ARTIGOS ORIGINAIS
RENATO KANTO - TSBCP
DJALMA JOSÉ FAGUNDES
KANTO R, FAGUNDES DJ. Estudo Morfológico Comparativo de Anastomoses Colônicas por Invaginação Versus em Plano Único
Extra-Mucoso, em Cães. Rev bras
Coloproct, 2005;25(1):51-59.
RESUMO: Objetivos: Estudar aspectos morfológicos de anastomoses colônicas por uma variante técnica de invaginação. Métodos: Foram utilizados 28 cães mestiços, do sexo masculino, com peso médio de 12,3kg, separados em dois grupos iguais: grupo I com anastomose em plano único extramucoso, grupo II com anastomose por invaginação. Cada grupo foi subdividido em dois subgrupos iguais, A e B, e para cada um deles foi estabelecido um período de observação pós-operatória de 7 e 21 dias, respectivamente. Os animais foram submetidos à secção completa do intestino grosso, de 7 a 10cm da reflexão peritoneal, e a reconstrução do trânsito foi feita com fio de poligalactina 910 3-0 em um plano único extra-mucoso, mas nos animais do grupo II foi invaginado, previamente, o segmento de cólon de 3cm com a seromiotomia circunferencial proximal. Foram obtidos dados dos aspectos macroscópicos e calculado o índice de estenose. As particularidades histológicas avaliadas foram: a presença de infiltrado inflamatório, fibrose reparativa, neoformação vascular e integridade das túnicas. A cada característica macro e microscópica foi atribuída uma pontuação, resultando em um escore de medida quantitativa da anastomose. Resultados: Não houve óbitos. Apenas um animal do grupo II apresentou deiscência parcial da anastomose, todavia sem significância estatística ou repercussões clínicas. A cicatrização das anastomoses, quando avaliada pelos critérios escolhidos, mostrou comportamento análogo entre os grupos estudados. Conclusões: Os resultados indicam que ambas as técnicas de anastomose foram eficazes e semelhantes.
Unitermos:Anastomose cirúrgica; Cães; Cólon; Cirurgia colorretal.
Introdução
As deiscências e fístulas nas
anastomoses colorretais permanecem, até os dias de hoje, como
um desafio para os cirurgiões. Segundo diversos
autores, as complicações ocorrem em 0,1% a 30% das
anastomoses, triplicando a mortalidade e
aumentando consideravelmente a morbidez dos pacientes
submetidos a anastomoses do cólon 1, 2, 3
.
O desafio em desenvolver técnicas
seguras de anastomoses não é exclusiva dos tempos
modernos, pois, ao longo dos séculos, tem havido uma
tendência crescente em aprimorar os procedimentos
cirúrgicos. De acordo com Da Costa e
Lipshutz4, até 1931, mais de 250 diferentes técnicas de anastomoses
intestinais tinham sido descritas.
Na prática cirúrgica, alguns princípios
básicos, aliados ao conhecimento do metabolismo do
colágeno, componente estrutural fundamental das
cicatrizações5, já ficaram bem consagrados para nortear a
confecção das anastomoses: boa vascularização, ausência
de tensão, ampla perviedade da luz intestinal e
coaptação hermética das
bordas2,5,6. Halsted7 foi o primeiro
a enfatizar a importância da camada submucosa
na cicatrização das anastomoses. Pesquisas
experimentais mostraram que o período crítico da consolidação
das anastomoses do cólon situa-se entre o 3º e 5º dia
de pós-operatório (PO), ocasião em que a aposição
das bordas é mantida apenas pelas
suturas5.
Outros fatores relevantes devem ser considerados ao lembrarmos que Irvin e
Goligher8 , estudando retrospectivamente 204
pacientes, submetidos a anastomoses intestinais, associaram
a pobre limpeza do cólon ao aumento da incidência
das deiscências. Ravo et al.9 ,operando
experimentalmente 64 cães, concluíram que, evitando-se o contato
do conteúdo fecal e secreções digestivas com a zona
da anastomose, reduzia-se notadamente a incidência
de deiscência.
Freqüentemente, na intenção de derivar
o trânsito e evitar a passagem do conteúdo
intestinal através do local anastomótico, aproveitam-se
os cirurgiões das colostomias de proteção. Entretanto,
ao ensejarem um segundo procedimento cirúrgico
para reconstituição da integridade funcional do
órgão, ocasionam um percentual razoável de morbidez
e mortalidade, respectivamente na faixa de 0.5% a
57% e 0% a 34%9. Blomquist et
al.10 demonstraram experimentalmente os efeitos adversos das
colostomias proximais na cicatrização das anastomoses
distais, conseqüente à atrofia do cólon desfuncionalizado.
Procedimentos alternativos, com o intuito
de minimizar o contato do conteúdo intestinal com
as superfícies de cicatrização, foram elaborados.
Oliveira4 refere que Ramdohr, em 1730, parece ter sido
o primeiro a sugerir uma anastomose por
invaginação, em que o segmento invaginado
desaparecia espontaneamente, permitindo o trânsito e
protegendo a anastomose. Consta que o primeiro
estudo experimental de anastomose ileocólica por
invaginação foi de
Glassman11, no ano de 1942. Outras técnicas
e pesquisas, desencadeadas pela idéia de
invaginação, foram implementadas no sentido de comprovar
a eficácia e segurança do método.
Nigro12 obteve bons resultados ao efetuar anastomoses jejunais
por invaginação, em cães, através do acoplamento
da submucosa-mucosa cranial na seromuscular
caudal, suturada com apenas dois pontos.
As seromiotomias intestinais
circunferenciais foram experimentadas por Stacchini et
al.13, com a finalidade de retardar o trânsito intestinal em
cães, submetidos a extensas ressecções intestinais.
Nesse estudo, os autores classificaram as seromiotomias
em parciais e totais, descrevendo seus efeitos com
a formação de válvulas mucosas e esfíncteres.
Silva Junior et al.14 , realizando seromiotomia
circunferencial dupla e sutura seromuscular no cólon descendente
de ratos, observaram a constituição de um anel fibroso
e elevação da mucosa em direção à luz intestinal.
Portanto, por tratar-se de assunto tão
relevante e controverso, e que, apesar do avanço
tecnológico, continua alvo de disputas para a descoberta da
melhor solução, propusemos, agregando-se os preceitos
da seromiotomia, estudo em cães com um novo tipo
de anastomose por telescopagem do cólon, de fácil
e rápida execução.
MÉTODOS
O presente trabalho foi aprovado pelo
Comitê de Ética da Universidade Federal de São
Paulo-Escola Paulista de Medicina e ratificada a aprovação
pela Comissão de Ética do Hospital Naval Marcílio Dias.
Foram utilizados 28 cães
mestiços(Canis familiaris), machos, distribuídos aleatoriamente em
2 grupos de 14 cães: grupo I (Controle) e grupo
II (Experimento). Ambos os grupos foram divididos
em 2 subgrupos de 7 animais, de acordo com o
período pós-operatório observado: A - animais reoperados
no 7º dia; B - animais reoperados no 21º dia.
Os cães permaneceram em jejum nas 24
horas que precederam a operação, Quarenta minutos
antes da operação, os animais receberam por
injeção intramuscular 0,125 miligramas (mg) de atropina
e 50mg de 2-(o-clorofenil)-2-(metilamino)
hidrocloreto de ciclohexanona (hidrocloreto de cetamina)
como medicação pré-anestésica. Os animais de ambos
os grupos foram anestesiados com a administração
de tiopental sódico, por via endovenosa, na dose de
10 miligramas por quilograma (mg/kg) de peso. A
seguir, procedeu-se à intubação endotraqueal com tubo
7 French, mantendo-se ventilação assistida e
inalação, por meio de vaporizador universal calibrado, de
2-cloro-1,1,2-trifluoroetil difluorometil éter a
2%. Infundiu-se continuamente solução salina de
cloreto de sódio a 0,9% na dosagem de
20ml.kg por hora.
Ao se iniciar a operação, foi realizada
a aplicação, por via endovenosa, de um grama
de succinato de cloranfenicol como antibiótico
profilático. Praticou-se uma laparotomia longitudinal, mediana,
de 06 centímetros de extensão a partir do osso púbico.
O acesso à cavidade abdominal deu-se após
secção longitudinal do peritônio com tesoura,
exteriorizando-se o cólon distal através da ferida
operatória, escolhendo-se o local da anastomose, que se
situou entre 7 a 10 cm da reflexão peritoneal do reto,
após simples secção do cólon.
Cada cão foi submetido a uma das
duas anastomoses: uma denominada experimento, e a
outra, controle. A anastomose controle foi confeccionada,
em plano único, por meio de dez pontos
separados seromusculares, de fio de poliglactina 910 nº 3-0
em agulha cilíndrica de 2,5cm. A técnica da
anastomose experimento consistiu na ligadura dos vasos de
um segmento de 3cm do cólon, cranialmente ao
sítio escolhido para secção. Neste segmento desprovido
de vascularização, foi efetuada uma
seromiotomia circunferencial, na sua extremidade proximal. Os
vasos expostos da submucosa foram fulgurados com
bisturi elétrico bipolar (Figura-1). Posteriormente, o cólon
foi seccionado no local previamente escolhido, na transição distal entre o cólon sem vascularização e
o vascularizado, utilizando-se bisturi elétrico unipolar.
Figura 1 - Seromiotomia, com a submucosa exposta em faixa circular, após eletrofulguração dos vasos. |
Procedeu-se, a seguir, à aproximação da
parede posterior do cólon distal a ser anastomosado, à
parede posterior do cólon proximal, superiormente à
área cruenta da seromiotomia, através da aplicação de
três pontos separados seromusculares de poliglactina
910. Completada esta etapa, o segmento de cólon
desvascularizado foi invaginado no interior do cólon
distal (Figura-2), permitindo a finalização da anastomose
com a passagem de mais sete pontos separados
seromusculares entre a borda superior da área cruenta
da seromiotomia e o cólon distal. A aponeurose e
o peritônio foram fechados com pontos separados de
fio de polipropileno 2-0 e a síntese da pele efetuou-se
com pontos separados de fio monofilamentar de náilon
4-0. Após o fechamento, foi efetuada a aplicação,
por via intramuscular, de 40mg de cloridrato de oxitetraciclina como antibiótico de longa duração.
Figura 2 - Telescopagem do segmento desvascularizado (F) na luz do coto distal (D). Observa-se a área de seromiotomia (seta), o cólon proximal (P) e o primeiro ponto de referência (R). |
Terminado o procedimento e através de
simples sorteio, o animal foi designado para um dos
subgrupos de observação, A _ reoperado no 7º dia ou B _
reoperado no 21º dia de pós-operatório. Os animais tiveram
livre acesso a água logo após o ato operatório, a dieta
líquida (leite) a partir do 1º dia pós-operatório e a ração
própria para a espécie a partir do 2º dia pós-operatório.
Na reoperação, foi feita observação
macroscópica das condições da cicatriz cutânea, com
o objetivo de identificar anormalidades como
abaulamento, secreções e deiscência da ferida. Anotou-se
a presença e características das aderências ao nível
da anastomose, atribuindo-lhes a seguinte
classificação: tipo I _ 01 ponto, as que se descolavam
facilmente; tipo II _ 02 pontos, quando havia necessidade
de dissecção para serem descoladas; tipo III _ 03
pontos, havia necessidade de seccioná-las para
serem descoladas. Foi registrada a ocorrência de
abscesso, fístula e peritonite. Posteriormente, o colo foi
isolado em toda a circunferência e em uma extensão
cranio-caudal de 3cm do sítio da anastomose, praticando-se
a excisão deste segmento.
Para analisar-se o índice de estenose,
recorreu-se à seguinte
fórmula15, com medidas em cm:
[{1-2A/B+C} X 100] em que A = extensão transversal
da anastomose; B = extensão transversal distante
2cm cranialmente à anastomose; C = extensão
transversal distante 2cm caudalmente à anastomose. O índice
de estenose zero corresponde à ausência de estenose e
o índice 100 é indicativo de estenose total.
A peça cirúrgica aberta permitiu a
observação da coaptação das bordas e ocorrência de
sinais inflamatórios. Para avaliação da coaptação das
bordas das anastomoses foram utilizados os seguintes
critérios: Nota zero: coaptada _ quando havia aposição
frontal das bordas da serosa ou da mucosa; nota um:
coaptação irregular; nota dois: deiscência bloqueada; nota
três: deiscência desbloqueada . Para avaliação dos
sinais inflamatórios utilizaram-se os seguintes critérios:
nota zero: ausência de sinais inflamatórios visíveis; nota
um - presença de edema; nota dois - presença de
hematoma; nota três - presença de necrose das
bordas anastomosadas da parede intestinal ou abscessos.
Foi observada, também, a presença ou ausência de
vestígios do coto invaginado.
Para estudo histológico, o material
foi processado e incluído em parafina, sendo efetuados
dois cortes de tal maneira que incluíssem todas as
camadas da parede colônica de ambos os lados da
anastomose, obtendo-se quatro fragmentos que foram corados
pelas técnicas de hematoxilina-eosina e Gomory.
Os seguintes parâmetros foram avaliados: A _
integridade das camadas; B _ Infiltrado inflamatório; C _
fibrose reparativa; D _ neoformação vascular. Por meio de
uma avaliação quantitativa realizada independentemente
por dois patologistas, e considerando-se apenas os
piores resultados quando discordantes, o parâmetro A
foi avaliado e pontuado de 0 a 4, conforme a ausência
ou presença de solução de continuidade de cada uma
das camadas, ou seja , nota 0 com integridade de todas
as camadas e nota 4 com solução de continuidade de
todas as camadas, os demais parâmetros foram
graduados de zero a três, dependendo do grau de
acometimento de cada ítem.
Para efeito de análise estatística, a soma
dos valores obtidos nas avaliações macroscópica
e histológica foram agrupados para obter-se um
escore único da anastomose, tanto da parede anterior
quanto da parede posterior, em que a menor nota,
zero, correspondia a uma anastomose adequada, e, a
maior, vinte e dois, anastomose com pior resultado.
Foram aplicados os seguintes testes: análise
de variância para grupos independentes, com a
finalidade de comparar o peso dos animais antes de
qualquer intervenção com o objetivo de mostrar a
homogeneidade entre os animais dos diferentes grupos;
teste de Mann-Whitney para comparar os resultados do
7° dia de pós-operatório com o 21° dia de
pós-operatório (PO) em cada grupo e comparar os dois grupos
em cada tempo do experimento; teste exato de Fisher
para comparar a presença ou ausência dos sinais
estudados entre os dias de estudo para cada grupo e comparar
os grupos em cada tempo. Fixou-se em 0,05 ou 5% (á =
0,05) o nível de rejeição da hipótese de
nulidade, assinalando-se com um asterisco os
valores significantes.
RESULTADOS
Não houve diferença significante entre
os pesos iniciais dos animais quando foram
comparados os gupos I e II, tanto no subgrupo A quanto no
B (Tabela- 1).
Tabela 1 - Cães dos grupos I ( Controle ) e II ( Experimento ) , segundo o peso no pré
- operatório imediato.
I | II | |||
7 | 21 | 7 | 21 | |
11,6 | 12,5 | 10,0 | 14,0 | |
11,2 | 11,6 | 14,0 | 10,6 | |
1,0 | 11,2 | 11,0 | 13,0 | |
10,3 | 14,3 | 12,0 | 14,0 | |
15,0 | 13,3 | 13,5 | 12,5 | |
11,6 | 12,7 | 13,0 | 11,0 | |
13,5 | 12,2 | 11,5 | 12,7 | |
Média | 12,03 | 12,54 | 12,14 | 12,54 |
Desvio Padrão | 1,6 | 1,0 | 1,4 | 1,3 |
Análise de Variância F calculado = 0,26 F crítico = 3,01 |
Em um cão do grupo II, no 7° dia
pós-operatório (PO) , foi constatada a presença
de deiscência parcial e não coaptação das bordas,
não havendo extravasamento do conteúdo intestinal para
a cavidade e sem significância estatística .
Duas deiscências da ferida cirúrgica do
grupo controle foram encontradas no 7° PO contra
nenhuma do grupo experimento, não tendo sido
significantes quando comparadas. Ao 21° PO nenhuma
deiscência foi averiguada em ambos os grupos,
dispensando análise. Apurou-se, ainda, a presença, no 7° PO,
de abaulamento da ferida operatória em 4 cães de
ambos os grupos, enquanto que no 21° PO foi
evidenciado abaulamento em 2 cães do grupo I e um cão do
grupo II. Verificou-se a presença de secreção em apenas
um cão de cada grupo no 21° PO, enquanto que 3 cães
do grupo I e quatro cães do grupo II apresentavam
secreção aos 7 dias de observação. Estes resultados,
quando comparados, não revelaram significância estatística.
O cálculo dos índices de estenose dos
animais de cada grupo, em seus diferentes períodos de PO,
não mostraram diferenças significativas. O mesmo
ocorreu quando foram comparados os animais dos
diferentes grupos entre si, nos diferentes tempos de observação.
Não houve diferença
estatisticamente significante quando se comparou a presença ou
ausência de vestígio do segmento invaginado, tanto no 7°
como no 21° PO do grupo II, apesar de ter-se notado que,
na maioria dos cães , não encontrava-se qualquer
vestígio do segmento invaginado no 21° PO (Figura 3).
Figura 3 - Foto da anastomose colônica por invaginação observada nas peça operatória aberta e vista pela face interna (mucosa) do cão número 5 (Grupo IIB). Percebe-se vestígio do cólon invaginado, tipo formação polipóide (seta), com integridade da mucosa. |
Os aspectos histológicos observados
permitiram constatar-se a regeneração completa da túnica
serosa em quase todos os cães, exceto em um animal do
grupo II, que apresentou deiscência, no período de 7 dias
de observação, não havendo significância estatística,
e dispensando análise para os demais resultados.
Ao se comparar, na parede anterior, a integridade da túnica muscular do grupo I nos
diferentes tempos de PO, constatou-se uma pior coaptação
desta camada no 7° PO, alcançando significância
estatística. Em contraste com os outros resultados que, embora
no grupo II apresentassem aos 7 dias um percentual
maior de não coaptação, não diferiram
significantemente entre si, nem mesmo quando considerados ambos
os grupos. Não houve significância estatística, na
parede posterior, quando comparados os diferentes
grupos entre si, nos diferentes dias de observação.
Houve significância estatística
quando avaliaram os valores dos escores, tanto na
parede anterior quanto na parede posterior, do grupo I
nos diferentes tempos de avaliação, observando-se
escore mais elevado aos 7 dias de observação (Tabela-2).
Tabela 2 - Cães dos grupos I ( Controle ) e II ( Experimento ) conforme o escore das anastomoses na
parede anterior, observado no 7o ou
21o PO.
I | II | |||
7o | 21o | 7o | 21o | |
8 | 7 | 10 | 6 | |
10 | 5 | 18 | 10 | |
7 | 6 | 10 | 7 | |
10 | 6 | 9 | 9 | |
9 | 6 | 8 | 6 | |
9 | 9 | 6 | 7 | |
10 | 5 | 9 | 5 | |
Média | 9,0 | 7,1 | 9,0 | 10,0 |
Teste de Mann - Whitney |
||||
I | II | |||
U calculado = 3,5 * | U calculado = 11 | |||
7o > 21o dia | ||||
2o ( Grupo I x II )
U crítico = 8 |
||||
7o dia | 21o dia | |||
U calculado = 23,5 | U calculado = 16,5 |
DISCUSSÃO
Em toda literatura averiguada não foi
encontrado estudo experimental que agregasse a prática
da invaginação e da seromiotomia dupla proximal.
Nigro12 efetuou, no jejuno de cães, anastomoses
por acoplamento da submucosa-mucosa cranial na seromuscular caudal.
Lucchesi16 utilizou a mesma técnica para anastomoses ileocólicas, em cães.
Linn et al.17 resseccionavam, apenas, a mucosa do coto
distal invaginante. Cataliotti et al.18 realizaram o
experimento de invaginação total no cólon de coelhos. Burson
et al.19 experimentaram, em cães, anastosmoses
colônicas por invaginação em que a porção invaginada
fora desprovida da mucosa em uma extensão de 1,5cm.
Os cães não receberam preparo mecânico
do cólon a fim de submeter as anastomoses a
situações adversas para testá-las na presença de uma carga
fecal normal do cólon e verificar as possíveis
consequências ao nível da linha de sutura. Antibióticos
profiláticos de longa duração, com espectro de ação
antibacteriana distintas, foram administrados, durante a
indução anestésica e logo após a operação, face ao potencial
de contaminação do procedimento tanto por
bactérias aeróbicas como anaeróbicas.
Optou-se pela técnica da anastomose em
plano único extramucoso, com pontos separados,
como padrão , pois já se estabeleceu, em vários
trabalhos clínicos e experimentais , tratar-se de uma
variante eficaz e segura2,6 .
Os animais do grupo I serviram como controle, porque a anastomose em plano único extramucoso
tem quase todos os tempos operatórios semelhantes
aos praticados nos cães do grupo II, experimento,
exceto que neste último foi acrescentado a invaginação de
um segmento de cólon de apenas 3cm, com
seromiotomia proximal, mantido em continuidade com o
segmento cranial. No grupo II, experimento, foi utilizado
a técnica de invaginação com seromiotomia
proximal, aliada à aproximação seromuscular semelhante
ao grupo I, fundamentado no princípio que um
segmento tubular de colo cranial propiciaria uma proteção
da linha da anastomose, recobrindo-a e bloqueando
o contato das fezes, facilitando o processo de cicatrização e evitando, na hipótese de ocorrência
de deiscência parcial, o extravasamento do
conteúdo intestinal3, 5, 9.
Ao contrário das técnicas de
seromiotomia mencionadas13,14, incorporou-se a
seromiotomia circunferencial dupla proximal, sem
aproximação, acompanhada de coagulação bipolar dos vasos
visíveis da submucosa, ao princípio técnico da
invaginação, com o propósito de acarretar uma eliminação
ou regressão, por necrose, do segmento
invaginado, oportunamente desvascularizado, perdurando o
tempo necessário para proteção da linha de sutura
da anastomose.
Lucchesi16 julgou que os 7 e 14 dias
de observação foram insuficientes para certificar-se
da coaptação completa das camadas da parede
intestinal nas anastomoses colo-cólicas por invaginação, em
cães, acreditando que a união completa das camadas
poderia ter ocorrido em um período mais prolongado. Linn
et al.20 estabeleceram como dia de observação o 28°
PO, supondo ser este o tempo necessário para
analisarem criticamente a cicatrização das anastomoses
por invaginação em cães. Os resultados revelaram que
um tempo maior de observação, além dos 21
dias estabelecidos nesta pesquisa, teria sido necessário
para uma avaliação mais adequada da regeneração
tecidual das túnicas, principalmente a muscular, e da
regressão do segmento deliberadamente invaginado,
cuja persistência, além dos 21 dias, pode ser atribuída
a uma vascularização intramural residual.
É possível que não tenha havido
extravasamento pela brecha da deiscência parcial,
ocorrida na anastomose experimento, devido ao fator
mecânico exercido pela presença do segmento invaginado,
que atuou como selo protetor.
Atribuem-se os achados de abaulamento, deiscência e secreção da parede abdominal à falta
de preparo do cólon, pois trata-se de cirugia
contaminada com grande potencial de infecção bacteriana,
embora não tenha havido diferenças estatisticamente
significantes entre os grupos e os seus respectivos
períodos de observação.
O maior índice de estenose observado foi
de 13% em um cão do grupo I, no 7° PO. Valor
aceitável quando pondera-se que o índice de estenose
pode alcançar o limite de 100%, ou estenose total. Não
foram encontrados, na literatura, trabalhos que
avaliassem anastomoses colônicas por invaginação com o
índice de estenose utilizado neste experimento.
Os resultados de integridade da túnica
serosa provavelmente decorreram do perfeito
afrontamento das margens livres da camada serosa, dos
distintos segmentos, pela técnica de aproximação
seromuscular, aplicada em ambos os grupos.
McCaughan21, Matsumoto et
al.22, Linn et al.20, Prasad et
al.23 , Rudge Ramos et al.24 e
Man25 verificaram que a túnica
serosa coapta rapidamente nas anastomoses por
invaginação, garantindo a anastomose através da vedação
do contorno externo.
Para uma avaliação mais abrangente
e adequada das anastomoses, foi elaborado um
escore, resultante da soma dos valores dos critérios
apreciados do ponto de vista macro e microscópico, com o
intuito de realizar-se uma quantificação que refletisse o
estágio de cicatrização das anastomoses e graduado de
zero, exprimindo uma anastomose perfeita, a vinte e
dois, traduzindo uma anastomose totalmente inadequada.
Os escores obtidos permitiram inferir que, nos
sete primeiros dias do PO, em que a intensidade do
processo inflamatório é crescente e a anastomose não
está consolidada, o segmento invaginado,
provavelmente por recobrir a linha de sutura, protege-a de
fatores adversos da cicatrização, como o contato com
o conteúdo fecal e permeabilidade à invasão
bacteriana, permitindo uma cicatrização mais uniforme
e homogênea ao longo do tempo.
Elaborou-se um novo procedimento de anastomose por invaginação em que a
confrontação das camadas seromusculares de ambos os
segmentos somadas à aposição, ao nível da linha de
anastomose, apenas das camadas mucosa-submucosa do
segmento invaginado seriam suficientes para manutenção
da integridade, insentando-se de submeter o colo a
um processo de manipulação mais intenso,
demorado, traumatizante e trabalhoso ao exigir-se o
descolamento de qualquer uma das túnicas de sua parede. A falta
de preparo mecânico do cólon parece não ter
influenciado a cicatrização das anastomoses em ambos os
grupos, ressaltando assinalar, todavia, que a todos os cães
foram administrados dois antibióticos, de amplo espectro,
em dosagem única.
No único caso observado de deiscência
parcial da anastomose, que acometeu um cão do
grupo experimento no 7° PO, concluiu-se que o segmento
do colo invaginado evitou o extravasamento do
conteúdo intestinal e a formação de fístula, pois apenas
a aderência de epíplon não teria sido suficiente para
selar a brecha. É possível que a deiscência poderia
ter culminado em fístula se tivesse ocorrido no
grupo controle.
Diante dos resultados coletados, pode-se admitir que a anastomose colônica
término-terminal por invaginação é procedimento seguro e eficaz
porque, no período de observação pós-operatório
estabelecido, não houve óbito e os cães não apresentaram
fístulas ou estenoses significativas.
Contudo, a anastomose por invaginação
não se mostrou superior quando comparada à
anastomose em plano único extramucoso, pois a cicatrização
de ambas foi semelhante quando avaliados todos os
dados em conjunto. A variante técnica proposta é uma
opção tática a ser considerada. Apesar de não
mostrar-se superior, a técnica padrão é uma opção viável e,
se melhor estudada, poderá tornar-se uma alternativa
em cirurgias com ausência ou mau preparo mecânico
dos colons.
CONCLUSÃO
A variante técnica de anastomose
colo-cólica por invaginação não mostrou resultados, do ponto
de vista morfológico, superior a anastomose em
plano único extramucoso.
SUMMARY: Background: Anastomotic dehiscences and fistulas of the colon are still dreadful in current surgical practice. Several techniques were developed to deal with this problem, including the method of invagination. The aim of this study was to compare colonic invaginating anastomoses with one-layer extramucosal anastomoses. Methods: 28 male mongrel dogs, weighing an average 12.3kg, were evenly divided into two groups: group I - extramucosal single-layer anastomoses and group II - invaginating anastomoses. These two groups were further separated in group A, 7 days, and group B, 21 days, dependent upon the time of post-operative observation. All animals underwent section of the left colon, 7 to 10cm from the peritoneal reflection, followed by anastomoses with interrupted extramucosal single-layer sutures, using polyglactin 910 3-0, combined with an intussuscepted segment of 3cm of colon, stripped of its blood supply plus a circunferential through and through myotomy to its proximal limit, in group II animals. The macroscopic features analysed were: existence of bulging, dehiscence or secretion of the surgical wound, evidence of degree of inflammation and adhesions, ocurrence of anastomotic dehiscence and measurement of stenotic index. The microscopic interpretation comprised: inflammatory infiltrate, fibrosis, vascular neoformation and integrity of the structural layers of the colon. A score was devised based on the magnitude and sum of macroscopic and microscopic characteristics in order to measure quantitatively the anastomoses. Results: All animals survived and no fistulas occurred. Only one of the animals of group II presented with a partial dehiscence of the anastomosis. No difference was found among all other parameters. Conclusions: Outcome was the same, independent of the procedure employed for rejoining the divided colon.
Key words: Surgical anastomosis; Dogs; Colon; Colorectal surgery
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Endereço para correspondência:
Renato Kanto
Rua General Sidônio Dias Corrêa, 45/102 - Barra da Tijuca.
22.621-070 - Rio de Janeiro (RJ)
Fone: (21) 2491-5172
E-mail: rekanto@ig.com.br
Trabalho realizado no Instituto de Pesquisas Biomédicas do Hospital Naval Marcílio Dias _ Rio de Janeiro (R.J.)
Recebido em 15/03/2005
Aceito para publicação em 30/03/2005