ARTIGOS ORIGINAIS
A PRESENÇA DE RETOCELE INTERFERE NOS RESULTADOS DE EXAMES DE FISIOLOGIA ANAL?
Rectocele Influences Results of Anal Physiological Examinations?
Maria Auxiliadora Prolungatti Cesar1; Wilmar Artur Klug2; Helly Angela Caram Aguida3; Jorge Alberto Ortiz4; Fang Chia Bin5; Peretz Kapelhuchnik6
1 Mestre e Doutora em Cirurgia - Área de Coloproctologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Professor Assistente Doutor da Universidade de Taubaté; 2 Professor Titular Livre Docente da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Chefe da Área de Coloproctologia; 3 Mestre em Cirurgia - Área de Coloproctologia - Pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; 4 Mestre em Cirurgia - Área de Coloproctologia - Pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Responsável pelo Ambulatório de Fisiologia Anal do Departamento de Cirurgia _ Área de Coloproctologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; 5 Mestre e Doutor em Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; 6 Professor Titular Livre Docente da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - Brasil.
Resumo: INTRODUÇÃO - A retocele é causa comum de constipação por defecação obstruída. Freqüentemente está relacionada com outras causas de defecação obstruída, e os exames de fisiologia anal são importantes para o diagnóstico preciso da causa de constipação intestinal. OBJETIVO - observar a influência da retocele nos exames de fisiologia anal, e a necessidade da realização desses após o diagnóstico da retocele. MÉTODO - Para este trabalho foram estudados 40 pacientes com diagnóstico de defecação obstruída. Todos os pacientes foram submetidos aos exames de manometria, sensibilidade retal, eletromiografia, latência do nervo pudendo e proctografia, e foram separados em 2 grupos: portadores e não portadores de retocele . Foram encontrados 18 pacientes com retocele, e o diagnóstico mais freqüentemente associado foi o anismus . Em relação aos exames foi encontrada diferença significante apenas na proctografia no ângulo ano retal, demonstrando que a presença de retocele não interferiu nos resultados de exames de fisiologia anal quando comparados com outros constipados, mas esteve associada a outras causas de constipação, como anismus que necessita de outro tipo de tratamento. CONCLUSÃO - A retocele não interferiu nos valores dos exames de fisiologia anal, mas esteve associada a outros diagnósticos, sendo importante a realização dos mesmos.
Descritores: Retocele; Constipação Intestinal; Técnicas de Diagnóstico e Procedimentos.
1. INTRODUÇÃO
A constipação intestinal pode ser definida
como a ocorrência de menos que três evacuações por
semana ou evacuação com dificuldade, incompleta ou
prolongada (13; 12; 11) podendo se classificar em 2
tipos principais : transito colônico lento ou inércia colônica
e defecação obstruída (2; 3 ; 7; 6).
Dentre as causas da defecação
obstruída a retocele é uma bolsa da parede anterior do
reto e da parede vaginal posterior para a luz da
vagina, e que freqüentemente é encontrada quando
as pacientes são investigadas por constipação
(8), considerada clinicamente quando maior que 20 mm. (5)
É achado comum e pode ser considerada
uma variável normal, e sua contribuição na
desordem evacuatória é complexa e não clara (10;4).
São sintomas da retocele o esvaziamento
incompleto, sensação de pressão retal e sintomas
vaginais. Pacientes constipados usualmente tem
sintomas similares (8,9).
O diagnóstico se faz através do exame
físico e/ou da proctografia, sendo que o seu tamanho é
calculado durante o esforço como a distância do ápice
da parede anterior do reto para uma linha no eixo do
canal anal. É encontrada em 25% das proctografias de
constipados (7,8,9).
O objetivo deste trabalho é rever os
pacientes cujo diagnóstico no ambulatório de fisiologia anal
foi retocele, e observar as variações dos exames de
fisiologia anal verificando a importância da realização
dos mesmos.
2. CASUÍSTICA E MÉTODO
3. RESULTADOS
4. DISCUSSÃO
5. CONCLUSÃO
Abstract: INTRODUCTION - Rectocele is a common cause of constipation for obstructed defecation. It often is related
with other causes of outlet obstruction and the examinations of anal physiology tests are important for necessary diagnosis of
the constipation cause. OBJECTIVE - To observe the influence of rectocele in the anal physiology tests and the necessity of
its accomplishment to the diagnosis of rectocele. METHOD In this study, 40 patients with diagnosis of outlet obstruction had
been analyzed. All the patients had been submitted to manometry, rectal sensitivity, electromyography, pudendal nerve latency
and proctography and they had been separated in 2 groups: carriers and non-carriers of rectocele. 18 patients with rectocele had
been found and the diagnosis often associated was anismus. In relation to the examination there was significant difference only in
the proctography in the rectal angle, demonstrating that the presence of rectocele did not intervene with the results of the
examination of anal physiology when compared with the other constipated, but it was associated with other causes of constipation such as anismus that needs another type of treatment. CONCLUSÃO - Rectocele did not intervene with the values of the
examination of anal physiology, but it was associated with other diagnosis, therefore it is important the accomplishment of the examination.
Key words: Rectocele; Constipation; Physiological Examinations.
Referências
Endereço para correspondência:
Recebido em 09/06/2008
O trabalho realizado consistiu no estudo de fichas de 40 pacientes com constipação
intestinal, provenientes do ambulatório de
Fisiologia anal da área de coloproctologia da Santa
Casa de Misericórdia de São Paulo, e que
realizaram os exames completos de fisiologia anal pela
autora.
Manometria Ano-Retal
Utilizado o aparelho Proctosystem PL-3000, manômetro de balão. Os exames foram realizados
sem preparo intestinal, colocando-se o paciente em
decúbito lateral esquerdo.
Foram consideradas a maior pressão de
repouso obtida, a maior pressão de contração e a menor
pressão de evacuação no canal anal. No reto foi
considerada a máxima pressão retal de repouso e a
máxima pressão retal de evacuação.
Sensibilidade Retal
Avaliada através da utilização de um
balão confeccionado com preservativo, com forma
alongada, de aproximadamente seis centímetros de
comprimento conectado à uma sonda retal, e esta à uma seringa
de 50 ml.
a) Menor volume sensível: era o limiar, o
primeiro volume que provocava o desejo de evacuar ou
a primeira sensação de peso retal que desaparecia
após 30 segundos.
b) Volume de Sensação Constante: o ar
insuflado promovia um desejo de evacuar que era
permanente.
c) Volume máximo tolerável: era o volume
máximo que promovia um desejo incontrolável de
evacuar.
d) Evacuação do balão: o paciente em
decúbito lateral esquerdo era solicitado a realizar o
esforço evacuatório para evacuar o balão. Não era
ajudado inicialmente pelo examinador.
Proctografia
Introdução de 120 ml de contraste
baritado na ampola retal através de sonda retal, com o
paciente em decúbito lateral esquerdo. Após a
introdução do contraste eram realizadas três
radiografias na posição lateral em repouso, contração e
evacuação.
Na avaliação das proctografias foram
traçadas as seguintes linhas nas três radiografias:
b) Canal anal: linha que se inicia no orifício
anal e se estende até a junção ano-retal;
c) Eixo retal: linha marcada no eixo longitudinal do reto em sua parede posterior.
Após traçadas as linhas foram realizadas
as seguintes medidas:
a) Posição de diafragma pélvico: medida
entre a extremidade superior do canal anal e a linha
pubo-coccígea através de uma linha perpendicular;
b) Posição perineal: medida entre a
extremidade inferior do canal anal e a linha pubo-coccígea
através de uma linha perpendicular;
c) Medida do canal anal;
d) Ângulo ano-retal: medido entre o eixo
do reto e do canal anal no ponto de interseção das
linhas.
Período de Latência do Nervo Pudendo
Realizado através da introdução de
luva apropriada com eletrodo na ponta do dedo
indicador e em sua base. Eram dados estímulos ao nível
da espinha isquiática nas proximidades do
nervo pudendo, aferindo-se o tempo entre o estímulo
no nervo pudendo e a resposta ao nível do ânus.
Os valores considerados normais estavam no
intervalo de 1,8 a 2,3 ms.
Dos 40 pacientes 18 eram portadores de retocele e 22 não portadores, sendo os dois grupos
comparados em relação aos resultados dos exames de
fisiologia anal.
A análise estatística se fez através do teste
t de Student para comparação de médias, controlado
pelo teste de Levene para igualdade das variâncias.
Foram estudados 40 pacientes com queixas de constipação intestinal por defecação
obstruída, sendo todos submetidos à avaliação completa
através dos métodos disponíveis no laboratório de
fisiologia anal.
A retocele esteve presente em 18 dos 40 pacientes constipados (45%). Em quatro dos 18
pacientes portadores de retocele (22,22%) esta foi a única
causa de constipação. A contração paradoxal do
pubo-retal foi a causa de defecação obstruída mais
freqüentemente associada à retocele, e ocorreu em 8 dos 18
pacientes (44,44%), a intussuscepção ocorreu em cinco dos
18 (27,77%), e a sigmoidocele em quatro dos 18 (22,22%).
Em dez dos 18 pacientes (55,56%) houve uma causa associada, em três dos 18 pacientes (16,66%)
2 causas associadas, em um dos 18 pacientes (5,56%)
3 causas associadas, e foi a causa única em quatro
dos 18 pacientes (22,22%).
Os pacientes foram divididos em dois grupos: 18 eram portadores de retocele e os demais
(22 pacientes) não apresentavam esta afecção.
Os dois grupos não apresentaram
diferenças estatisticamente significantes em relação à ritmo
intestinal com a utilização de laxantes, ritmo
intestinal sem a utilização de laxantes, duração da queixa,
paridade e idade.
Através da manometria foram observadas
que as médias das pressões de repouso, contração e
evacuação não apresentaram diferença
estatisticamente significante (Tabela 1).
A avaliação da sensibilidade retal em
pacientes portadores de retocele, comparados com os
sem retocele, não mostram diferenças significantes,
embora o volume máximo tolerável fosse maior no
grupo com retocele (Tabela 2).
A latência do nervo pudendo também não
demonstrou diferenças estatisticamente significantes
entre os grupos estudados (Tabela 3).
Observando as proctografias de portadores de retocele e não portadores de retocele, pudemos
verificar que existiram diferenças
estatisticamente significantes entre constipados com e sem retocele
em relação ao ângulo ano-retal na contração, posição
de diafragma pélvico e posição perineal na
evacuação (Tabela 4).
A retocele é causa importante da
constipação intestinal por defecação obstruída. Os critérios
diagnósticos variam, há os que consideram os aspectos
clínicos, e alguns autores quando é achado exclusivo
da proctografia e não de exame físico e história.
Esses autores consideram a retocele, e a esta indicam
tratamento cirúrgico de acordo com história, exame físico
e tamanho maior que dois centímetros na
proctografia (7,8,9).
Em vista dos resultados obtidos através
da proctografia pudemos verificar que, além da história
e do exame físico, este é o método mais importante
no diagnóstico de retocele. A mesma foi encontrada
em 18 dos 40 (45%)pacientes, sendo que foi
diagnóstico isolado em quatro dos 18 pacientes (22,22%),
associado a contração paradoxal do pubo-retal em oito dos
18 pacientes (44,44%).
Quando estudamos os resultados em pacientes com e sem retocele através da manometria,
sensibilidade retal, eletromiografia, latência do nervo
pudendo e proctografia não observamos diferenças
estatisticamente significantes, como podemos observar na
Tabs. 1,2,3 e 4 .
Como pudemos observar no estudo da eletromiografia, 36,84% dos portadores de
retocele apresentaram aumento da atividade mioelétrica no
esforço evacuatório, refletindo algum grau de
contração paradoxal do músculo pubo-retal. Esse dado é
importante, pois é mecanismo associado na gênese da
constipação, e pode necessitar de outro tipo de
abordagem terapêutica.
Apesar de não ocorrer diferença
estatisticamente significante entre os valores dos
exames de fisiologia anal, a importância de se estudar a
influência da retocele nos exames existe, pois
como pudemos observar encontramos outros
diagnósticos associados e a presença desses pode levar a
um resultado ruim no tratamento , como por
exemplo, quando existe a contração paradoxal do
puborretal, que deve ser tratada antes da correção cirúrgica
da retocele.
A retocele não interferiu nos valores dos
exames de fisiologia anal, mas esteve associada a
outras causas de constipação demonstradas através dos
exames , sendo importante a realização dos mesmos
mesmo com o diagnóstico prévio de retocele.
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MARIA AUXILIADORA PROLUNGATTI CESAR
RUA VINICIUS DE MORAES , 434 - CAMPOS DO CONDE I
TREMEMBÉ - SP
Aceito para publicação em 19/06/2008
Trabalho Realizado Na Área de Coloproctologia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - Brasil.