RELATO DE CASO


HISTIOCITOSE DE CÉLULAS DE LANGERHANS PERIANAL: RELATO DE CASO

1Marília Rezende von Sonnleithner Gama, 1Henrique Francisco Souza e Souza, 1Geanna Mara Lino e Silva de Resende Guerra, 1Marcus Fábio Magalhães Fonseca, 1Flávia Balsamo, 1Galdino José Sitonio Formiga

1Hospital Heliópolis, São Paulo, SP, Brasil


GAMA MRVS; SOUZA HFS; GUERRA GMLSR; FONSECA MFM; BALSAMO F; FORMIGA GJS. Histiocitose de Células de Langerhans perianal. Relato de caso. Rev bras Coloproct, 2005;25(3): 253-255.

RESUMO: A histiocitose de células de Langerhans é uma doença caracterizada pela proliferação de células histiocitárias denominadas células de Langerhans, cujo acometimento perianal é raríssimo. As manifestações variam de uma lesão solitária a um envolvimento multisistêmico. O diagnóstico é confirmado por meio de estudo imunohistoquímico. O tratamento consiste em exérese da lesão perianal, podendo ser ou não complementada com quimioterapia.

Descritores: histiocitose de células de Langerhans, histiocitose X, células de Langerhans, histiocitose perianal

Introdução
A histiocitose X foi descrita em 1953, por Lichteinstein, que agrupava doenças caracterizadas pela proliferação tumoral de histiocitócitos com formação de granulomas 1. Atualmente, é denominada de histiocitose de células de Langerhans já que a presença de células de Langerhans no estudo histológico é patognomônica das lesões 1.
    A histiocitose de células de Langerhans é uma doença rara, que tem sido observada no sistema nervoso central, pulmão, fígado, pele e trato genital, acometendo principalmente crianças e sem predileção por sexo 2.
    Apresentamos um caso de histiocitose de células de Langerhans, acometendo exclusivamente a região perianal, associado à revisão da literatura.

RELATO DO CASO
M.L.S.R., 50 anos, feminino, branca, há 3 anos com dor perianal em pontada e prurido anal intenso. Hábito intestinal normal.
    Ao exame, apresentava duas úlceras anais de 0,5 cm de diâmetro a 2 cm da borda anal lateral esquerda e lateral direita (Figura-1).

 
Figura 1 - Lesão ulcerada lateral direita e lateral esquerda (setas).



    Foi submetida à biópsia com diagnóstico histopatológico de histiocitose de células de Langerhans (Figura-2 e 3), confirmado por estudo imunohistoquímico positivo para vimentina, CD1a e proteína S100.

 
Figura 2 - Infiltrado de células inflamatórias e histiocitárias (HE, 100x).


 
Figura 3 - Células histiocitárias de Langerhans - seta (HE, 400x).



    A pesquisa de doença sistêmica, com tomografias de tórax, abdome e pelve, não mostrou alterações. A paciente está realizando tratamento com talidomida (100 mg/dia) e atualmente encontra-se assintomática.

DISCUSSÃO
A histiocitose de células de Langerhans (HCL) é uma doença multissistêmica que se caracteriza pela proliferação de células histiocitárias (células de Langerhans). O acometimento perianal isolado é raríssimo 3. São descritos na literatura três casos da doença acometendo a região anogenital, mas não há nenhum relato de comprometimento perianal exclusivo em adultos, apenas alguns casos em crianças4,5. Não há predileção por sexo 3.
    Quando o comprometimento é multissistêmico, geralmente acomete dois ou três órgãos, sendo 80% envolvimento ósseo, 50% pele, 30% adenopatias, 20% hepatoesplenomegalia e 10-15% apresentam infiltrados pulmonares 6. Clinicamente apresenta-se desde uma forma benigna até uma forma aguda disseminada e letal, sendo que em adultos a forma benigna e multisistêmica prevalece 7. A forma perianal caracteriza-se por úlceras, podendo estar associadas a nódulos cutâneos 7.
    Histologicamente a HCL caracteriza-se por células com núcleo irregular e citoplasma abundante (células de Langerhans) e intenso infiltrado de células inflamatórias 6. No estudo imunohistoquímico os marcadores CD1a e S100 são positivos. A microscopia eletrônica evidencia a presença dos grânulos de Birbeck que são patognomônicos 3,7.
    O tratamento da HCL é controverso, podendo ser realizado com cirurgia, QT sistêmica, radiação ou uma combinação dessas. O tratamento cirúrgico de escolha é a excisão cirúrgica e consiste na terapêutica inicial 3.
    O uso da talidomida é o tratamento medicamentoso de escolha, sendo utilizado após a excisão cirúrgica da lesão ou como única forma de tratamento. A talidomida exerce efeito antiinflamatório e antineoplásico, através da inibição da produção de TNF e IL-6 e IL-12 cuja expressão encontra-se aumentada na HCL 2. Há evidências de que a talidomida atue diretamente na proliferação das células de Langerhans 8. A dose de 100 mg/dia por um mês é eficiente para induzir a remissão das lesões cutâneas, seguido de 50mg/dia por mais um ou dois meses 8,9. O principal efeito colateral é a neuropatia e parece ser dose dependente. Mulheres em idade fértil têm que ser alertadas a não engravidarem durante o uso da talidomida, devido a seu efeito teratogênico. O resultado final é a cicatrização das lesões cutâneo-mucosas, mas não há regressão das lesões em outros órgãos 2.

SUMMARY: The Langerhans'cell histiocytosis is an illness characterized for the proliferation of histiocite called Langerhans'cells, whose perianal involvement is uncommon. The manifestations vary of a solitary injury to a systemic involvement. The diagnosis is difficult and only confirmed through immunohistochemical study. The treatment consists of resection of the perianal injury being able or not to be complemented with medicines.

Key words: Langerhans cell histiocytosis, histiocytosis X, Langerhans cell, perianal histiocytosis

Referências Biliográficas
1. Lichtenstein L. Histiocytosis X: integration of eosinophilic granuloma of bone, Letterer Swive disease and Schuller-Cristian disease as related manifestations of single nosologic entity. Arch Pathol 1953;56:84-102
2. Kolde G, Schulze P, Sterry W. Mixed response to thalidomide therapy in adults:Two cases of multisystem Langerhans'cell histiocytosis. Acta Derm Venereol 2002;82(5):384-386.
3. Neto MS, Carvalho CH, Jr. FR, Ambrogini C, Ferreira LM. Histiocitose das células de Langerhans na região anogenital. Rev Ass Med Brasil 1998;44(4):344-346.
4. Papa CA, Pride HB, Tyler WB, Turkewitz D. Langerhans cell histiocytosis mimicking child abuse. J Am Acad Dermatol 1997;37(6):1002-1004.
5. Usmani GN, Westra SJ, Younes S. Case 13-2003: a 14-month-old boy with hepatomegaly, perianal lesions and a bone lump on the forehead. N Engl J Med 2003;348(17):1692-1701.
6. Kader HA, Ruchelli E, Maller ES. Langerhans'cell histiocytosis with stool retention caused by a perianal mass. J Pediatr Gatroenterol 1998;26(2):226-228.
7. Törok L,Tiszlavicz L, Somogyi T, Tóth G, Tápai M. Perianal ulcer as a leading symptom of paediatric Langerhans'cell histiocytosis. Acta Derm Venereol 2000;80(1):49-51.
8. Thomas L, Ducros B, Secchi B, Balme B, Moulin G. Successful treatment of adult's Langerhans'cell histiocytosis with thalidomide. Arch Dermatol 1993;129(10):1261-1264.
9. Teo SK, Colburn WA, Tracewell WG, Kook KA, Stirling DI, Jaworsky MS, Scheffler MA, Thomas SD, Laskin OL, Clinical pharmacokinetics of thalidomide. Clin Pharmacokinet 2004;43(5):311-327.

Endereço para correspondência:
Galdino José Sitonio Formiga
Hospital Heliópolis - Serviço de Coloproctologia
Rua Cônego Xavier, 276 - Vila Heliópolis
04231-030 - São Paulo-SP
Tel: (11) 274-7600 (Ramal 244)

Recebido em 10/01/2005
Aceito para publicação em 01/02/2005

Trabalho realizado no Hospital Heliópolis, São Paulo, SP, Brasil