RELATO DE CASO
OXIGENOTERAPIA HIPERBÁRICA NO TRATAMENTO DE DERMATITE PERIESTOMAL EXTENSA: RELATO DE CASO
1Ricardo Peixoto Claudino da Silva, 1Paulo César Daguano Antoniazzi, 1Rodrigo Ribeiro Aprilli, 1Carlos Renato dos Reis Lemos, 1Pedro Popoutchi, 1José Joaquim Ribeiro da Rocha, 1Omar Feres
1Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil
RESUMO: Os autores apresentam o caso de uma paciente idosa, submetida a colectomia segmentar em regime de urgência, que evoluiu no período pós-operatório com uma dermatite periestomal severa, infecção associada de partes moles e extensa necrose da parede abdominal. O quadro culminou com repercussões sistêmicas, inclusive sepse grave. O quadro só foi satisfatoriamente controlado após a realização da oxigenoterapia hiperbárica (OHB), instrumento terapêutico que se tem mostrado cada vez mais útil no tratamento de feridas de difícil manejo. É feita uma breve discussão das indicações e mecanismos de ação da oxigenoterapia hiperbárica.
Descritores: Ostomia, complicações, dermatite periestomal, oxigenoterapia hiperbárica.
Introdução
O coloproctologista, em sua atividade
cirúrgica, depara-se freqüentemente com situações nas
quais a confecção de ostomias é necessária. As
ostomias, sejam elas terminais ou em alça, são alternativas
seguras e, por vezes, até mesmo salvadoras, em
cirurgia colorretal.
A realização de uma ostomia é
tecnicamente simples e rápida, e a cirurgia de reconstituição
de trânsito intestinal pode ser realizada
posteriormente, com o paciente em melhores condições clínicas.
No entanto, mesmo as ostomias podem apresentar problemas pós-operatórios
(1,4,10). Dentre as várias complicações decorrentes da confecção das
ostomias, uma das mais freqüentes, e por vezes de
difícil tratamento, é a dermatite periestomal
(11).
A oxigenoterapia hiperbárica é uma
modalidade terapêutica com indicações cada vez
mais amplas, oferecendo freqüentemente
excelentes resultados na cicatrização de feridas problemáticas
(2, 6, 14, 15).
Tais fatos levaram os autores a relatar
sua experiência com o tratamento de uma
paciente portadora de uma ferida abdominal de
difícil tratamento, através da oxigenoterapia hiperbárica.
CASO CLÍNICO
Identificação: MSPM, 76 anos, branca,
sexo feminino, aposentada.
Paciente apresentou quadro de
diarréia infecciosa grave, de caráter progressivo e
não responsiva ao tratamento clínico, que evoluiu
com perfuração de cólon e abdome agudo. Foi submetida
a colectomia segmentar, tendo sido ressecados parte
do cólon transverso e todo o cólon descendente,
e realizando-se transversostomia terminal e
fístula mucosa de sigmóide. Evoluiu com
dermatite periestomal progressiva e infecção associada -
celulite de parede abdominal (Figura-1).
Figura 1 - Dermatite peri-estomal. |
A resposta ao tratamento clínico
foi insatisfatória, e a paciente desenvolveu
sintomas infecciosos sistêmicos e intensa piora do estado
geral. Foi realizado então desbridamento cirúrgico
amplo (Figuras- 2 e 3), associado a antibioticoterapia
empírica de largo espectro, com ceftriaxona, oxacilina
e metronidazol, mantida por 14 dias, e 15 sessões
de oxigenoterapia (Figura- 4).
Figura 2 - Dermatite grave infectada |
Figura 3 - Após desbridamento. |
Figura 4 - Aspecto após 8 sessões de OHB. |
A ferida teve boa cicatrização, e
estava completamente fechada, um mês após o
tratamento com câmara hiperbárica, evitando a necessidade
de enxertia de pele (Figura- 5).
Figura 5 - Aspecto final, 1 mês após término OHB. |
DISCUSSÃO
A confecção de uma ostomia
gastrointestinal é um procedimento tecnicamente simples e rápido,
e freqüente na vida diária do coloproctologista.
De maneira geral, tais estomas apresentam índices
baixos a moderados de complicações, e as
complicações graves são infreqüentes. Podem-se dividir
as complicações em precoces (até o 1º mês
pós-operatório) e tardias (após o 1º mês pós-operatório). Os
estomas mais propensos a complicações são as
ileostomias, principalmente aquelas confeccionadas em
alça; complicações associadas a colostomias são mais
raras (1, 4, 10). Dentre as complicações precoces, a mais
comum é a irritação da pele, ou dermatite periestomal,
podendo ocorrer também dor, necrose parcial e desabamento.
A complicação tardia mais comumente
observada também é a dermatite, sendo menos freqüentes
os prolapsos, hérnias e as estenoses
(10).
De maneira geral, a dermatite periestomal
pode ser satisfatoriamente controlada com medidas
clínicas, como a utilização de cremes ou pomadas tópicas,
ou mudança do tipo de bolsa coletora utilizada
(7, 12). O estomaterapeuta desempenha papel importante
no seguimento e tratamento de tais pacientes (4,
11). Raramente, a dermatite periestomal pode evoluir
de forma aguda e muito desfavorável, culminando
com ulcerações ou celulite. Tais complicações
são potencialmente letais, e demandam diagnóstico
precoce e tratamento agressivo (5, 9).
O papel do oxigênio na cicatrização de
feridas tem sido alvo de numerosos estudos, e a eficácia
da oxigenoterapia hiperbárica é bem estabelecida
em condições como a Síndrome de Fournier, a
embolia gasosa, o envenenamento por monóxido de carbono
e lesões actínicas, entre outras. O mecanismo de
ação do oxigênio hiperbárico, em pressões que variam
de duas a três atmosferas (ATA), pode ser explicado
por efeitos físicos imediatos e por efeitos biológicos.
Entre os efeitos biológicos, conseqüentes ao aumento
da concentração de oxigênio tecidual, podem ser
citados: o estímulo das propriedades fagocitárias dos
leucócitos, o aumento da proliferação dos fibroblastos e da
síntese de colágeno, a redução do edema tecidual, o
aumento da neovascularização e osteogênese, e a elevação
da atividade proliferativa capilar. Além disso, há os
efeitos físicos imediatos do aumento das pressões
teciduais sobre o oxigênio e os outros gases, como a redução
do edema tissular e a diminuição da quantidade e
do tamanho das bolhas de gases presentes nos tecidos
(2, 8, 13).
A OHB apresenta-se, deste modo, como mais uma arma terapêutica útil no manejo de
feridas infectadas e de difícil cicatrização, e sua utilização
tem merecido investigação nessa área, com
resultados promissores (3, 6, 14, 15).
SUMMARY: The authors report the case of a 76-year old female who was submitted to an emergency partial colectomy with end colostomy. In the post-opperative period she had severe peristomal dermatitis that culminated with soft-tissue infection and abdominal wall necrosis. The patient had good outcome after receiving hyperbaric oxygen therapy (HBO), a therapeutic option that has proved to be useful in problem wound management. A brief discussion about HBO indications and mechanism of action is given.
Key words: Ostomy, complications, peristomal dermatitis, hyperbaric oxygen therapy.
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Endereço para correspondência:
Omar Féres
Depto. Cirurgia e Anatomia _ Disciplina de ColoProctologia
Hospital das Clínicas da FMRP-USP
Avenida dos Bandeirantes, 3900 - Monte Alegre
14048-900 - Ribeirão Preto - SP - Brasil
Fone: (16) 602-2509
E-mail: feresomar@netsite.com.br
Recebido em 11/02/2005
Aceito para publicação em 24/02/2005
Trabalho realizado na Disciplina de Coloproctologia do Departamento de Cirurgia e Anatomia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo.