ARTIGOS ORIGINAIS
PESQUISA DE SANGUE OCULTO NAS FEZES E ACHADO COLONOSCÓPICO EM 60 PACIENTES
Fecal Occult Blood Test and Colonoscopy Diagnosis in 60 Patients
Miriam Piratininga Jatobá1; Paulo Azeredo Passos Candelária2; Wilmar Artur Klug3; Chia Bin Fang4; Peretz Capelhuchnik5
1 Estagiária da Disciplina; 2 Mestre em Cirurgia; 3 Professor Titular; 4 Professor Adjunto; 5 Professor Titular
RESUMO: Introdução: O carcinoma colo-retal ocorre em alta porcentagem, e é causa comum de morte. A maior incidência se dá nas mais altas faixas etárias, e tanto homens como mulheres são igualmente afetados. Há diferenças no risco para desenvolver carcinoma. Exames preventivos são importantes para reduzir a mortalidade. A pesquisa de sangue oculto nas fezes é um método antigo, mais simples que os demais e se baseia na idéia que os pólipos e os carcinomas sangram intermitentemente, e nos últimos anos houve maior interesse nessa técnica. Objetivo: avaliar as vantagens da pesquisa de sangue oculto nas fezes como método de triagem na detecção de lesões pré-malignas e malignas em nossa população sintomática, correlacionando-a com os resultados da colonoscopia. Método: realizou-se estudo em 60 pacientes da Santa Casa de São Paulo, sintomáticos e com indicação de colonoscopia, que haviam antes realizado pesquisa de sangue oculto nas fezes com o método da benzidina. Resultados: A média das idades foi de 54,2 anos, variando de 12 a 92 anos, sendo 31 mulheres e 28 homens. Os resultados dos exames de sangue oculto foram positivos em 25 e negativos em 34. Várias lesões causadoras de sangramento foram diagnosticadas, e observamos que nos cálculos aritméticos sobre os resultados, a pesquisa do sangue oculto revelou sensibilidade de 63,7%, especificidade de 81%, valor preditivo positivo de 28% e negativo de 88%. Conclusão: os resultados da aplicação de um método de triagem mostra que a pesquisa do sangue oculto fecal pela benzidina, é exame de eleição para ser aplicado em programas sociais de prevenção de carcinoma colo-retal para pacientes sintomáticos.
Descritores: Sangue oculto nas fezes, colonoscopia, carcinoma, cólon e reto.
INTRODUÇÃO
O carcinoma colo-retal ocorre em elevada porcentagem e é causa comum de morte. A
sobrevivência melhorou nas últimas décadas, houve
melhora e avanços terapêuticos e ênfase em programas de
prevenção 1. A maior incidência se dá nas faixas
etárias maiores, e tanto homens como mulheres são
igualmente afetados. Há diferenças no risco para
desenvolver carcinoma. O risco alto corresponde a algumas
condições hereditárias como polipose familiar e
carcinoma colo-retal hereditário (HNPCC). Por estas razões
há diversos métodos de triagem, sendo a pesquisa do
sangue oculto nas fezes anual adequado para o risco
comum (baixo), ficando a colonoscopia indicada no
risco médio e alto.
As tentativas de prevenção interferem na
progressão de um pólipo benigno para um carcinoma,
que se dá entre 5 e 10 anos 1. Considerando que o
carcinoma colo-retal está relacionado aos pólipos, o
diagnóstico precoce deles e sua remoção permite diminuir a
incidência do carcinoma 2, 3.
Dentre as técnicas de triagem citam-se o
exame de sangue oculto nas fezes, enema opaco, retossigmoidoscopia flexível e colonoscopia, como
também outras alternativas como o teste como DNA
e colonoscopia virtual, válidas e recomendadas para
pessoas com risco comum (baixo) com idade maior de
50 anos. Já a colonoscopia é o método preferencial
para identificar o carcinoma 4 . Ela oferece as vantagens
de visualização completa do cólon associadas ao
potencial terapêutico. O exame é recomendado depois de
resultados positivos obtidos em outros testes de
triagem e a remoção de todo pólipo visível resulta em
redução de 76% a 90% da incidência de carcinoma
5. Contudo, não há provas que demonstrem a superioridade
da colonoscopia sobre outras técnicas de triagem,
nem qualquer informação indicando diretamente que
um programa periódico de colonoscopia resulte em
redução na mortalidade para pessoas com risco comum
1. Havendo adenomas, estão estabelecidos critérios
para a freqüência de novos exames, bem como para
acompanhar pacientes após polipectomias ou ressecções
por carcinoma. A sensibilidade da colonoscopia
convencional para detecção de lesões é de 87,5%, e se feita
por profissionais experientes aumenta para mais de 95%
6.
Procedimentos de baixo custo e de fácil
execução também são utilizados para a detecção
precoce do carcinoma. A sigmoidoscopia de fibra ótica
está substituindo o instrumento rígido como método de
triagem, pois tem melhor custo-benefício como método
de triagem quando comparada ao exame de sangue
oculto nas fezes e colonoscopia 7. Entretanto,
a sigmoidoscopia e a pesquisa de sangue oculto nas
fezes têm resultados similares 8. Embora o enema
opaco possa ser usado teoricamente na triagem de
pacientes assintomáticos, a carga de trabalho, os gastos e o
desconforto são grandes. Já a colonoscopia virtual
mostra um resultado promissor na detecção de pólipos
maiores ou iguais a 10 mm, mas a sensibilidade varia de
55 a 94% 9 .
A pesquisa de sangue oculto nas fezes é
um método utilizado desde 1864. É mais simples que
os demais e se baseia na idéia de que os pólipos e os
carcinomas sangram, e há interesse nessa técnica.
Vários estudos mostraram redução da mortalidade por
carcinoma 2,3,10 , mas sua limitação se deve à baixa
sensibilidade. Em nosso meio um recente estudo concluiu
que a pesquisa de sangue oculto é um excelente método
de rastreamento para pacientes de baixo risco
11.
A genética molecular do carcinoma
colo-retal proporciona a base para a análise de DNA fecal
12,13. Estudos prévios usando pesquisa fecal baseado em
testes de DNA demonstram sensibilidade de 62 a 91% para carcinoma, 27 a 82% para adenomas
avançados, com especificidade de 93 a 96%
13,14,15,16,17 .Entretanto, outros referem que a sigmoidoscopia e o exame
de sangue oculto nas fezes não são bons métodos de
triagem para a detecção precoce de carcinoma, e
recomendam colonoscopia 18.
Em nosso meio há parasitoses intestinais
que podem dar resultado falso positivo, mas
independente disso é indiscutível o avanço realizado no sentido
de tornar viável a pesquisa de sangue oculto nas
fezes como método inicial principal de triagem para
pesquisa de lesões pré-malignas e malignas
1,2,3, 5, 7,10,19,20,21, 22,23,25 .
Com base nestes estudos, o objetivo do trabalho é avaliar as vantagens da pesquisa de sangue
oculto nas fezes como método de triagem na detecção
de lesões pré-malignas e malignas em nossa
população sintomática, correlacionando com os resultados
da colonoscopia.
CASUÍSTICA E MÉTODO
Realizou-se estudo prospectivo na Disciplina de Coloproctologia do Departamento de Cirurgia
da Santa Casa de São Paulo, já avaliado pela
Comissão Científica do Departamento de Cirurgia e pelo
Comitê de Ética em Pesquisa.
Por ocasião do Iº Curso Prático
de Colonoscopia e Iº Mutirão de Colonoscopia da
Santa Casa de São Paulo foram selecionados 60
pacientes para colonoscopia, indicados na rotina, após
fazerem pesquisa de sangue oculto. Destes, uma mulher de
81 anos, com sangue oculto negativo, foi excluída por
intensa dor abdominal. Os 59 restantes realizaram os
dois exames, sangue oculto e colonoscopia. A média
das idades foi de 54,2 anos, de 22 a 92 anos, sendo 31
mulheres e 28 homens. Os resultados dos exames de
sangue oculto foram positivos em 25 e negativos em 34.
Os pacientes eram sintomáticos e as
queixas sugeriram doenças do cólon, ocorrendo: alteração
do hábito intestinal (20), dores abdominais
(17), sangramento (14), constipação (13), perda
ponderal (12), diarréia (10) e muco nas fezes (5). A
indicação dos exames de colonoscopia foi baseada em
critérios da Disciplina de Coloproctologia (Tabela 1)
ABSTRACT: Background: colon and rectal carcinoma are frequent occurrences and common causes of death. The elderly, both male and female, are the most affected group and preventive exams are essential to reduce mortality rates. The fecal occult blood tests are long-established and simple methods which are based on the idea that polyps and carcinomas bleed frequently. In recent times, the interest in these methods grew considerably. Objective: the study evaluates the relevance of fecal occult blood test as a screening method in symptomatic patients compared to colonoscopy results. Method: 60 symptomatic patients with colon and rectal ailments at Santa Casa of São Paulo Hospital underwent fecal occult blood tests with benzidine, followed by colonoscopic exam. Results: the average age was 54.2, being 31 of them women and 28 men. The fecal occult blood test was positive in 25 and negative in 34. Lesions were identified as the cause of bleeding and the fecal occult blood test had a sensibility of 63.7%, specificity of 81%, predictive positive value of 28% and negative of 88%. Conclusion: the present results show that the fecal occult blood test should be applied in social programs of carcinoma prevention in symptomatic patients.
Keywords: Occult blood test, colonoscopy, carcinoma, colon and rectum.
Referências
1. Bromer MQ; Weinberg DS. Screening for Colorectal Cancer
- Now and the Near Future. Semin Oncol, 2005; 32:3-10.
2. Hardcastle JD; Chamberlain JO; Robinson MH; Moss
SM; Amar SS; Balfour TW et al. Randomised controlled trial
of faecal-occult-blood screening for colorectal cancer.
Lancet, 1996; 348:1472-1477.
3. Kronborg O; Fenger C; Olsen J; Jorgensen OD;
Sandergaard O. Randomised study of screening for colorectal cancer
with faecal-occult-blood test. Lancet, 1996; 348:1467-1471.
4. Sung JJ; Chan FK; Leung WK; Wu JC; Lau JY; Ching J;
To KF; Lee YT; Luk YW; Kung NN; Kwok SP; Li MK;
Chung SC. Screening for colorectal cancer in Chinese: comparison
of fecal occult blood test, flexible sigmoidoscopy,
and colonoscopy. Gastroenterology, 2003; 124(3):608-614.
5. Winawer SJ; Zauber AG; Ho MN et al. Prevention of
colorectal cancer by colonoscopic polypectomy. The National
Polyp Study Workgroup. N Engl J Med, 1993; 329:1977-1981.
6. Rockey, DC. Virtual Colonoscopy to Screen for
Colorectal Cancer. New England Journal of Medicine, 2004;
350(11):1148-1150.
7. O'Leary BA; Olynyk JK; Neville AM; Platell CF.
Cost-effectiveness of colorectal cancer screening: comparison
of community-based flexible sigmoidoscopy with fecal
occult blood testing and colonoscopy. J Gastroenterol Hepatol,
2004; 19(1):38-47.
8. Segnan N; Senore C; Andreoni B; Arrigoni A; Bisanti L;
Cardelli A; Castiglione G; Crosta C; Di Placido R; Ferrari A;
Ferraris R; Ferrero F; Fracchia M; Gasperoni S; Malfitana G;
Recchia S; Risio M; Rizzetto M; Saracco G; Spandre M; Turco
D; Turco P; Zappa M. Randomized trial of different
screening strategies for colorectal cancer: patient response and
detection rates. J Natl Cancer Inst, 2005; 97(5):347-357 .
9. Florie J; van Gelder RE; Stoker J. Colonography by
computed tomography. Eur J Gastroenterol Hepatol, 2005;
17(8):809-813.
10. Mandel JS; Bond JH; Church TR; Snover DC; Bradley
GM; Schuman LM et al. Reducing mortality from colorectal
cancer by screening for fecal occult blood. N Engl J Méd,
1993; 28:1365-1371.
11. Altenburg FL; Biondo-Simões MLP; Santiago A. Pesquisa
de sangue oculto nas fezes e correlação com alterações
nas colonoscopias. Rev bras Coloproct, 2007; 27 (3): 304-309.
12. Sidransky D; Tokino T; Hamilton SR; et al. Identification
of ras oncogene mutations in the stool of patients with
curable colorectal tumors. Science, 1992; 256:102-105.
13. Ahlquist DA; Skoletsky JE; Boynton KA,; et al.
Colorectal cancer screening by detection of altered human DNA in
stool: feasibility of a multitarget assay panel. Gastroenterology,
2000; 119:1219-1227.
14. Dong SM; Traverso G; Johnson C et al. Detecting
colorectal cancer in stool with the use of multiple genetic targets. J
Natl Cancer Ins, 2001; 93:858-865.
15. Syngal S; Chung D; Willet C et al. The loss of stool
DNA mutation abnormalities in colorectal neoplasia after
treatment. Gastroenterology, 2003; 124:Suppl 1:A-5.
16. Tagore KS; Lawson MJ; Yucaitis JA et al. Sensitivity
and specificity of a stool DNA multitarget assay panel for
the detection of advanced colorectal neoplasia. Clin
Colorectal Cancer, 2003; 3:47-53.
17. Traverso G; Shuber A; Levin B et al. Detection of
APC mutations in fecal DNA from patients with colorectal
tumors. N Engl J Med, 2002; 346:311-320.
18. Cheng TI; Wong JM; Hong CF et al. Colorectal cancer
screening in asymptomaic adults: comparison of
colonoscopy, sigmoidoscopy and fecal occult blood tests. J Formos
Med Assoc (China Republic), 2002; 101:685-690.
19. Mandel JS; Bond JH; Bradley M; Snover DC; Church
TR; Williams S; Watt G; Schuman LM; Ederer F; Gilbertsen
V. Sensitivity, specificity, and positive predictivity of
the Hemoccult test in screening for colorectal
cancers. Gastroenterology, 1989; 97:597-600.
20. Ko CW; Dominitz JA; Nguyen TD. Fecal occult blood
testing in a general medical clinic: comparison between
guaiac-based and immunochemical-based tests. Am J Med ,
2003; 115(2):111-1114.
21. Veysey M; Leiyten W; Walsh P; Vigenser B. At what
age should faecal occult blood screening be undertaken?: 29.
J Gastroenterology & Hepatology, 2005; 20:A16.
22. Morikawa T; Kato J; Yamaji Y; Wada R; Mitsushima
T; Shiratori Y. A comparison of the immunochemical fecal
occult blood test and total colonoscopy in the
asymptomatic population. Gastroenterology, 2005; 129(2):422-428.
23. MacRae FA; Slattery MA ; Brown GJ; O'Dwyer MA;
Murphy CG; Hibbert ME. Sensitivity of faecal occult blood
testing (FOBT) for asymptomatic colorectal cancer and
advanced adenomas over a 25-year experience in colorectal
cancer screening: 66. J Gastroenterology & Hepatology, 2005; 20.
24. Greegor DH. Diagnosis of large bowel câncer in the
asyntomatic patient. J Amer Med Ass, 1967; 201:943-947.
25. INCA _ Instituto Nacional do Câncer _
http://www.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=325 , 2005.
26. Ahmed S; Leslie A; Thaha MA; Carey FA; Steele RJ.
Lower gastrointestinal symptoms are not predictive of
colorectal neoplasia in a faecal occult blood screen-positive
population. Br J Surg, 2005; 92(4):478-481.
Endereço para correspondência:
Dr. Wilmar Artur Klug
Alameda Ribeirão Preto, 487 - Ap. 103
01331-001 - São Paulo - SP
Recebido em 28/08/2008
Aceito para publicação em 03/11/2008
Trabalho realizado na Disciplina de Coloproctologia do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.