporária
localizada no cólon transverso ou em sigmóide, que
foram submetidos à reconstrução do trânsito intestinal,
no período de 10 de outubro de 2000 a 10 de setembro
de 2002. Este estudo recebeu a aprovação da
Comissão de Ética Médica e todos os doentes foram
informados do procedimento e concordaram em participar
da pesquisa, mediante assinatura de Termo de Consentimento Informado.
Foram incluídos doentes pertencentes ao estádio clínico I ou II, adotado pela
American Society of Anesthesiology, com o estadiamento oncológico
de Astler & Coller até o estádio B2 e colostomizados
há mais de seis semanas. Não admitimos
doentes portadores de alteração cutânea localizada na
região peri-colostômica ou sistêmica, que
estivessem realizando quimioterapia e/ou radioterapia, ou que
a realizaram havia menos de trinta dias, os imunodeprimidos, diabéticos, caquéticos,
em tratamento ou tratados nos últimos trinta dias
com antibióticos ou antiinflamatórios e com
processo infeccioso ou inflamatório em outros tecidos.
Dentre os doentes estudados, vinte (58,8%) pertenciam ao sexo masculino e quatorze (41,2%),
ao feminino. Quanto à faixa etária, observamos que
a média da idade foi de 51,6 anos, com uma idade
mínima de 16 anos e máxima de 84 anos. Considerando
a avaliação do risco cirúrgico, vinte e cinco
(73,5%) doentes foram classificados na classe I, e nove
(26,5%), na classe II. Os doentes deste estudo, que
pertenciam ao risco cirúrgico de grau II, eram portadores
de hipertensão arterial sistêmica leve.
As colostomias foram realizadas no
sigmóide, em dezenove casos (55,9%), e no cólon
transverso, em quinze casos (44,1%), sendo divididas segundo
o tipo em terminal ou em alça, como pode ser
observado na Tabela-1.
Tabela 1 - Distribuição dos tipos de colostomias.
Tipo de colostomia |
DOENTES |
|
N | % | |
Transversotomia em alça | 15 | 44,1 |
Sigmoidostomia em alça | 14 | 41,2 |
Sigmoidostomia terminal | 05 | 14,7 |
Total | 34 | 100,0 |
Os procedimentos cirúrgicos que
envolveram a realização de colostomia foram: trauma de reto
(12/35,4%), tumor de reto (12/35,4%), tumor de
cólon esquerdo (04/11,8%), volvo de sigmóide
(04/5,8%), diverticulite aguda de sigmóide (02/5,8%), trauma
de cólon esquerdo (01/2,9%) e deiscência de
anastomose colorretal (01/2,9%).
O intervalo de tempo de permanência da colostomia foi de no mínimo 7,5 semanas, com
um tempo máximo de 33 semanas, correspondendo a
um tempo médio de 16,9 semanas.Os doentes
foram classificados em quatro subgrupos, de acordo com
o tempo de permanência da colostomia, tendo cada
um deles aproximadamente quatro semanas. Os
subgrupos foram assim distribuídos:
· Subgrupo l: de 7,5 a 12,0 semanas, composto
por dez doentes;
· Subgrupo ll: de 12,3 a 16,0 semanas, composto
por nove doentes;
· Subgrupo lll: de 16,3 a 20,0 semanas, composto
por cinco doentes;
· Subgrupo lV: superior a 20 semanas, com
dez doentes.
Os doentes fizeram o preparo de cólon
com manitol 10% e enteroclisma, sendo a
antibioticoterapia iniciada somente após a coleta do material biológico.
A antissepsia da região peri-colostômica
foi realizada com soro fisiológico e
polivinilpirrolidona-iodo e lauril éter sulfato de sódio à 10%, pelo
tempo mínimo de cinco minutos. Utilizando uma pinça de
saca-bocado de 0,3 cm de diâmetro, realizamos
duas biópsias do tecido cutâneo, junto à borda inferior
da colostomia, a cerca de 0,5 cm da anastomose
entero-cutânea e eqüidistantes cerca de 1,0 cm. As
amostras da derme foram estudadas do ponto de
vista microbiológico de três maneiras: pela realização
de cultura aeróbia e anaeróbia (estudo qualitativo),
pela contagem de colônias e pela quantificação de
bactérias por grama de tecido (estudo quantitativo).
Aplicamos o teste Exato de Fisher no estudo da associação
entre a presença dos microorganismos e a localização
da colostomia, e no da associação entre a presença
dos microorganismos e a doença determinante
da colostomia. O teste de Associação linear por
linear foi aplicado no estudo da associação entre a
presença dos microorganismos e o tempo de permanência
da colostomia. Em todos os testes fixou-se em 0,1
ou 10% (a £ 0,1), o nível para rejeição da hipótese
de nulidade. Utilizamos a média aritmética
na determinação do estudo quantitativo.
RESULTADOS Total
Inicialmente foi estudada a distribuição
da freqüência de crescimento das bactérias nos trinta
e quatro doentes. A bactéria aeróbia que cresceu
em maior número de exames foi a Escherichia
coli (31/34 ou 91,2%), enquanto dentre as anaeróbias foram
o Bacteroides spp e o Peptococcus
spp (13/34 ou 38,2%). Estes dados se encontram na Tabela-2.
Tabela 2 - Distribuição geral das bactérias.
BACTÉRIAS
N
%
Bacteroides fragilis
10
29,4
Bacteroides spp
13
38,2
Bifidobacterium spp
01
2,9
Enterobacter spp
06
17,6
Escherichia coli
31
91,2
Fusobacterium spp
02
5,9
Klebsiella spp
11
32,3
Peptococcus spp
13
38,2
Pseudomonas aeruginosa
01
2,9
Staphylococcus epidermidis
04
11,8
COLOSTOMIA Transversostomia Sigmoidostomia N
%
Com relação às espécies bacterianas
mais freqüentemente encontradas, de acordo com
a localização da colostomia, observou-se
nas transversostomias, que dentre as bactérias aeróbias
a Escherichia coli (12/15 ou 80,0%)
predominou, seguida pela Klebsiella spp (5/15 ou 33,3%), e
dentre as bactérias anaeróbias o Peptococcus
spp (8/15 ou 53,3%), seguido pelo Bacteroides
spp (7/15 ou 46,6%). Na sigmoidostomia, dentre as bactérias aeróbias
a Escherichia coli (19/19 ou 100,0%)
predominou, seguida pela Klebsiella spp (6/19 ou 31,6%), e
dentre as bactérias anaeróbias o Bacteroides
spp (6/19 ou 31,6%) e o Bacteroides
fragilis (6/19 ou 31,6%), conforme a descrição da Tabela-3.
Tabela 3 - Distribuição das bactérias quanto a localização da colostomia.
BACTÉRIAS
N
%
Bacteroides fragilis
04
26,6
06
31,6
Bacteroides spp
07
46,6
06
31,6
Bifidobacterium spp
00
---
01
5,2
Enterobacter spp
03
20,0
03
15,8
Escherichia coli
12
80,0
19
100,0
Eubacterium spp
00
---
02
10,5
Fusobacterium spp
01
6,6
01
5,2
Klebsiella spp
05
33,3
06
31,6
Peptococcus spp
08
53,3
05
26,3
Pseudomonas aeruginosa
00
---
01
5,2
Staphylococcus epidermidis
02
13,3
02
10,5
DOENÇA Benigna Maligna N
%
Em pacientes portadores de doença
benigna, as bactérias aeróbias mais freqüentemente
encontradas foram a Escherichia coli (18/18 ou 100,0%) e
a Klebsiella spp (7/18 ou 38,9%) e dentre as
bactérias anaeróbias foram o Bacteroides
spp (8/18 ou 44,5%) e Peptococcus spp (6/18 ou 33,3%); já na
doença maligna, predominaram as bactérias
aeróbias Escherichia coli (13/16 ou 81,2%) e
Enterobacter spp (5/16 ou 31,2%) e as bactérias anaeróbias
Peptococcus spp (7/16 ou 43,7%) e o Bacteroides
fragilis (6/16 ou 37,5%), conforme a descrição da Tabela-4.
Tabela 4 - Distribuição das bactérias de acordo com a doença determinante.
BACTÉRIAS
N
%
Bacteroides fragilis
04
22,2
06
37,5
Bacteroides spp
08
44,5
05
31,2
Bifidobacterium spp
01
5,5
00
---
Enterobacter spp
01
5,5
05
31,2
Escherichia coli
18
100,0
13
81,2
Eubacterium spp
02
11,1
00
---
Fusobacterium spp
02
11,1
00
---
Klebsiella spp
07
38,9
04
25,0
Peptococcus spp
06
33,3
07
43,7
Pseudomonas aeruginosa
01
5,5
00
---
Staphylococcus epidermidis
01
5,5
03
18,7
A comparação das espécies
bacterianas identificadas de acordo com o tempo de
permanência da colostomia, demonstrou que a bactéria
Escherichia coli esteve presente em todos os períodos; enquanto
que a partir do período superior a 20 semanas, ocorreu
a ausência do Bacteroides fragilis e da
Klebsiella spp, e um aumento do Peptococcus
spp, conforme a Tabela-5.
Tabela 5 - Distribuição das bactérias de acordo com o tempo de permanência da colostomia.
BACTÉRIAS
TEMPO DA
COLOSTOMIA *
1º
2º
3º
4º
N
%
N
%
N
%
N
%
Bacteroides fragilis
05
50,0
03
33,3
02
40,0
00
---
Bacteroides spp
04
40,0
02
22,2
00
---
07
70,0
Bifidobacterium spp
00
---
00
---
01
20,0
00
---
Enterobacter spp
01
10,0
02
22,2
01
20,0
02
20,0
Escherichia coli
09
90,0
08
88,8
05
100,0
09
90,0
Eubacterium spp
00
---
01
11,1
01
20,0
00
---
Fusobacterium spp
00
---
01
11,1
00
---
01
10,0
Klebsiella spp
07
70,0
02
22,2
02
40,0
00
---
Peptococcus spp
03
30,0
01
11,1
03
60,0
06
60,0
Pseudomonas aeruginosa
00
---
00
---
01
20,0
00
---
Staphylococcus epidermidis
01
10,0
01
11,1
01
20,0
01
10,0
*Tempo 1º: da 7,5 a 12 semanas; Tempo 2º: da 12,3 semanas a 16 semanas;
Tempo 3º da 16,3 semanas a 20 semanas; Tempo 4º:
superior a 20 semanas.
Analisando-se o número de
microorganismos por grama de tecido de acordo com o local
da colostomia, identificou-se nas transversostomias,
o Staphylococcus epidermidis como a bactéria
aeróbia presente em maior número, com a média de 3,3 x
1010, seguido pela Escherichia
coli com o número médio de 2,9 x
1010, e pela Klebisiella spp com 1,9 x
1010. Dentre as anaeróbias destacou-se o
Bacteroides fragilis, que apresentou uma média de 4,7 x
1010, seguido pelo Bacteroides
spp com 2,2 x 1010 e pelo Peptococcus spp
com 1,9 x 1010. Nas sigmoidostomias ao se estudar o número de microorganismos por
grama de tecido, identificou-se a Escherichia coli,
como a bactéria aeróbia que apresentou a média de 1,6 x
1010, seguidos pelo Enterobacter
spp com 9,5 x 109 e pela Klebsiella spp com 8,2 x
109, enquanto que entre as bactérias anaeróbias o
Bacteroides fragilis, apresentou uma média de 2,4 x
1010, seguido pelo Bacteroides spp
com 8,6 x 109 e o Peptococcus spp
com 4,3 x 109, conforme se acha discriminado na Tabela-6. COLOSTOMIA Transversostomia Sigmoidostomia N Média
Tabela 6 - Distribuição do número médio de microorganismos por grama de tecido de acordo com o local
da colostomia
N
Média
Bacteroides fragilis
4,0
4,7x1010
6,0
2,4x1010
Bacteroides spp
7,0
2,2x1010
6,0
8,6x109
Bifidobacterium spp
0,0
-
1,0
1,6x109
Enterobacter spp
3,0
6,8x109
3,0
9,5x109
Escherichia coli
12,0
2,9x1010
19,0
1,6x1010
Eubacterium spp
0,0
-
2,0
1,4x109
Fusobacterium spp
1,0
9,3x109
1,0
4,9x109
Klebsiella spp
5,0
1,9x1010
6,0
8,2x109
Peptococcus spp
8,0
1,9x1010
5,0
4,3x109
Pseudomonas aeruginosa
0,0
-
1,0
4,5x109
Staphylococcus epidermidis
2,0
3,3x1010
2,0
1,2x1010
Da mesma forma, quando se analisou o
número de microorganismos por grama de tecido de
acordo com a doença colorretal benigna, a principal
bactéria aeróbia foi a Escherichia coli,
que apresentou uma média de 1,6 x
1010, seguido da Klebsiella spp com
a média de 7,7 x 109. A bactéria anaeróbia,
Bacteroides fragilis, apresentou uma média de 1,2 x
1010, seguido pelo Bacteroides spp
com 9,9 x 109 e pelo Peptococcus
spp com 6,9 x 109. Com relação à análise do
número de microorganismos por grama de tecido de
acordo com a doença neoplásica colorretal maligna,
as principais bactérias aeróbias foram a
Escherichia coli, que apresentou uma média de 2,7 x
1010, seguido pelo Staphylococcus epidermidis
com 2,6 x 1010 e pela Klebsiella spp
com 2,2 x 1010. A bactéria
anaeróbia Bacteroides spp, apresentou uma média de 2,5 x
1010, seguido pelo Peptococcus spp
com 1,8 x 1010 e pelo Bacteroides fragilis
com uma média de 6,8 x 109, conforme a descrição da Tabela-7.
Tabela 7 - Número de microorganismos por grama de tecido de acordo com a doença determinante.
Benigna
Maligna
N Média
N
Média
Bacteroides fragilis
4,0
1,2x1010
6,0
6,8x109
Bacteroides spp
8,0
9,9x109
5,0
2,5x1010
Bifidobacterium spp
1,0
1,6x109
0,0
-
Enterobacter spp
1,0
1,8x1010
5,0
6,2x109
Escherichia coli
18,0
1,6x1010
13,0
2,7x1010
Eubacterium spp
2,0
1,3x109
0,0
-
Fusobacterium spp
2,0
7,1x109
0,0
-
Klebsiella spp
7,0
7,7x109
4,0
2,2x1010
Peptococcus spp
6,0
6,9x109
7,0
1,8x1010
Pseudomonas aeruginosa
1,0
4,5x109
0,0
-
Staphylococcus epidermidis
1,0
3,8x109
3,0
2,6x1010
Analisando-se o número médio de microorganismos por grama de tecido de acordo
com o tempo de permanência da colostomia,
identificou-se como principal bactéria
aeróbia a Escherichia coli, que apresentou no primeiro período a média
de 1,7 x 1010 microorganismos por grama de tecido,
no segundo período 3,0 x 1010, no terceiro período
2,0 x 1010 e no último período 1,6 x
1010 e como anaeróbia o Peptococcus
spp, que apresentou no primeiro período a média de 3,5 x
1010 microorganismos por grama de tecido, no
segundo período 1,0 x 109, no terceiro período 4,9 x
109, e no último período 8,2 x
109; conforme está descrito na Tabela-8.
Tabela 8 - Distribuição do número médio de microorganismos por grama de tecido de acordo com o tempo
de permanência* da colostomia.
Bactéria | N | 1º | N | 2º | N | 3º | N | 4º |
Bacteroides fragilis | 5 | 2,4 x 1010 | 3 | 5,9 x 1010 | 2 | 1,8 x 1010 | 0 | - |
Bacteroides spp | 4 | 1,6 x 1010 | 2 | 6,9 x 1010 | 0 | - | 7 | 1,8 x 1010 |
Escherichia coli | 9 | 1,7 x 1010 | 8 | 3,0 x 1010 | 5 | 2,0 x 1010 | 9 | 1,6 x 1010 |
Enterobacter spp | 1 | 6,6 x 109 | 2 | 9,0 x 109 | 1 | 4,1 x 109 | 2 | 1,0 x 1010 |
Klebsiella spp | 7 | 8,8 x 109 | 2 | 3,5 x 1010 | 2 | 6,2 x 109 | 0 | - |
Peptococcus spp | 3 | 3,5 x 1010 | 1 | 1,0 x 109 | 3 | 4,9 x 109 | 6 | 8,2 x 109 |
*Tempo 1º: da 7,5 a 12 semanas, Tempo 2º: da 12,3 semanas a 16 semanas, Tempo 3º da 16,3 semanas a 20 semanas, Tempo 4º superior a 20 semanas. |
Para estudar a associação qualitativa entre
a presença de cada microorganismo com a
localização da colostomia, a doença determinante da colostomia
e o tempo da sua permanência, utilizaram-se os
testes Exato de Fisher e de Associação linear por
linear. Dentro desta análise, para algumas bactérias, não
foi possível a obtenção do nível descritivo da sua
presença, na colonização da região dérmica. Isto ocorreu
devido ao fato de as bactérias estarem presentes ou em
grande número de culturas, como a Escherichia coli
(31/34 ou 91,2%), ou então, porque foram encontradas
poucas vezes, como o Eubacterium spp (2/34 ou
5,8%), o Fusobacterium spp (2/34 ou 5,8%),
o Bifidobacterium spp (1/34 ou 2,9%) e a
Pseudomonas aeruginosa (1/34 ou 2,9%).
Observou-se que ao se comparar a
presença de cada microorganismo, de acordo com a
localização da colostomia, não houve diferença
estatística significante, entre as espécies identificadas,
conforme demonstrado na Tabela-9.
Tabela 9 - Resultado do estudo da associação entre a presença dos microorganismos e o local da colostomia.
Bactéria | Nível descritivo |
Bacteroides fragilis | 0,999 |
Bacteroides spp | 0,484 |
Bifidobacterium spp | SND |
Enterobacter spp | 0,999 |
Escherichia coli | SND |
Eubacterium spp | SND |
Fusobacterium spp | SND |
Klebsiella spp | 0,999 |
Peptococcus spp | 0,160 |
Pseudomonas aeruginosa | SND |
Staphylococcus epidermidis | 0,999 |
Teste exato de Fisher
*p£ 0,1 |
Os doentes portadores de doença
colorretal maligna apresentaram a
bactéria Enterobacter spp em um número de vezes significativamente maior do
que a encontrada nos doentes portadores de
doença colorretal benigna, conforme demonstrado na
Tabela- 10.
Tabela 10 - Resultado do estudo da associação entre a presença dos microorganismos e o tipo de doença.
Bactéria | Nível descritivo |
Bacteroides fragilis | 0,457 |
Bacteroides spp | 0,497 |
Bifidobacterium spp | SND |
Enterobacter spp | 0,078* |
Escherichia coli | SND |
Eubacterium spp | SND |
Fusobacterium spp | SND |
Klebsiella spp | 0,712 |
Peptococcus spp | 0,725 |
Pseudomonas aeruginosa | SND |
Staphylococcus epidermidis | 0,323 |
Teste exato de Fisher *p£ 0,1 |
Evidenciamos que ocorreu a ausência do Bacteroides fragilis
e da Klebsiella spp , com um aumento do
Peptococcus spp de maneira estatisticamente significante no período superior a 20
semanas, conforme demonstra a Tabela-11.
Tabela 11 - Resultado do estudo da associação
entre a presença dos microorganismos e o tempo
de permanência da colostomia
Bactéria | Nível descritivo |
Bacteroides fragilis | 0,021* |
Bacteroides spp | 0,214 |
Bifidobacterium spp | SND |
Enterobacter spp | 0,615 |
Escherichia coli | SND |
Eubacterium spp | SND |
Fusobacterium spp | SND |
Klebsiella spp | 0,003* |
Peptococcus spp | 0,068* |
Pseudomonas aeruginosa | SND |
Staphylococcus epidermidis | 0,918 |
Teste da Associação linear por linear
*p£ 0,1 |
DISCUSSÃO
Inúmeros fatores podem estar envolvidos
na gênese da colonização bacteriana peri-colostômica,
a qual é facilitada pelo contato permanente da
região cutânea local com o conteúdo entérico. Os
modernos dispositivos de coleta do material fecal são
colocados de modo a permanecerem ajustados à transição
entero-cutânea, com a intenção de minimizar as
complicações desenvolvidas na pele peri-colostômica. Neste
estudo, optou-se por uma área localizada junto à borda
inferior da colostomia, admitindo-se que nesse local ocorra
um permanente contato do conteúdo entérico com o
tecido cutâneo.
O material era coletado antes da
administração de antibióticos e após a anti-sepsia da pele, pois
o emprego de antibióticos pode alterar o resultado
do exame bacteriológico, por inibição ou destruição
de bactérias infectantes, da mesma forma quando
se emprega o anti-séptico tópico, que atua somente
na flora bacteriana da superfície cutânea
15. Utilizou-se, o Polivinilpirrolidona-Iodo e Lauril Éter Sulfato de
Sódio a 10%, na antissepsia da região peri-colostômica,
por um tempo superior a cinco minutos, admitindo que
a exposição a este produto e pelo tempo
programado, resultaria na esterilização da flora
bacteriana superficial, sem interferir na profundidade do
tecido cutâneo. A lavagem cutânea com
Polivinilpirrolidona-Iodo e Lauril Éter Sulfato de Sódio a 10%, por
um tempo compreendido entre dois e dez minutos, determina uma redução superior a 96% na
flora bacteriana superficial 16,17, conseguindo-se,
também, uma redução do número de colônias acima de
90%, com um efeito residual de duas horas, quando se
realiza a aplicação do iodo-povidine pelo tempo mínimo
de cinco minutos 18. A flora bacteriana colônica
também se mostra sensível à ação degermante do
iodo-povidine a 10%, com a realização de enemas
19 , ou como foi demonstrado, na limpeza mecânica intra-operatória
do cólon, obtendo-se uma redução significativa
do crescimento bacteriano em culturas, analisadas
após 24 horas de incubação
20.
Foi demonstrado que, tanto no íleo
terminal, como no cólon, existem mais de 400 espécies
diferentes de bactérias, com uma concentração aproximada
de 1012 bactérias por grama de fezes secas
correspondendo a cerca de 10% a 60% da massa fecal e com
uma proporção de bactérias anaeróbias até mil
vezes superior às bactérias aeróbias
21,22. Dentre as bactérias somente 5% a 10% são coliformes ou outras
bactérias facultativas, e as anaeróbias restritas estão
presentes em 90% a 95% das vezes 23. As bactérias aeróbias
mais freqüentes são: Escherichia
coli, Klebsiella, Proteus,
Enterobacter e Enterococcus, e, dentre as
anaeróbias, encontramos o
Bacteroides fragilis, o
Peptostreptococcus e o Clostridium
22,24,25,26.
As bactérias entéricas Escherichia
coli, Bacteroides spp, Peptococcus
spp e Klebsiella spp foram consideradas as mais freqüentes, devido ao
fato de terem sido identificadas em um número elevado
de vezes, dentro da análise proposta. Isto não
significa que outras bactérias não tenham se desenvolvido
nas amostras do material coletado, pois elas ocorreram
com uma freqüência significantemente inferior às
primeiras. Na região dérmica peri-colostômica
da transversostomia, assim como, na sigmoidostomia
a Escherichia coli e o Bacteroides
fragilis, foram as bactérias entéricas identificadas quantitativamente
com o maior número de microorganismos por grama
de tecido. Quando foi analisada a presença do número
de microorganismos por grama de tecido de acordo
com o tipo de doença determinante, não se
encontrou diferença entre as bactérias entéricas na
doença colorretal benigna e maligna que foram
representadas pela Escherichia coli, Bacteroides
fragilis e Bacteroides spp.
A influência do tempo de permanência
da colostomia sobre as bactérias presentes na derme
da região peri-colostômica, ficou evidente no
segundo período (12 a 16 semanas), quando foram
observados valores elevados de microorganismos por grama
de tecido, em relação aos demais períodos. Após
esse período, ocorreu uma redução dos valores médios
de microorganismo por grama de tecido, em cerca de
2,5 vezes.
Dessa forma, considerando-se a freqüência
das culturas e do número de microorganismos por
grama de tecido, as bactérias mais freqüentes foram
a Escherichia coli, o Bacteroides
fragilis, Bacteroides spp e o Peptococcus
spp, o que já era esperado, por se tratar das bactérias mais freqüentemente
encontradas nas culturas do material fecal; uma vez
admitindo-se que nelas está a principal origem das bactérias para
a colonização da derme peri-colostômica
22,24,25,26.
Foram isoladas outras bactérias, com
menor freqüência, tais como o Bifidobacterium
spp, o Staphylococcus epidermidis, o
Eubacterium spp, o Fusobacterium spp
e a Pseudomonas aeruginosa, cujo percentual não foi suficiente para uma análise
estatística ou mesmo para o cálculo aritmético adequado.
CONCLUSÕES
- a camada dérmica da parede abdominal,
na região peri-colostômica é colonizada por
bactérias entéricas, com um número de microorganismos
por grama de tecido capaz de causar infecção local;
- dentre as bactérias aeróbias a
Escherichia coli foi identificada com maior freqüência, assim
como apresenta o mais elevado número de
microorganismos por grama de tecido;
- das bactérias anaeróbias, o Peptococcus
spp e o Bacteroides spp foram identificados com
maior freqüência, enquanto o Bacteroides
fragilis apresentou maior número de microorganismos por grama
de tecido;
- a bactéria Enterobacter spp ocorreu em
maior freqüência na doença neoplásica colorretal maligna
em relação à doença benigna colorretal e dentre as
outras bactérias;
- a concentração máxima de
microorganismos por grama de tecido ocorreu no período
compreendido entre a 12? semana e a
16? semana, apresentando uma redução do número de microorganismos após
este intervalo.
Após a 20ªsemana de colostomia,
o Bacteroides fragilis e a Klebsiella spp
não foram mais observados, enquanto houve um aumento do
número de culturas do Peptococcus
spp.
SUMMARY: AIMS: Identifying the alterations occurred in the bacteriology of the dermic layer of the abdominal wall in patients who underwent a colostomy through the qualitative and quantitative determination of the pericolostomic flora. METHODS: 19 cases have been carried out in the sigmoid colon (55.9%) and fifteen cases (44.1%) in the transversal colon. As for the age range, we have observed that the average age was 51.6 years. All patients have been colostomized for more than seven weeks. RESULTS: The most found aerobic bacterium was the Escherichia coli. Among the anaerobic bacteria, the most frequent one was the Bacteroides spp (44.5%), in the benign colorectal condition, and the Peptococcus spp (43.7%) in the malign colorectal neoplasic condition. In the study of the association made between the presence of microorganism and the kind of medical condition, the Enterobacter spp bacterium had a higher incidence in the malign colorectal condition. In the study of the association made between the presence of microorganism and the time of colostomy, the Bacteroides fragilis and Klebsiella spp bacteria presented a statically significant reduction in their incidence, whereas the Peptococcus spp presented a significant increase the longer the colostomy had been carried out. The quantitative study showed variable rates in the number of colonies and microorganisms per gram of tissue, which is compatible with the qualitative analysis. CONCLUSIONS: There is an alteration in the bacterial flora in the dermic area at the pericolostomic region, as a result from the colonization of this area by bacteria present in the intestinal matter.
Key words: Colostomy, Complications, Bacteriology, Infection.
Trabalho realizado no no Programa de Pós-graduação em GastroenterologiaCirúrgica, da Universidade Federal de São Paulo _ Escola Paulista de Medicina.Departamento de Medicina da Universidade de Taubaté - São Paulo
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Endereço para correspondência:
Valdemir José Alegre Salles
Rua José Bonani, 199 -.Bairro: Independência
12.031-260 - Taubaté (SP)
E-mail: valiris@horizon.com.br
Recebido em 26/10/2004
Aceito para publicação em 13/01/2005