ARTIGOS ORIGINAIS


AVALIAÇÃO DO PREPARO INTESTINAL PARA COLONOSCOPIA COMPARANDO O USO DO MANITOL E DO POLIETILENOGLICOL - ESTUDO PROSPECTIVO

Comparative Evaluation of Bowel Preparation for Colonoscopy Using Mannitol and Polyethylene Glycol - A Prospective Study

BENICIO LUIZ BULHÕES BARROS PAULA NUNES1; SANDRA GICO LIMA Belo2; MARCOS HOLANDA PESSOA1; MANOEL ÁLVARO LINS NETO1

1 Médico do Serviço de Coloproctologia do Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes, da Universidade Federal de Alagoas - UFAL; 2 Professor Adjunto de Cirurgia do Aparelho Digestivo do Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes, da Universidade Federal de Alagoas - UFAL - Alagoas - Brasil.


NUNES BLBBP, LIMA SG, PESSOA MH, LINS NETO MA Avaliação do Preparo Intestinal para Colonoscopia Comparando o Uso do Manitol e do Polietilenoglicol Estudo Prospectivo. Rev bras Coloproct, 2008;28(3): 294-298.

RESUMO: Com o objetivo de estudar comparativamente o preparo intestinal para colonoscopia, 55 pacientes foram distribuídos aleatoriamente em grupos submetidos a preparo com polietilenoglicol (PEG) e solução de manitol. A qualidade do preparo do cólon no grupo que utilizou o PEG foi considerada excelente em 12 pacientes (44,4%), bom em 15 (55,6%) e ruim em nenhum caso, enquanto que naqueles indivíduos preparados com manitol a 20% a qualidade foi, respectivamente, de oito (28,6%), 12 (42,9%) e oito (28,6%) indivíduos, sendo a diferença estatisticamente significante (p=0,010). Não houve diferença estatística entre os grupos quando comparamos o grau de satisfação dos pacientes, ou a quantidade de líquido no cólon durante o exame. Conclui-se que a qualidade do preparo intestinal com PEG para colonoscopia é superior ao manitol.

Descritores: Colonoscopia; Preparo de Cólon; Manitol, Polietilenoglicol.

INTRODUÇÃO
A colonoscopia é usualmente aceita como o exame de escolha para a detecção e tratamento de lesões do cólon. Contudo, sem um preparo adequado, pequenas tumorações podem ficar encobertas por fezes formadas, e não serem detectadas (AREZZO).
   Desta forma, uma das necessidades básicas para a realização da colonoscopia é um preparo adequado do cólon, possibilitando a realização do exame de forma segura, com introdução do aparelho sob visão direta e evitando deixar passar desapercebidas lesões colônicas. Entretanto, faz-se necessário que o preparo para a realização do exame seja aceitável para o paciente e efetivo na limpeza do cólon, além de ser de baixo custo (HABR-GAMA-1999, SAUNDERS, HUPPERTZ-HAUSS).
   Dentre os produtos existentes na literatura, o manitol e o polietilenoglicol são os mais utilizados, sendo ambos seguros e efetivos para a utilização no preparo do cólon para a colonoscopia (HABR-GAMA-1981, NAHAS, HABR-GAMA-1999). Mas, será que ambas as substâncias são realmente semelhantes?
   O objetivo deste estudo é comparar o preparo do cólon para colonoscopia, utilizando o manitol e o polietilenoglicol (PEG), levando-se em consideração a aceitação dos pacientes e a efetividade na limpeza do cólon.

MÉTODO
Foram estudados, prospectivamente e de forma consecutiva, 55 pacientes submetidos ao exame colonoscópico no Serviço de Coloproctologia do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), no período de agosto a novembro de 2005. Todos os indivíduos foram alocados aleatoriamente a um dos dois grupos do estudo por um pesquisador independente, e orientados a ingerir dieta sem resíduos, e a fazerem uso de 03 comprimidos de bisacodil na véspera da colonoscopia. Desta forma, um grupo de pessoas foi submetido a preparo intestinal com 400ml de Manitol a 20% diluído em 400ml de suco de laranja, enquanto o outro fez uso de 3.000ml de Polietilenoglicol (PEG), no dia anterior ao exame. Todos foram submetidos ao exame colonoscópico sob sedação com Diazepam (10mg) e Meperidina (50mg), em infusão venosa.
   Foram avaliados a qualidade do preparo intestinal, o grau de satisfação do paciente e a quantidade de líquido no cólon durante o exame. O preparo intestinal foi considerado excelente quando se encontrou líquido claro ou nenhum líquido; bom quando o líquido encontrado era escuro, porém podia ser aspirado e não prejudicava o exame; e ruim quando se encontravam fezes formadas ou pastosas que não permitiam a adequada visualização da mucosa. O grau de satisfação do paciente foi classificado em ótimo, quando não era referido nenhum desconforto por parte do paciente; regular quando o mesmo referia desconforto, cólica ou náuseas; e ruim quando o indivíduo apresentava qualquer sintoma que o impedia de completar a ingestão do preparo intestinal. A quantidade de líquido durante o exame foi avaliada em pouca, moderada e muita.
   Em todas as colonoscopias, o examinador não tinha informações sobre qual preparo foi utilizado pelo paciente.
   A análise estatística foi realizada utilizando o programa SPSS for Windows©, versão 11.5.0 (LEAD Technology Inc.). Foi utilizado o teste do qui-quadrado para as variáveis não-paramétricas, sendo considerado o valor de alfa de 0,05 para rejeitar a hipótese de nulidade.

RESULTADOS
Dos 55 casos estudados, 43 (78,2%) eram do sexo feminino e 12 (21,8%) do masculino, com média de idade de 55,46 anos (20-78 anos). Vinte e sete pacientes foram alocados no grupo com PEG, enquanto 28 foram para o grupo do manitol a 20%.
   A qualidade do preparo do cólon no grupo que utilizou o PEG foi considerada excelente em 12 pacientes (44,4%), bom em 15 (55,6%) e ruim em nenhum caso. Naqueles preparados com manitol a 20% a qualidade foi, respectivamente, de oito (28,6%), 12 (42,9%) e oito (28,6%) indivíduos, sendo a diferença estatisticamente significante (p=0,010) - Tabela 1.

   Com relação ao grau de satisfação dos pacientes quanto ao tipo de preparo utilizado, duas pessoas (7,4%) classificaram o uso do PEG como ótimo, 23 (85,2%) como bom e duas como ruim (7,4%). Já no grupo em que foi utilizado o manitol a 20%, oito pacientes (28,6%) acharam ótimo, 19 (67,9%) bom e um paciente como ruim (3,6%). Não houve diferenças estatísticas entre os grupos (Tabela 2).

   A quantidade de líquido presente no interior do cólon durante o exame foi considerada pouca em 63% dos pacientes que utilizaram o PEG (17 pacientes), e em 57,1% daqueles que utilizaram o manitol a 20% (16 pessoas). Em oito indivíduos (29,6%) do grupo do PEG e em seis do manitol a 20% (21,4%), esta quantidade foi avaliada como moderada e foi considerada como muita em dois (7,4%) e seis (21,4%) casos nos grupos do PEG e Manitol a 20%, respectivamente (Tabela 3). Também não houve diferenças estatísticas entre os grupos.

DISCUSSÃO
Um dos passos mais importantes no diagnóstico de lesões do intestino grosso durante a colonoscopia é o preparo adequado do mesmo, pois um cólon preparado inadequadamente pode fazer com que o examinador deixe passar desapercebidas lesões ocultadas por resíduos fecais (AREZZO, HABR-GAMA et al 1999). Ao longo do tempo, diferentes métodos de preparo, com diferentes produtos foram utilizados (AREZZO), sendo o polietilenoglicol (PEG) e o manitol as soluções de preparo oral mais comumente usadas, tendo vantagens e desvantagens (HABR-GAMA et al 1981, NAHAS SC et al, HABR-GAMA et al 1999), e proporcionando bons resultados no preparo do cólon (HABR-GAMA et al 1999).
   As soluções de PEG foram introduzidas em 1980, havendo um aparente aumento na tolerância do preparo pelos pacientes (AREZZO, KOLTZ B). Apesar do uso de grande quantidade do volume da solução a ser ingerido durante o preparo (AREZZO), é um método efetivo para o preparo intestinal para a colonoscopia (AMBROSE NS et al, AREZZO, CHURCH JM).
   Mesmo sendo um método seguro, o manitol tem sido criticado e seu uso restringido em alguns centros dos Estados Unidos, em virtude dos riscos de explosão durante eletrocauterização como resultado da fermentação do manitol pelas bactérias intestinais produtoras de metano e hidrogênio (BIGARDI MA et al, KEIGHLY MR et al, AVGERINOS A et al, HABR-GAMA et al 1999). Este risco é eliminado pelo uso do PEG, que também é osmoticamente neutro (HABR-GAMA et al 1999). Não pudemos aferir este risco em nosso estudo, pois não houve necessidade de realizarmos procedimentos terapêuticos em nenhum dos pacientes deste estudo.
   Em estudo realizado por BECK DE et al, foi comparado o uso da solução de manitol a 10% com o polietilenoglicol (PEG) para o preparo intestinal pré-operatório em 80 pacientes, sendo observado que ambos os métodos são seguros e efetivos. Da mesma forma que em nosso estudo, foi verificada uma melhor limpeza do cólon (90% de ótima limpeza vs. 75%) naqueles que fizeram uso do PEG. Entretanto, a tolerância dos pacientes que fizeram uso do preparo intestinal com PEG foi superior àqueles que utilizaram manitol, o que não ficou comprovado nesse trabalho, não havendo diferença estatística entre os grupos com relação ao grau de satisfação.
   CHURCH JM et al (1998) estudaram 317 pacientes, que foram randomizados para o uso de PEG na manhã do exame (grupo 1) ou na tarde anterior a colonoscopia (grupo 2), não sendo informado ao examinador o momento da ingestão do produto. Ambos os grupos eram semelhantes quanto à idade, sexo, indicação do exame e cirurgia colônica prévia. Os pacientes que ingeriram PEG tiveram um melhor preparo intestinal que os do grupo com manitol, corroborando os achados de nosso estudo, e concluindo que a hora da administração do PEG é um determinante maior da qualidade do preparo.
   De forma semelhante, este estudo verificou um melhor preparo do cólon nos pacientes submetidos ao exame colonoscópico após preparo com o PEG. Não foram detectadas diferenças estatísticas com relação ao grau de satisfação dos pacientes, ou quantidade de líquido no cólon durante o exame.

CONCLUSÃO
Podemos concluir que o preparo intestinal para colonoscopia utilizando o polietilenoglicol é superior àquele com manitol, entretanto sem haver diferenças do ponto de vista de satisfação do paciente, ou com relação à quantidade de líquido no interior do cólon durante o exame colonoscópico.

ABSTRACT: With the aim of studying comparatively intestinal prepare for colonoscopy, 55 patients were randomly distributed into two groups that used polyethylene glycol (PEG) and mannitol solution. The quality of bowel prepare in the group that used PEG was considered excellent in 12 patients (44,4%), good in 15 (55,6%) and bad in no cases, while in those prepared with manitol the quality of intestine preparation was, respectively, eight (28,6%), 12 (42,9%) and eight (28,6%) patients. The difference was considered statistically significant (p=0,010). There wasn't any statistical difference between the groups when we compared the satisfaction degree of the patients or the amount of liquid in the colon during the colonoscopy. We can conclude that the quality of bowel preparation for colonoscopy with PEG is superior to manitol.

Key words: Colonoscopy; Bowel Preparation; Mannitol; Polyethylene Glycol.

Referências
1. AMBROSE NS, JOHNSON M, BURDON DW, KEIGHLEY MR _ A physiological appraisal of polyethyleneglycol and a balanced electrolyte solution as bowel preparation. Br J Surg; 70(7):428-430, 1983.
2. AREZZO A _ Prospective randomized trial comparing bowel cleaning preparations for colonoscopy. Surgical Laparoscopy, Endoscopy and Percutaneous Techniques; 10(4):215-217, 2000.
3. AVGERINOS A, KALAANTZIS N, REKOUMIS G, PALLIKARIS G, ARAPAKIS G, KANAGHINIS T _ Bowel preparations and the risk of explosion during colonoscopic polypectomy. Gut; 25(4):361-364, 1984.
4. BECK DE, FAZIO VW, JAGELMAN DG _ Comparison of oral lavage methods for preoperative colonic cleansing. Dis Colon Rectum; 29(11):699-703, 1986.
5. BIGARD MA, GAUCHER P, LASSALE C _ Fatal colonic explosion during colonoscopic polypectomy. Gastroenterology; 77(6):1307-1310, 1979.
6. CHURCH JM _ Effectiveness of polyethylene glycol antegrade gut lavage bowel preparation for colonoscopy—timing is the key! Dis Colon Rectum; 41(10):1223-5, 1998.
7. HABR-GAMA A, TEIXEIRA MG, ALVES PR et al. - Emprego da solução de manitol a 10% no preparo do intestino grosso para colonoscopia e cirurgia. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo; 36():239-243, 1981.
8. HABR-GAMA A, BRINGEL RWA, NAHAS SC, ARAÚJO SEA, SOUZA Jr AH, CALACHE JE, ALVES PA - Bowel preparation for colonoscopy: comparison of mannitol and sodium phosphate. Results of a prospective randomized study. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo; 54(6):187-192, 1999.
9. HUPPERTZ-HAUSS G, BRETTHAUER M, SAUAR J, PAULSEN J, KJELLEVOLD ?, MAJAK B, HOFF G _ Polyethylene glycol versus sodium phosphate in bowel cleansing for colonoscopy: a randomized trial. Endoscopy; 37(6):537-541, 2005.
10. KEIGHLEY MR, TAYLOR EW, HARES MM, ARABI Y, YOUNGS D, BENTLEY S, BURDON DW _ Influence of oral mannitol bowel preparation on colonic microflora and the risk of explosion during endoscopic diathermy. Br J Surg; 8(8):554-556, 1981.
11. KOLTS B, LYLES W, ACHEM S, BURTON L, GELLER A, MACMATH T _ A comparison of effectiveness and patient tolerance of oral sodium phosphate, castor oil, and standard electrolyte lavage for colonoscopy and sigmoidoscopy preparation. Am J Gastroenterol; 88:1218-1223, 1993.
12. NAHAS SC, OLIVEIRA FILHO DES, ARAÚJO SE et al. - Colonoscopia: indicações, contra-indicações e complicações. Rev Hosp Clin Fac Med São Paulo; 53(2):91-99, 1998.
13. SAUNDERS BP, MASAKI T, FUKUMOTO M, HALLIGAN S, WILLIAMS CB - The quest for a more acceptable bowel preparation: comparison of a polyethyleneglycol/electrolyte solution and a mannitol/picolax mixture for colonoscopy. Postgrad Med J; 71(838):476-479, 1995.

Endereço para correspondência:
BENÍCIO LUIZ BULHÕES PAULA NUNES
Rua Cláudio Ramos, 790 / apto. 402
Ponta Verde - Alagoas
CEP 57035-020
E-mail: cbnunes@uol.com.br

Recebido em 02/06/2006
Aceito para publicação em 16/06/2008

Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital Universitário "Prof. Alberto Antunes" da Universidade Federal de Alagoas - UFAL - Alagoas - Brasil.