VÍDEO-LAPAROSCOPIA COLO-RETAL
ENFOQUES ATUAIS & CONTROVÉRSIAS
Fábio Guilherme C. M. de Campos
IMPACTO DA VÍDEOCIRURGIA NA PREVENÇÃO DE ADERÊNCIAS
Sergio Eduardo Alonso Araújo1, Pedro Paulo de Paris Caravatto1, Alexandre Jin Bok Audi Chang1, Fábio Guilherme C. M. de Campos1, Manoela Sousa1
1Disciplina de Coloproctologia do Departamento de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
RESUMO: Uma das vantagens aventadas da vídeo-cirurgia é a possibilidade de formar menos aderências pós-operatórias. As evidências deste efeito resultam de trabalhos clínicos e experimentais, mas o real impacto desta via de acesso neste sentido ainda não foi comprovado. O objetivo da presente revisão foi avaliar as evidências científicas disponíveis sobre o assunto. Material e Métodos: revisão da literatura pertinente. Resultados: As aderências pós-operatórias foram analisadas no sítio da operação e nas incisões praticadas, porém existem poucas informações sobre aderências em locais não operados. Aderências pós-operatórias são menos freqüentes ou intensas quando se considera a via de acesso por vídeo. A despeito deste dado experimental, os desfechos clínicos de menor dor pélvica, menor número de admissões ou reoperações por obstrução intestinal e menor ocorrência de infertilidade ainda não podem ser claramente atribuídos a esta via de acesso, especialmente quando se consideram as cirurgias laparoscópicas avançadas, uma vez que nesta situação existe equivalência de área cruenta nas duas vias de acesso, à exceção da área associada às incisões. Conclusões: A via de acesso por vídeo está associada a menor formação de aderências, mas não protege de complicações relacionadas à sua ocorrência. Técnica operatória adequada e o uso de barreiras provavelmente estão mais fortemente associadas à menor formação de aderências do que a via de acesso aberta empregada para a realização das operações abdominais e pélvicas.
Descritores: Aderências, Laparoscopia, Obstrução Intestinal, Dor Pélvica, Infertilidade
INTRODUÇÃO
Aderências são conexões patológicas
entre superfícies dentro das cavidades do corpo.
Estas conexões ou pontes podem ser constituídas por
fina lâmina de tecido conjuntivo, por lâmina tecidual
mais espessa contendo vasos sanguíneos e nervos
ou representar um contato direto entre a superfície de
dois órgãos. Podem ser encontradas nas
cavidades peritonial, pericárdica, pleural, uterina, no interior
de articulações ou das câmaras oculares. Na
cavidade abdominal são conhecidas como aderências
peritoniais, uma vez que o peritônio está sempre envolvido.
Sua incidência após operações é elevada, podendo
ocorrer em até 93% das laparotomias. 1
Aderências intraperitoniais podem ser benéficas, promovendo revascularização de
superfícies isquêmicas como anastomoses intestinais.
Entretanto, podem determinar obstrução intestinal e ser causa
de aproximadamente 70% das reinternações por
obstrução de intestino delgado
2. São responsáveis por
15_20% dos casos de infertilidade secundária em mulheres
e estão associadas a dor crônica abdominal e pélvica
3, 4. Além disso, prolongam o tempo operatório em
re-laparotomias, levando a enterotomias inadvertidas
em aproximadamente 20% dos casos, o que acarreta
maior incidência de complicações
pós-operatórias, necessidade de cuidados intensivos e
internação hospitalar prolongada
5 .
As operações abdominais representam a
maior causa conhecida de formação de aderências,
embora elas ocorram em até 10% de pacientes
nunca submetidos a operações abdominais
prévias6. Entende-se que a vídeo-cirurgia possa levar a menor
formação de aderências quando comparada à via
convencional, como resultado de menores incisões,
manipulação tecidual e sangramento.
O objetivo desta revisão foi avaliar criticamente as evidências científicas
disponíveis acerca do papel da vídeo-cirurgia na formação
de aderências e na prevenção de suas complicações
pós-operatórias mais freqüentes.
FISIOPATOLOGIA DA FORMAÇÃO DE ADERÊNCIAS
Apesar de intuitiva, a fisiopatologia da formação de aderências é complexa, o que pode em
parte explicar o porquê de sua relativa imprevisibilidade
no que se refere ao local onde se formarão ou com
qual intensidade. Sua formação se inicia a partir de
uma resposta do peritônio a diferentes agressões,
como infecção, irritação química e trauma direto, e inclui
os sistemas da coagulação e fibrinolítico.
7
A cavidade abdominal é revestida pelo peritônio, que consiste em uma camada única de
células mesoteliais sustentada por uma membrana basal e
uma camada subjacente de tecido conjuntivo. O
trauma peritonial resulta em dano mesotelial,
desencadeando uma resposta inflamatória local. As células
mesoteliais se desprendem da membrana basal, criando
áreas desnudas, desencadeando a produção de um
amplo espectro de proteínas biologicamente ativas e
de exsudato rico em proteínas. O exsudato
peritonial contém altas concentrações de fibrinogênio.
A cascata de coagulação é ativada na
cavidade peritonial, resultando na formação de trombina
que ativa a conversão de fibrinogênio em fibrina. Devido
à ativação do sistema fibrinolítico, qualquer
depósito intra-abdominal de fibrina pode sofrer lise.
Entretanto, após cirurgia abdominal e infecção, o equilíbrio
entre coagulação e fibrinólise é afetado em favor do
sistema de coagulação
8-17. Desse modo, a fibrina forma depósitos que servirão de matriz para proliferação
de tecido fibro-colagenoso e, portanto, levando à
formação de aderências.
CONSEQÜÊNCIAS DA FORMAÇÃO
DE ADERÊNCIAS
As principais conseqüências da formação
de aderências são infertilidade, obstrução intestinal,
dor pélvica crônica e o maior risco associado
às reoperações (perfuração de vísceras ocas e de
vasos intra-abdominais) 18-21. A torção tubária, a estenose
do suprimento ovariano e aderências intra-uterinas
estão entre as maiores conseqüências das aderências e
estima-se que estas podem representar causa da
infertilidade em até 40% dos casos
22.
Em estudo prospectivo envolvendo 224 pacientes que sofriam de dor abdominal
crônica revelou-se que 82% possuíam apenas aderências
e nenhuma outra doença associada. Estes pacientes
foram submetidos a lise de aderências por laparoscopia.
Após três meses, 74% dos pacientes estavam sem dor
ou apresentaram melhora da dor 23.
Aderências intraperitoniais representam a causa mais importante de obstrução intestinal,
sendo responsáveis por 40 % de todos os casos
24, 25, 26 e até 70% dos casos de obstrução de intestino delgado
27. Estudo publicado pelo Surgical and Clinical
Adhesions Research (SCAR) Group 28
envolvendo pacientes submetidos à cirurgia colorretal aberta demonstrou
que a necessidade de reinternação atinge 9% no
primeiro ano após a cirurgia abdominal (2,1% como
causa diretamente relacionada e 6,9% como causa provavelmente relacionada às aderências). As taxas
de reoperação relacionadas às aderências após
laparotomia variam de 1% até 2,6%
18,29.
Estes resultados traduzem significativa morbidade associada às numerosas
operações abdominais realizadas por via convencional.
Ressalte-se uma das conclusões do estudo SCAR, em que
a grande maioria das reinternações por
obstrução intestinal não é conduzida pelo cirurgião
responsável pela operação que originou as aderências, o que
gera uma subestimativa coletiva da intensidade do
problema e, como resultado, maior dificuldade de se entender
a necessidade de encontrar formas eficazes de evitá-lo.
PREVENÇÃO DA FORMAÇÃO
DE ADERÊNCIAS
As duas maiores estratégias na prevenção
ou redução da formação de aderências são
representadas por ajustes na técnica cirúrgica e pelo uso
de adjuvantes.
As modificações na técnica operatória
fazem parte do treinamento do bom cirurgião e dela
fazem parte todas as medidas utilizadas com a finalidade
de reduzir o trauma cirúrgico, ou seja: controlar ou
evitar a introdução de material estranho (talco de
luvas cirúrgicas, por exemplo), prática de
hemostasia cuidadosa, redução da exposição e ressecamento
da superfície peritoneal com o emprego de
compressas úmidas, uso de incisões adequadas, emprego
de material cirúrgico delicado, cuidado no afastamento
e manipulação das estruturas, controle e diminuição
da contaminação.
Em 1886, Müller sugeriu o uso de
solução salina para prevenir a ocorrência de aderências
30. Desde então, inúmeros agentes foram investigados
para a prevenção de aderências intra-abdominais. Eles
são baseados na ativação da fibrinólise, alteração
da coagulação, diminuição da resposta
inflamatória, inibição da síntese de colágeno ou criação de
uma barreira entre superfícies de feridas adjacentes.
A ativação do sistema fibrinolítico
é considerada benéfica na prevenção de aderências
intra-abdominais. No final do século 19 preconizava-se
o uso de agentes com capacidade fibrinolítica (tais
como tiosinamina presente em bebida alcoólica),
salicilato de sódio 31 e fósforo
oral 32. A estreptoquinase e estreptodornase foram os primeiros agentes
com propriedades fibrinolíticas comprovadas que
se mostraram eficazes em prevenir a formação
de aderências em modelos experimentais 33, 34
, embora sua eficácia nunca tenha sido comprovada em
humanos. O fator ativador de plasminogênio tecidual (tPA)
foi também estudado neste sentido. Embora tenha
se provado a eficácia do tPA
35-45, o risco de hemorragia tem sido o principal obstáculo para seu uso
rotineiro. Anticoagulantes como heparina também são
efetivos na prevenção de aderências
46-55, embora o uso local de heparina em cirurgia abdominal permanece
controverso devido ao risco de hemorragia.
Drogas antiinflamatórias foram testadas
na prevenção de aderências, incluindo corticosteróides
e inibidores da síntese de prostaglandinas
56-65. Swolin 57 obteve êxito em pacientes em que aplicou
esteróides intraperitoniais, mas outros autores reportaram
efeitos divergentes e, em alguns casos, deletérios
58, 59, associados intuitivamente à diminuição de
resposta imune atribuídas a estas drogas.
A alteração do equilíbrio entre síntese
e degradação de fibrina leva à persistência de
aderências fibrinosas, que serão preenchidas por fibroblastos
com deposição subseqüente de colágeno, resultando
na formação de aderências fibrosas permanentes.
Nagler e cols.66, 67 demonstraram que o tratamento
com halofuginona (um inibidor da síntese de colágeno
tipo I) diminui a formação de aderências
cirúrgicas induzidas experimentalmente. Testes clínicos ainda
são aguardados.
A criação de uma barreira mecânica entre
as superfícies das feridas é outro método promissor.
A camada peritonial se regenera 5 a 7 dias após a
cirurgia, independente da extensão do dano. A
separação mecânica das superfícies das feridas durante
este período pode prevenir a formação de aderências
entre superfícies danificadas. Este conceito era
defendido no final do século 19 por
Vogel, através do emprego de solução de goma arábica, e no início do século 20
por Claypool e cols. com o uso de petrolato líquido
68, 69.
Recentemente foram desenvolvidos novos métodos na prevenção de aderências que
incluem barreiras físicas (barreiras mecânicas sólidas,
barreiras bioabsorvíveis em forma de gel ou filmes) e
soluções macromoleculares.
A celulose oxidada regenerada
(Interceed®, Johnson &
Johnson) é um filme absorvível que leva
à prevenção de aderências, sem o comprometimento
da cicatrização, e pode ser utilizado durante
cirurgia laparoscópica ou aberta, em qualquer
localização intraperitoneal
70. Apesar dos resultados inicialmente animadores, quando se observou eficácia duas
vezes superior em pacientes submetidos à
cirurgia ginecológica aberta71, o
Interceed® só deve ser
utilizado após hemostasia rigorosa, uma vez que
suas propriedades são inativadas em contato com o
sangue, dificultando sua utilização em cirurgia geral.
A associação de ácido hialurônico
e carboximetilcelulose
(Seprafilm®, Genzyme)
resultou na redução na incidência, extensão, densidade
e vascularização das aderências em pacientes
submetidos à cirurgia colorretal em dois tempos, como após
a retocolectomia total com anastomose íleo-anal
com reservatório ileal e ileostomia de
proteção72. Estudo multicêntrico em cirurgia colorretal com o uso
de Seprafilm determinou a segurança da utilização
deste produto; entretanto, observou-se maior incidência
de deiscência de anastomose quando o filme foi
utilizado nessas áreas
específicas73. Outro estudo
multicêntrico observou redução de 47% na incidência de
aderências pós-operatórias em pacientes submetidos à
ressecção intestinal; entretanto foram utilizados em média
4,4 unidades do filme, o que resultou em custo elevado
do procedimento. 74
A solução sintética de
polietilenoglicol
(Spraygel®, Confluent Surgical)
na forma de spray produz um filme de hidrogel quando aerossolizada.
A barreira formada permanece aderida às alças por
um período de sete dias, após os quais é excretada via
renal. Os resultados obtidos com o uso do
Spraygel® mostraram redução na incidência, gravidade e
extensão de aderências pós-operatórias, mas a um custo
ainda bastante elevado. 75, 76
Utilizada inicialmente em diálise peritoneal
em concentrações mais elevadas, a solução de
icodextrina a 4% (Adept®, Shire
Pharmaceuticals) permanece por tempo prolongado na cavidade peritoneal, fazendo
com que os órgãos intrabdominais flutuem na
cavidade, afastados entre si, prevenindo a formação de
aderências. Ao contrário dos agentes mencionados anteriormente,
a utilização de
Adept® é tecnicamente fácil
em laparoscopias e laparotomias e se mostrou
bastante segura, com poucos efeitos deletérios. Além disso,
não afeta a cicatrização das áreas anastomóticas.
77, 78
IMPACTO DA VIA DE ACESSO NA PREVENÇÃO DE ADERÊNCIAS
Apesar dos estudos experimentais apresentarem metodologia bastante variada entre
si, muitos demonstram as vantagens da via
laparoscópica sobre a convencional na prevenção e redução
de aderências. Garrard e cols.79 avaliaram a ocorrência
de aderências pós-operatórias em porcos e
demonstraram que a colocação de tela de polipropileno
por laparoscopia quando comparada à laparotomia
ou mesmo à laparoscopia com incisão aumentada
produziu menos aderência à tela no que se refere à extensão e
ao grau de intensidade das aderências e à presença
de vascularização.
Estudo realizado por Gamal e cols.80 em
60 cães submetidos à colecistectomia comparou as
vias laparoscópica e convencional na formação
de aderências. No segundo tempo operatório, os
autores observaram que o grupo submetido à laparoscopia
sem complicações operatórias não apresentou sinais
de aderências, assim como o grupo no qual
ocorreu perfuração acidental da vesícula biliar durante
o procedimento laparoscópico. Por outro lado,
aderências foram observadas no grupo submetido
à colecistectomia pela via aberta e no grupo em
que ocorreu sangramento ou lesão do leito hepático
durante a laparoscopia. De forma semelhante, Tittel e
cols. 81observaram menor formação de aderências em
cães submetidos a ressecção do ceco por
laparoscopia quando comparados à laparotomia.
Em estudo com porcos submetidos à nefrectomia transperitoneal, Moore e
cols.82 compararam a formação de aderências
pós-operatórias pós laparoscopia ou laparotomia,
verificando incidência de 12,5% e 75%, respectivamente.
Enquanto no primeiro grupo as aderências estavam restritas
à incisão dos portais, no segundo elas se estendiam
por toda a incisão.
Em experiência com 52 ratos
Sprague-Dawley comparando a extensão da formação de aderências
após fundoplicatura por via laparoscópica ou
aberta, Krahenbuhl e cols.83observaram menor formação
de aderências no grupo submetido à laparoscopia
quando comparado à cirurgia convencional, de forma que
no primeiro grupo as aderências eram
predominantemente parietais e mais finas, enquanto que no segundo,
eram predominantemente viscerais e mais espessas.
A formação de novas aderências em
coelhos previamente submetidos a adesiólise pela
via laparoscópica e pela laparotomia foi comparada
por Tittel e cols.84 . Os autores observaram que no
grupo submetido a adesiólise pela laparotomia, a
incidência de novas aderências foi de 100%, enquanto que
no grupo da laparoscopia esta foi de 75%, sendo as aderências significativamente menos extensas.
Os autores concluíram que a adesiólise laparoscópica
leva a menor formação de novas aderências
e, conseqüentemente, menor índice de
complicações associadas.
Assim como os estudos experimentais já publicados, os estudos clínicos que comparam
a incidência de aderências peritoniais quanto à via
de acesso empregada carecem de uniformidade em sua metodologia, constatando-se diferença
significativa quanto ao tipo de operação realizada, à
técnica empregada pelo cirurgião e à forma de avaliação
das aderências.
Lundorff e cols.85 avaliaram a incidência
de aderências em pacientes com prenhez
ectópica operadas pela via convencional ou por laparoscopia
e observaram em segundo tempo cirúrgico que
o tratamento laparoscópico levou à menor formação
de aderências no lado operado quando comparado
à laparotomia. Além disso, a avaliação do
lado contralateral demonstrou menor intensidade de aderências no grupo submetido à laparoscopia, mas
não se pôde associar significância estatística a este achado.
A ocorrência de aderências após
coagulação de ovários policísticos foi o parâmetro avaliado
por Taskin e cols. 86 em estudo randomizado com
18 pacientes submetidas ao tratamento por
laparoscopia convencional ou por minilaparoscopia com
mínima exposição ao gás carbônico. Neste estudo, os
autores observaram menor formação de aderências no
grupo submetido ao tratamento pela minilaparoscopia
quando comparado à técnica laparoscópica convencional, o
que é, provavelmente, conseqüência da menor agressão
do pneumoperitônio de baixo volume sobre a microcirculação peritonial e a estrutura celular.
Pacientes previamente submetidos à colecistectomia pela via laparoscópica (n=18) ou
pela via aberta (n=8) foram incluídos em estudo
prospectivo não randomizado de Polymeneas e cols.
87. Neste trabalho, os autores avaliaram a incidência
de aderências peritoneais em uma segunda
intervenção cirúrgica por patologias intrabdominais diversas.
No grupo submetido à colecistectomia laparoscópica,
não se observou aderências no lado operado ou
relacionadas aos portais de acesso em 55% dos pacientes,
enquanto que 16,6% dos pacientes apresentaram
aderências mínimas no local operado. No grupo
previamente submetido à colecistectomia pela via aberta, todos
os pacientes apresentavam aderências densas no
local operado ou na parede abdominal abaixo da incisão.
Os autores concluíram que a laparoscopia esteve
associada a menor incidência de aderências peritoniais
pós-operatórias.
AVALIAÇÃO DO CUSTO-EFETIVIDADE DE ESTRATÉGIAS DE REDUÇÃO
DE ADERÊNCIAS
A indisponibilidade de estudos clínicos comparativos, associada à inexistência de dados
quanto à ocorrência e à intensidade dos desfechos
adversos das aderências peritoniais, tais como dor abdominal
e pélvica, infertilidade e obstrução intestinal, torna
a avaliação do impacto da laparoscopia sobre a
incidência de aderências uma tarefa árdua.
A falta de estudos randomizados e controlados também prejudica a adoção de métodos de
prevenção de aderências por muitos cirurgiões e
administradores de sistemas de saúde, que relutam em introduzir
essas técnicas com base em um número reduzido de
estudos disponíveis.
Membros do grupo de estudo SCAR demonstraram que a realização de
estudos randomizados e controlados com esse intuito
envolveria um número exagerado de pacientes para atingir
níveis significativos88. Supondo que o agente de
prevenção da formação de aderências promovesse uma
redução de 25% no número de internações relacionadas
a aderências em um período de um ano, seria
necessário incluir no estudo 5.586 a 7.786 pacientes para
atingir significância estatística (p=0,05 e
p=0,01, respectivamente). Ao considerar os pacientes
perdidos durante o seguimento (10-15%), seriam necessários
de 6.539 a 8.148 pacientes e ao levarmos em conta
os critérios de exclusão, esse número se elevaria para
entre 13.000 e 16.000 pacientes.
A avaliação do custo da utilização de
produtos para prevenção de aderências demonstrou que
uma redução de 32,6% no número de internações
por obstrução do intestino delgado no primeiro ano e
de 16% após três anos seria necessária para justificar
o gasto de 50 libras esterlinas por item
utilizado. Entretanto, quando avaliados itens de 200
libras esterlinas, a redução de 100% no número
de reinternações no primeiro ano não seria suficiente
para cobrir os custos do produto, enquanto que em 3
anos, seria necessária uma redução de 64,1% no número
de reinternações. Fazio e cols.74
demonstraram uma redução de 47% no número de internações
por obstrução do intestino delgado após o uso
de Seprafilm®. Baseado em estudo de Beck e
cols.73, que estimou o custo da utilização de
Seprafilm® em torno de 350-450 libras esterlinas por paciente,
conclui-se que uma redução de 100% no número de
internações por oclusão do intestino delgado após 10 anos
de seguimento não seria o suficiente para arcar com
os custos do produto.
Em resumo, a realização de um
estudo randomizado para verificar a efetividade de
produtos para a redução de aderências é bastante discutível
devido ao grande número de pacientes necessários e ao
elevado custo associado aos produtos
comercialmente disponíveis. Apesar de provavelmente
representarem uma intervenção sem dano e, ao que tudo
indica, associada a benefício, o uso clínico menos tímido
das barreiras permanece "amarrado" como resultado de
seu custo ainda elevado, sobretudo em nosso meio.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As aderências representam um problema
já bastante conhecido após cirurgia abdominal e
estão associadas a inúmeras complicações
como infertilidade, dor abdominal e pélvica crônica
e obstrução intestinal.
Acarretam elevado custo para o sistema de saúde. Aproximadamente 1 bilhão de dólares
foram gastos nos Estados Unidos com internações para
lise de aderências em 1998 89.
A vídeo-cirurgia representa um avanço
na prática cirúrgica na medida em que está associada
a menor formação de aderências, o que pode
ser atribuído às incisões menores, à menor introdução
de corpos estranhos na cavidade, ao menor trauma resultante de afastadores e à menor manipulação
de estruturas distantes do campo operatório. No
entanto, é provável que quanto mais avançada for a
operação por vídeo (por exemplo: a retocolectomia
total videoassistida), será mais difícil verificarem-se
os benefícios de menor formação de aderências
pós-operatórias. O motivo seria a similaridade entre
a extensão das áreas desperitonizadas na
cirurgia laparoscópica colorretal avançada quando
comparada à mesma operação realizada por via
convencional. Estas áreas seriam similares exceto pelas
relacionadas às incisões. Analogamente,
complicações relacionadas à construção e fechamento de
derivações de proteção mais comuns nas operações avançadas
e sobre o reto estariam presentes em ambas as vias
de acesso.
SUMMARY: Laparoscopic surgery seems to be associated with less adhesion formation and complications associated to surgical access when compared to laparotomy. Experimental and clinical evidence confirm this hypothesis but the impact of laparoscopy on adhesion formation and its complications remains undetermined. The present article aims at reviewing the evidence on this issue. Method: literature review. Results: Postoperative adhesions were evaluated at operation site and at surgical scars. Nevertheless, results on adhesion formation at sites distant from them are still unavailable. Adhesion formation was less common or reduced when laparoscopic access was compared to conventional surgery. Main adverse outcomes regarding adhesion formation are pelvic pain, infertility, and intestinal obstruction. There is little evidence of reduced incidence of these adverse outcomes after laparoscopic surgery when compared to conventional access and there may be none at all when major laparoscopic operations are considered. This finding may be due to a similar extent of dissection after conventional or advanced video operations with the exception of the adhesions related to the incisions. Conclusions: Laparoscopic surgery is associated to less adhesion formation but may not protect from adverse outcomes expected after abdominal operations. Adequate surgical technique and the use of commercially available adhesion barriers may be major determinants from adhesions formation and its consequences.
Key words: Adhesions, Laparoscopy, Intestinal Obstruction, Pelvic Pain, Infertility
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Endereço para correspondência:
SÉRGIO EDUARDO ALONSO ARAUJO
Rua Cristiano Viana, 450 apt. 62
05411-000, São Paulo (SP)
E-mail: sergioaraujo@colorretal.com.br
Recebido em 17/05/2006
Aceito para publicação em 04/06/2006
Trabalho realizado na Disciplina de Coloproctologia do Departamento de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo