RELATO DE CASO
TUMOR DESMÓIDE TRATADO COM TAMOXIFENO: RELATO DE CASO
Bruno Juste Werneck Côrtes 1, Sinara Mônica de Oliveira Leite 1, Marcos Henrique Rocha Campos 1, Levindo Alves de Oliveira1
1Hospital Governador Israel Pinheiro - IPSEMG _ Belo Horizonte, Minas Gerais
RESUMO: O tumor desmóide (TD) é uma neoplasia benigna, que se origina de estruturas fasciais ou
músculo-aponeuróticas, constituída por proliferação fibroblástica. Ocorre em 4 a 13% dos pacientes com polipose adenomatosa familiar (FAP). Apesar
de histologicamente benignos, os TD têm comportamento maligno, sendo localmente invasivos e com elevada recorrência após ressecção.
Os autores relatam um caso de tumor desmóide tratado cirurgicamente no Hospital Governador Israel Pinheiro _ IPSEMG e
fazem revisão da literatura sobre o tratamento.
Descritores: Tumores desmóides, tamoxifeno, polipose adenomatosa familiar
Introdução
O tumor desmóide (TD) é uma
neoplasia benigna, que se origina de estruturas fasciais
ou músculo-aponeuróticas, constituída por
proliferação fibroblástica. É um tumor raro que representa
0,03% de todas as neoplasias. É diagnosticado, em
sua maioria, entre os pacientes de 20 a 40 anos de
vida, com variação de 5 meses aos 80 anos de idade. É
mais prevalente em mulheres na idade reprodutiva.
Ocorre em 4 a 13% dos pacientes com polipose
adenomatosa familiar (FAP), sendo a segunda causa de morte
nos pacientes com esta síndrome, perdendo apenas para
o câncer de cólon. Os pacientes portadores de FAP
têm 16% de risco cumulativo de desenvolver TD nos
10 anos após a realização da colectomia. Nos
portadores de FAP, 50% dos TD são intra-abdominais,
40% localizam-se na parede abdominal e o restante
nas extremidades. Apesar de histologicamente
benignos, os TD têm comportamento maligno, sendo
localmente invasivos e com elevada recorrência após ressecção.
O objetivo deste trabalho é relatar um caso de
tumor desmóide tratado cirurgicamente no Hospital Governador Israel
Pinheiro - IPSEMG
Relato do Caso
GHPO, 56 anos, sexo feminino, viúva,
natural e residente em Curvelo _ MG, com história familiar
de polipose adenomatosa familiar, foi submetida
à colectomia total, com íleo-reto-anastomose, estando
em controle ambulatorial para os pólipos retais. Após
dois anos da cirurgia, desenvolveu quadro de dor e
distensão abdominal difusa (Figura-1). A tomografia
computadorizada abdominal demonstrou lesão compatível
com tumor desmóide (Figura-2).
Figura 1 |
Figura 2 |
Submetida à laparotomia devido a
semi-obstrução intestinal foi evidenciada grande
lesão sólida, envolvendo mesentério, intestino delgado
e pâncreas (Figura-3 e 4). O tumor foi ressecado
parcialmente com evidências de lesão residual no
pâncreas (Figura-5). No pós-operatório evoluiu com íleo
de resolução espontânea, recebendo alta hospitalar no
7o DPO. Tratada no pós-operatório com tamoxifeno,
verificou-se desaparecimento da lesão
residual observada durante acompanhamento
tomográfico semestral. Encontra-se em avaliação ambulatorial
há dois anos, sem evidência de progressão da doença
como evidenciado em tomografia computadorizada de controle e em uso de tamoxifeno. Tem hábito
intestinal regular, embora evacue cerca de 5 vezes por dia,
devido às ressecções intestinais já realizadas. Não
apresenta déficit nutricional, trabalha como professora e tem
boa qualidade de vida.
Figura 3 |
Figura 4 |
Figura 5 |
Discussão
A etiologia dos TD não foi ainda
totalmente esclarecida. Todavia, existem fatores
reconhecidamente relacionados ao seu desenvolvimento:
genéticos, traumáticos e hormonais. Os pacientes com TD,
em sua maioria, são portadores de deleção dos alelos
do gene APC (5q21-22) e mutações próximas ao
códon 1444 deste gene. O trauma cirúrgico tem
relação estabelecida com o aparecimento dos TD (68 a
83% de chance); no entanto, a extensão ou o tipo
de procedimento não interferem no risco desta
incidência. Receptores estrogênicos parecem estar envolvidos
na ocorrência dos tumores desmóides: pacientes
grávidas ou em uso de anticoncepcionais orais
apresentam crescimento dos TD, verificando-se sua regressão
após a menopausa.
O tratamento dos TD é orientado pela
sua localização, extensão a órgãos vitais ou se há
presença de recidiva.
A introdução dos antiestrogênicos
no tratamento monoterápico ou combinado dos
tumores desmóides é baseado na resposta destes às
variações hormonais. O tamoxifeno e o toremifene são as
drogas de escolha nestes casos, pois 33 a 75% dos
tumores desmóides apresentam receptores estrogênicos. A
ação das drogas anti-estrogênicas é mediada através
da inibição do TGF-beta nos fibroblastos. Entretanto,
o efeito dos anti-estrogênicos não pode ser
explicado apenas por suas ações nos receptores
estrogênicos. Receptores específicos para drogas
anti-estrogênicas foram encontrados em 79% dos TD. Após o início
da terapêutica, um efeito progressivo é verificado
nas primeiras 2 semanas a 6 meses, com resposta
positiva de 50% dos pacientes ao tratamento. As
melhores evoluções foram encontradas com a associação
das drogas anti-estrogênicas aos anti-inflamatórios
não esteróides (Sulindac).
Church6 sugere tratamento do tumor desmóide intra-abdominal na FAP com
Sulindac, 150 mg duas vezes ao dia. Se o tumor continua a
crescer na observação clínica e tomográfica deve-se
adicionar o tamoxifeno, 80 mg/dia. Se o tumor estabiliza
deve-se então continuar as medicações, mas reduzir a
dose do tamoxifeno após 6 meses e ir retirando o
medicamento progressivamente. Se o tumor continua a
crescer ou se está sintomático, deve-se considerar a
quimioterapia. Se um tumor desmóide é encontrado
durante laparotomia e pode ser ressecado com um mínimo
de intestino delgado e baixas complicações isto pode
ser feito. Porém, se a excisão completa é
impossível, melhor obter espécime para histologia e estudos
para receptores estrogênicos.
A sobrevida geral dos pacientes portadores
de TD em 10 anos é de 63% com 4 a 6 % dos
tumores regredindo espontaneamente. As principais causas
de morte são: erosão de vaso sanguíneo ou
sepse decorrente de fístula entérica, além de
complicações secundárias ao tratamento cirúrgico.
SUMMARY: The desmoid tumors are benign tumors arising from fibroaponeurotic tissue. They occur in 4 to 13% patients
who present familial adenomatous polyposis. Although a benign disease, desmoid tumors are focally invasive. They do not
metastasize but can be lethal because of aggressive growth with pressure and erosion causing small bowel obstruction. Their tendency to
recur (65% to 85%) after removal has encouraged a conservative approach to management.
The authors report the case of a patient who presented intra-abdominal desmoid tumor, treated surgically in the Hospital
Governador Israel Pinheiro _ Belo Horizonte (MG) and discuss the therapeutic options in the literature.
Key words: desmoid tumors, tamoxifen, familial adenomatous polyposis
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5. Risum S, Bülow S _ Doxorrubicin treatment of an
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adenomatous polyposis. Colorrectal Disease; 5: 585-586, 2003.
6. Church JM. Desmoid tumors in patients with
familial adenomatous polyposis. Semin Colon Rectal Surgery;
6:29-32,1995.
Endereço para correspondência:
Sinara Mônica de Oliveira Leite
Av. Contorno 4747 cj 912 - Serra
30.110-090 - Belo Horizonte (MG)
Recebido em 09/05/2005
Aceito para publicação em 12/07/2005
Trabalho realizado no Hospital Governador Israel Pinheiro - IPSEMG - Belo Horizonte, Minas Gerais.