RELATO DE CASOS


APENDICITE EPIPLÓICA COM COMPROMETIMENTO DA SEROSA E ESTREITAMENTO DA LUZ DO SIGMÓIDE. RELATO DE CASO

Epiploic Appendagitis with Impairment of Serous and Narrowing of Sigmoid Colon - Case Report

Italo Accetta1; Pietro Accetta2; André Figueiredo Accetta3; Alfredo Jorge Vasconcellos Duarte4; Wilhermo Torres5

1 Professor Titular de Cirurgia de Urgência do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense; Professor de Cirurgia Geral da Universidade Gama Filho; 2 Professor Titular de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense; 3 Médico Intensivista do Hospital Estadual Azevedo Lima; 4 Professor de Cirurgia Geral da Universidade Gama Filho; Cirurgião Geral do Serviço de Emergência do Hospital Universitário Antônio Pedro; 5 Professor Adjunto Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense.


ACCETTA I; ACCETTA P; ACCETTA AF; DUARTE AJV; TORRES W. Apendicite Epiplóica com Comprometimento da Serosa e Estreitamento da Luz do Sigmóide. Relato de Caso. Rev bras Coloproct, 2008;28(4): 474-476.

RESUMO: Os autores relatam o caso de um paciente de 34 anos, submetido à laparotomia de urgência com quadro de abdômen agudo ocasionado por apendicite epiplóica. Foi dado ênfase à manifestação intensa dos sinais e sintomas, assim como sua apresentação pouco usual no ato cirúrgico, uma vez que comprometia o sigmóide sugerindo tratar-se de doença de Crohn.

Descritores: Epiploite.

INTRODUÇÃO
Os apêndices epiplócos (AE) são estruturas geralmente negligenciadas nos livros de histologia, patologia e cirurgia, cuja função exata ainda hoje é controvertida. As doenças que podem acometê-los são pouco freqüentes. Dentre estas, a apendicite epiplóica é acontecimento raro, de difícil diagnóstico e geralmente autolimitado1,3. Entretanto, em alguns pacientes, este processo pode ser mais intenso com repercussão clínica importante, podendo ser confundido com quadro de abdômen agudo cirúrgico.
   Descrever um caso de apendicite epiplóica com comprometimento da serosa e estreitamento da luz do sigmóide constitui o principal objetivo deste trabalho.

RELATO DO CASO
Paciente masculino, branco, 34 anos, obeso (125 kg e 1,80 m) deu entrada com queixa de dor contínua, há 48 horas de fraca intensidade e piora progressiva, no quadrante inferior esquerdo do abdômen, acompanhada de polaciúria, náuseas, febre e um episódio de diarréia. Negava doenças crônicas, uso de medicamentos ou episódios semelhantes no passado. Ao exame constatamos: pulso = 100/min.; t.= 37,8 o C; freq. resp.= 22/min, PA 150 x 90 mmHg. O abdômen era globoso, distendido (+/4+), flácido, doloroso à palpação profunda nos quadrantes inferiores e com francos sinais de irritação peritoneal no lado esquerdo. Os exames hematológicos revelaram 15200 leucócitos com predomínio de polimorfonucleares e o EAS foi normal. Rotina radiológica para abdômen agudo, ultra-sonografia e tomografia abdominal foram inconclusivas. Com impressão diagnóstica de abdômen agudo indicamos laparotomia exploradora realizada através de acesso mediano infra-umbilical por onde encontramos: fibrina na pelve; três apêndices epiplóicos bastante inflamados no sigmóide (Figura 1), que se apresentava também com paredes espessadas, inflamadas e com estreitamento de sua luz. Com diagnóstico operatório de doença de Crohn optamos por ressecção segmentar do sigmóide juntamente com os apêndices doentes e colostomia a Hartman. A evolução foi satisfatória com alta hospitalar no 7º dia. O resultado histopatológico revelou apendicite epiplóica com serosite intensa e estreitamento do lúmen entérico.
Figura 1 - Processo inflamatório intenso.


COMENTÁRIOS
Os AE são definidos como projeções da serosa colônica contendo gordura. Os adultos apresentam aproximadamente uma centena de AE com peso total correspondendo a ¼ do peso do omento maior. Geralmente dispõe-se longitudinalmente ao eixo do cólon e em duas fileiras; uma na "taenia libera" e outra na "taenia omentalis". Variam em tamanho de poucos milímetros até 15 cm. Podem se apresentar em forma tubular, lobulada ou saculada. Encontram-se presos ao cólon por bases amplas ou por pedículos estreitos. São mais numerosos no cólon transverso, descendente e principalmente no sigmóide.
   De acordo com SAPHIR 4, os AE protegeriam os vasos sanguíneos (arteríola e vênula) com uma camada de gordura ao penetrarem no cólon, evitando assim o colapso vascular quando o cólon distende. Entretanto, não encontramos nos outros autores consultados comentários relativos as funções do AE.
   A apendicite epiplóica é a doença mais comum que acomete os AE. É alteração rara, benigna, que ocorre mais em nível de sigmóide e com incidência exata desconhecida. Pode ser classificada em primária (conseqüente à torção ou trombose vascular) ou secundária (devido a inflamações na parede intestinal). De acordo com CAKIRER1, a apendicite epiplóica pode involuir levando à fibrose ou a calcificação do AE.
   O caso por nós relatado não parece enquadrar-se em nenhuma das situações anteriores, pois o processo inflamatório acometia três AE que não se encontravam torcidos nem trombosados. Além disso, a serosite no sigmóide não foi compatível com nenhuma doença inflamatória intestinal.
   O quadro clínico cursa com dor abdominal contínua nos quadrantes inferiores, febre baixa e náuseas. Vômitos e diarréia são menos freqüentes 1. Eventualmente os sinais e sintomas podem manifestar-se de forma mais intensa confundindo-se como os de outras doenças inflamatórias da cavidade peritoneal, conforme descritos em nosso paciente. Dentre os diagnósticos diferenciais principais destacam-se: apendicite, diverticulite e torção do omento.
   Atualmente os métodos de imagem permitem o diagnóstico da apendicite epiplóica sem laparotomia. A ultra sonografia abdominal sugere a presença de massa ovóide não compressível. A tomografia é mais precisa mostrando a lesão ovalada pericolônica com atenuação da gordura 2,3,5. Em nosso relato de caso ambos foram inconclusivos.
   Uma vez obtido, com segurança, o diagnóstico de apendicite epiplóica, pode ser tentado o tratamento clínico com antibióticos 1. Quando o processo for reconhecido durante uma laparotomia, a retirada do AE inflamado é suficiente para a resolução do problema. Ressecção segmentar do intestino é conduta excepcional, reservada apenas para aqueles casos em que durante o ato cirúrgico, ocorre suspeita de doença inflamatória intestinal.

CONCLUSÕES
Concluímos de acordo com a literatura, que a apendicite epiplóica é rara, passível de tentativa de tratamento clínico, e que a laparotomia deve ser reservada somente para aqueles casos em que persistam dúvidas diagnósticas.

ABSTRACT: The authors present a case-report of a male, 34 years old patient submitted to laparotomy due to acute abdomen caused by epiploic appendicitis. A special attention was given to the physical examination and intensity of symptoms as well as the unusual findings during surgical procedure because of sigmoid compromising suggesting Crohn's disease.

Key Words: Epiloic appendicitis.

Referências
1. Araújo, S.E.A.; Goldstein, P.J.P.G.; Yamakami, L.Y.S.; Almeida, F.F.N.; Miranda, M.P., Genzini, T. Apendicite epiplóica. Relato de 3 casos e revisão da literatura. Rev. Bras. Coloproct. 21(4): 249-53, 2001.
2. Cakirer, S.; Demir, K.; Beser, M.; Galip, G.M.. Epiploic appendagitis. www.//eurorad.org/eurorad/case.php?id=1113.
3. Melo, A. S. A.; Moreira, L.B.M.; Pinheiro, R.A.; Noro, F.; Alves, J.R.D.; Machado, B.B. Apendicite epiplóica. Aspectos na ultra songrafia e na tomografia computadorizada. Radiol. Bras. 35(3): 1-8, 2002.
4. Saphir, O. Appendix to alimentary tract - peritoneum. In: A text of systemic pathology - vol II. Grunne and Stratton. New York and London; 1024-6, 1959.
5. Silva, I.T.C.; Costa Neto R.R. Apendicite epiploica - Resolução videolaparoscópica. Rev. Col. Bras. Cir. 32(2); 108-9, 2005.

Endereço para correspondência:
Italo Accetta
Rua Mariz e Barros no 51 / apt 1201
Icaraí, Niterói, RJ - CEP: 24220-120
E-mail: italo@urbi.com.br

Recebido em 31/01/2008
Aceito para publicação em 20/02/2008

Trabalho realizado pelo Serviço de Emergência do Hospital Universitário Antônio Pedro da Universidade Federal Fluminense.