RELATO DE CASOS


GRANULOMA ESQUISTOSSOMÓTICO GIGANTE DO CÓLON COM INTUSSUSCEPÇÃO: RELATO DE CASO

Giant Schistosomal Granuloma of the Colon with Intussusception: Case Report

RODRIGO BRITTO DE CARVALHO1, HERNÁN AUGUSTO CENTURIÓN SOBRAL2, JULIANA MAGALHÃES LOPES1, LILIAM RAMOS TODINOV2, GALDINO JOSÉ SITONIO FORMIGA3

1 Médicos residentes do Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliopólis; 2 Médicos Assistentes do Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliopólis; 3 Chefe do Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliopólis.


CARVALHO RB; SOBRAL HAC; LOPES JM; TODINOV LR; FORMIGA GJS. Granuloma Esquistossomótico Gigante do Cólon com Intussuscepção: Relato de Caso. Rev bras Coloproct, 2008;28(3): 347-349.

RESUMO: A esquitossomose é uma doença parasitária crônica causada por uma espécie de trematódeo, o shistossoma, acometendo 200 milhões de pessosas em todo mundo. No Brasil é provocada pela espécie Shistossoma mansoni, cuja apresentação clínica mais comum é a hepato-intestinal, com sintomas como diarréia, tenesmo, náuseas, meteorismo e hepato-esplenomegalia. Relatamos um caso de paciente masculino de 38 anos com quadro de exteriorização de tumor pelo ânus. A colonoscopia demonstou lesão nodular extra-mucosa em topografia de sigmóide. Submetido a sigmoidectomia, cujo anátomo-patológico mostrou tratar-se de granuloma esquistossomótico gigante, apresentação muito rara da esquistossomose.

Descritores: Esquistossomose, pólipo, intussuscepção, sigmóide, granuloma.

INTRODUÇÃO
A esquistossomose ou bilharziose é uma doença infecciosa granulomatosa causada por helmintos do gênero Shistossoma, sendo o S. mansoni o agente responsável no Brasil. A primeira citação da doença foi feita por Teodor Bilharz em18511. É uma afecção de grande prevalência, acometendo aproximadamente 200 milhões de pessoas em todo mundo, com outros 400 milhões com risco de serem infectados2.
   O objetivo deste trabalho é relatar um caso raro de pólipo esquistossomótico gigante de sigmóide com intussuscepção e exteriorização anal, não sendo encontrado outro relato semelhante na literatura consultada.

RELATO DO CASO
Paciente masculino, 38 anos, natural de Pernambuco, há três meses com prolapso de tumor anal aos esforços, hematoquezia, puxo e tenesmo. Exame parasitológico de fezes negativo. A colonoscopia evidenciou lesão polipóide extramucosa de 5 cm de diâmetro em sigmóide, que foi biopsiada e o exame histopatológico revelou processo inflamatório inespecífico. CT de abdome demonstrou lesão nodular endo-luminal com densidade de gordura e imagem em casca de cebola sugestiva de intussuscepção (Figura 1).
Figura 1 - CT de pelve com imagem nodular hipodensa na luz do reto.

   Devido à impossibilidade de ressecção endoscópica, o paciente foi submetido a sigmoidectomia (Figura 2), cujo anatomopatológico evidenciou granuloma piogênico com ovos de Shistossoma mansoni (Figuras 3, 4 e 5). Evoluiu no sétimo pós-operatório com quadro de abdome agudo obstrutivo, sendo submetido a laparotomia exploradora que demonstrou hérnia interna de íleo terminal sem sofrimento vascular, que foi prontamente corrigida.
Figura 2 - Aspecto da lesão no intra-operatório.

Figura 3 e 4 - Aspecto macroscópico após abertura da peça e da lesão.

Figura 5 - Anatomopatológico: granuloma esquistossomótico (HE/100X).

   O paciente foi submetido a tratamento complementar com praziquantel (40 mg/kg), recebendo alta ambulatorial após seis meses de acompanhamento.

DISCUSSÃO
A esquistossomose acomete aproximadamente 8% da população brasileira, sendo endêmica em certas regiões como o Nordeste, onde atinge até 20% dos habitantes1.
   Tem manifestação clínica variada, com duas fases evolutivas distintas: inicial ou aguda e crônica. A fase aguda conhecida como febre de Katayama, surge de um a dois meses após a infecção, com febre alta, mialgias, astenia, cefaléia e tosse seca. A fase crônica acomete principalmente o aparelho digestivo, com dispepsia, surtos diarréicos (em alguns casos sanguinolentos), meteorismo, tenesmo, hepato-esplenomegalia, e por fim sinais de hipertensão portal3.
   O diagnóstico é baseado no quadro clínico e na epidemiologia, e confirmado por exames laboratoriais que demonstram ovos do parasito nas fezes ou em biópsias1-5.
   Exames endoscópicos como retossigmoidoscopia ou colonoscopia podem auxiliar no diagnóstico, evidenciando hiperemia, ulcerações, friabilidade da mucosa e pólipos inflamatórios. Sanguino et al descrevem alterações vasculares características: interrupção súbita do vaso rodeado por petéquias com aspecto de "mordida de pulga" ou anel6.
   Histologicamente, caracteriza-se por granuloma não caseoso, com ovo do shistossoma central7,8. Santana et al relataram um caso de granuloma esquistossomótico gigante mimetizando tumor de sigmóide com sintomas obstrutivos9. No nosso caso a esquistossomose manifestou-se como um tumor polipóide gigante com intussuscepção e exteriorização pelo ânus, fato não descrito na literatura consultada.
   Intussuscepção é mais freqüentemente causada por tumores malignos, pólipos adenomatosos e lipomas, ocorrendo raramente em adultos. Pode ocorrer de forma oculta com sintomas inespecíficos como dor abdominal, náuseas e vômitos ou exteriorizar-se pelo ânus 10.
   O tratamento da esquistossomose é medicamentoso, com alta eficácia e baixa toxicidade. As drogas utilizadas são oxaminiquine (15mg/kg), agindo nas formas adultas, impedindo a oviposição e praziquantel (40 mg/kg), sendo eficaz tanto na fase aguda como na crônica1-3.
   Grande parte das intussuscepções é tratada cirurgicamente, pois geralmente se associam a neoplasia10, justificando a laparotomia com sigmoidectomia no nosso paciente, sendo o diagnóstico apenas dado pelo anatomopatológico.
   Agradecimento especial ao Serviço de Anatomia-Patológica do Hospital Heliópolis

Abstract: Shistosomiasis is a chronic parasitic illness caused by Shistossoma Mansoni, responsible for 200 million cases all over the world. The most common presentation is hepatic-intestinal form with symptoms as diarrhea, tenesmus, hepatomegaly, abdominal pain and nausea. We report a case of a male patient, 38 years with anal polyp prolapse, confirmed by colonoscopy, located in the sigmoid. The patient was submitted to sigmoidectomy, which through a histological study of the surgical specimen a giant shistosomal granuloma of the colon was evidenced. The aim of this report is to describe a rare and atypical manifestation of a case of shistosomosis. 

Key words: Shistosomiasis, polyp, sigmoid, intussusception, granuloma.

Referências
1. Motta LP, et al. Esquistossomose Mansoni-Estado Atual. JMB.1994; 66(3): 113-99.
2. Mutapi F, Mduluza T, et al. Immuno-epidemiology of human Shistosoma haematobiuminfection: preferential IgG3 antibody responsiviness to a recombinant antigen dependent on age and parasite burden. BMC Infectious Diseases. 2006; 6:96.
3. Vidal MAN, Torres Neto JR, Santana NMB, Salviano SKM, Déda RG. Esquistossomose Retal _ Aspectos Clínicos e Endoscópicos. Rev bras Coloproct. 2001; 21(2): 70-71.
4. Reis RJN, Ferreira AL, Ferreira JJ, Salazar HC. Esquistossomose mansoni: Diagnóstico pela biópsia retal e parasitológico em 100 casos selecionados. Rev bras Coloproct. 1984;4(2):99-101.
5. Rabello ALT et al. Dot-DYE-Imunoassay for the diagnosis of shistosomiasis mansoni. Mem Int Oswaldo Cruz. 1992; 87(2):187-190.
6. Sanguino J, Peixe R et al. Shistosomiasis and vascular alterations of colonic mucosa. Hepato-Gastroenterol. 1993;40:184-187.
7. Robbins P et al. Patologia functional. Ed. Guanabara-Koogan. Riode Janeiro.1998: 1047
8. Silva LM et al. Significance of Shistosomal Granuloma Modulation. Mem Int Oswaldo Cruz.2000;95(3):352-361.
9. Santana HJ, Lima CA. Pseudotumor esquistossomótico de cólon - relato de um caso. Rev bras Coloproct.1985; 5(1):17-21.
10. Ki-Jae P, Hong-Jo C, Sung-Heun K. Sigmoidorectal intussusception of adenoma of sigmoid colon treated by laparoscopic anterior resection after sponge-on-the-stick-assisted manual reduction. World J Gastroenterol.  2006;12(1):146-149.

Endereço para correspondência:
GALDINO JOSÉ SITONIO FORMIGA
Hospital Heliópolis - Serviço de Coloproctologia
Rua Cônego Xavier, 276 - Vila Heliópolis
04231-030 - São Paulo-SP
Tel: (11) 2274-7600 (Ramal 244)

Recebido em 05/05/2008
Aceito para publicação em 11/06/2008

Trabalho realizado no Serviço de Coloproctologia do Hospital Heliópolis - São Paulo - Brasil.