ARTIGOS ORIGINAIS
FECHAMENTO DE COLOSTOMIAS: COM OU SEM ESTUDO DO CÓLON?
Colostomy Closure: With or Without Pre-Operative Colon Study
HERNÁN AUGUSTO CENTURIÓN SOBRAL1; RODRIGO BRITTO DE CARVALHO1; JULIANA BARRETO SALEM1; LETÍCIA SARMANHO1; IDBLAN CARVALHO DE ALBUQUERQUE2; GALDINO JOSÉ SITONIO FORMIGA3
1 Ex-Médicos Residentes do Serviço de Coloproctologia do Hospital de Heliópolis, FSBCP; 2 Médico Assistente do Serviço de Coloproctologia do Hospital de Heliópolis, TSBCP; 3 Chefe do Serviço de Coloproctologia do Hospital de Heliópolis, TSBCP.
RESUMO: O estudo pré-operatório do cólon para fechamento de colostomias em alça devido a trauma vem perdendo importância nos últimos anos. A necessidade de se avaliar as alterações anatômicas pós-traumáticas do cólon vai de encontro aos custos, desconforto e morbidade dos exames. Objetivo: analisar a real necessidade do estudo prévio do cólon no fechamento de colostomia pós-trauma. Método: foram analisados, retrospectivamente, 98 prontuários de pacientes, no período de janeiro de 2004 a janeiro de 2006, portadores de colostomia em alça confeccionada após traumatismo e que foram alocados em dois grupos: grupo A, composto de 32 casos com estudo do cólon e o grupo B, 66 casos sem estudo colônico prévio. Resultados: 94,9% dos pacientes eram do sexo masculino e a média de idade foi de 27 anos. O tempo de permanência da colostomia foi, em média, 32,8 meses, sendo o flanco esquerdo a localização mais comum em ambos os grupos. A morbidade geral foi de 7,1%, sendo 3,1% de complicações no grupo A e 9,1% no grupo B (p=0,16) e sem mortalidade. A complicação mais freqüente foi hematoma da parede abdominal em cinco casos (5,1%), e apenas um caso de infecção de ferida operatória (1%), e mais um de deiscência de anastomose (1%). Conclusão: o estudo pré-operatório do cólon para fechamento de colostomia feita após trauma colorretal é dispensável.
Descritores: Colostomia, alça, fechamento de colostomia, enema opaco, colonoscopia.
INTRODUÇÃO
A partir da Segunda Guerra Mundial a confecção de colostomias temporárias vem sendo
utilizada como tratamento para ferimentos
traumáticos colorretais1. Apesar de o fechamento de
colostomia ser caracterizado como procedimento de fácil
execução, a literatura relata taxas de morbidade que
variam de 10 a 49%2,3, portanto, o uso do estudo
pré-operatório do cólon, com enema opaco
ou colonoscopia, acabou se tornando um dogma
cirúrgico. Contudo, Demetriades e cols, em 1988, e Sola
e cols, em 1994, questionaram sobre a real
necessidade destes exames 4,5.
O objetivo deste trabalho é verificar a real
necessidade do estudo do cólon pré-operatório para o
fechamento de colostomia em alça realizada
após traumatismo colorretal.
MÉTODO
Estudo retrospectivo de 98 prontuários de
enfermos com colostomia em alça por ferimento
traumático colorretal do Serviço de Coloproctologia do
Hospital Heliópolis São Paulo - SP, entre janeiro de 2004
e janeiro de 2006, separados em dois grupos: grupo
A formado por 32 casos com estudo pré-operatório
do cólon por enema opaco ou colonoscopia, e grupo
B com 66 pacientes sem estudo colônico prévio.
O exame físico admissional era
caracterizado por avaliação da colostomia e pelo exame
proctológico. Os exames pré-operatórios realizados
foram: hemograma, coagulograma e radiografia simples
do tórax.
Em todos os doentes foi realizado o preparo intestinal misto, com ingestão de solução de manitol
a 10% e irrigação do intestino excluso com
solução glicerinada a 12%, na véspera da cirurgia, por via
retal ou via colostomia. A antibioticoprofilaxia,
administrada 30 minutos antes da indução anestésica, consistia
em 0,5g de metronidazol, 1g de amicacina e 1g de ampicilina.
As variáveis estudadas foram idade, sexo,
tipo do trauma colorretal, localização e avaliação do
ostoma, tempo de permanência da colostomia, além da
técnica cirúrgica e evolução clínica pós-operatória.
Os dados obtidos foram inseridos no programa Epi info 3.2.2, e submetidos aos testes estatísticos
do Qui-quadrado e T-students, com p
estatisticamente significante quando menor que 0,05.
RESULTADOS
A idade variou de 13 a 57 anos com média
de 27 anos, sendo a maioria (94,9%) do sexo
masculino. O tipo do trauma que levou à realização da ostomia
foi ferimento por arma de fogo (FAF) em 92
pacientes, empalamento em quatro, e ferimento por arma
branca (FAB) em dois casos. (Figura 1)
Figura 1 - Causas da confecção das ostomias. |
Figura 2 - Localização das ostomias. |
Figura 3 - Distribuição das complicações. |
Figura 4 - Alta hospitalar. |
DISCUSSÃO
Atualmente, o estudo intestinal
pré-operatório radiológico ou endoscópico, sobretudo do
segmento excluso, tem sido
dispensado2,4,6,10,11. A utilização
destes exames era recomendada para certificar-se da
integridade intestinal, e avaliar a existência de
alguma doença
concomitante6-9. No entanto, enema opaco
e colonoscopia, apesar de exames com morbidade baixa, ocasionam aumento dos custos, desconforto para
o paciente e atraso para o fechamento da
colostomia. Além disso, estes exames estão normais na sua
maioria, não alterando a conduta terapêutica e, deste
modo, vários autores têm sugerido não realizá-los de
forma rotineira2,4,6,10,11.
Maximiano e cols, em 1995, ao estudarem 89 pacientes, encontraram anormalidades no
enema opaco pré-operatório em apenas 4,5% dos casos
que já tinham sido identificadas ao exame
clínico11. Nenhum dos nossos 32 doentes que realizaram
avaliação colônica prévia tinham alterações que
impossibilitariam o procedimento cirúrgico. Outro fator
relevante quanto à realização rotineira do estudo
pré-operatório do cólon é o fato da amostra
estudada ser jovem, com média de idade de 27 anos, onde
a possibilidade de se encontrar doença colônica
associada é baixa5.
O tempo de permanência da ostomia foi, em média, 32,8 meses, indo de encontro ao da
literatura consultada, que variou de 5,7 a 9,8
meses4,11. Justifica-se o tempo prolongado de permanência da ostomia,
por se tratar de pacientes oriundos de outros serviços
de saúde, inclusive de unidades penitenciárias.
Foi verificada que a realização de preparo
retrógrado com solução glicerinada a 12% nos dava
noção da perviedade intestinal nos doentes sem
estudo intestinal prévio.
A taxa de morbidade no grupo A foi de 3,1% e no grupo B, 9,1%
(p=0,16), com índice total de 7,1% de complicações imediatas (sete casos). Houve
cinco casos de hematoma de parede abdominal e um de
infecção de ferida operatória, menor que a de
autores que utilizaram em todos os doentes estudo do
cólon, como Pokorny e Madiba, com morbidade de 15
e 14,5%, respectivamente6,12. O único caso de
deiscência de anastomose (1%) do grupo estudado foi
verificado em paciente sem estudo do cólon, que culminou
com nova intervenção cirúrgica e colostomia a
montante, uma vez que a anastomose já se encontrava
bloqueada e integrada.
Apesar da idade do paciente, o motivo para confecção da colostomia, o local e o tempo de
permanência do ostoma, bem como o uso de drenos
serem considerados fatores relacionados com a
morbidade operatória, é sabido que o único fator que reduz o
índice de complicações pós-operatórias é a
antibiótico-profilaxia5.
Concluímos que o estudo pré-operatório
do cólon no paciente portador de colostomia em alça
após lesão traumática colorretal, é perfeitamente
dispensável.
ABSTRACT: The pre-operative study of the colon before loop colostomy closure in trauma patients has been loosing its importance since last few years. The need of evaluating the pos-traumatic anatomic alterations of the colon goes against the costs and morbidity of the examinations. Objective: to analyze the real necessity of the colon study before colostomy closure in trauma patients. Methods: a retrospective study of 98 patients submitted to colostomy closure after trauma, from January of 2004 to January of 2006 was carried out. They were divided in two groups: group A, composed of 32 patients with previews colon study and group B, composed of 66 patients without it. Results: 94.9% of all patients were male and the average age was 27 years old. The time interval between colostomy and its closure was in average 32.8 months. The left side location was the most common sight. Overall morbidity was 7.1%, being 3.1 % in group A and 9.1% in group B (p=0,16). The operative mortality was zero in both groups. The most common complication was wound haemathomas (5,1%) and only one case of wound infection. Anastomosis dehiscence occurred also in only one case, from group B. Conclusion: the pre-operative study of the colon for loop colostomy closure in trauma patients is not necessary.
Key words: Colostomy closure, loop colostomy, barium enema, colonoscopy.
Referências
1. Garber HI; Morris DM; Eisenstat TE; Coker DD;
Annous MO. Factors influencing the morbidity of colostomy
closure. Dis Colon Rectum 1982;25(5):464-70.
2. Garnjobst W; Leaverton GH; Sullivan ES. Safety of
colostomy closure. Am J Surg 1978;136(1):85-9.
3. Yakimets WW. Complications of closure of loop
colostomy. Can J Surg 1975;18(4):366-70.
4. Sola JE; Buchman TG; Bender JS. Limited role of
barium enema examination preceding colostomy closure in
trauma patients. J Trauma 1994;36(2):245-6.
5. Demetriades D; Pezikis A; Melissas J; Parekh D; Pickles
G. Factors influencing the morbidity of colostomy closure. Am
J Surg 1988;155(4):594-6.
6. Madiba TE; Mahomva O; Haffejee AA; Nene B.
Radio-contrast imaging of the rectum prior to colostomy closure for
rectal trauma - is routine use still justified? S Afr J
Surg 2000;38(1):17-8.
7. Atweh NA; Vieux EE; Ivatury R; Scalea TM; Duncan
AO; Gordon J et al. Indications for barium enema
preceding colostomy closure in trauma patients. J
Trauma 1989;29(12):1641-2.
8. Thal ER; Yeary EC. Morbidity of colostomy closure
following colon trauma. J Trauma 1980;20(4):287-91.
9. Parks SE; Hastings PR. Complications of colostomy
closure. Am J Surg 1985;149(5):672-5.
10. Swenson K; Stamos M; Klein S. The role of barium enema
in colostomy closure in trauma patients. Am Surg 1997;63(10):893-5.
11. Maximiano LF; Moron RA; Soh SW; Alves Jr A; Pires
PWA; Bevilacqua RG; Biroloni D. Análise da necessidade do
enema opaco como exame pré-operatório em fechamento
de colostomias. Rev Col Bras Cir;1995;22(2):70-2.
12. Pokorny RM; Heniford T; Allen JW; Tuckson WB;
Galandiuk S. Limited utility of preoperative studies in preparation
for colostomy closure. Am Surg 1999;65(4):338-40.
Endereço para correspondência:
GALDINO JOSÉ SITONIO FORMIGA
Hospital Heliópolis _ Serviço de Coloproctologia
Rua Cônego Xavier, 276 _ Vila Heliópolis
04231-030 - São Paulo-SP
Tel: (11) 2274-7600 (Ramal 244)
Recebido em 24/05/2006
Aceito para publicação em 11/07/2008
Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliópolis, São Paulo-SP, Brasil.